Ex-policial civil de SP que vendia escutas telefônicas para a facção criminosa PCC é morto

    Jurandir Tiago da Silva, 44 anos, também era testemunha de sequestro cometido por policiais civis contra enteado de Marcola, um dos chefes do grupo criminoso PCC

    Caramante
    O ex-policial civil Jurandir Tiago da Silva, 44 anos, também foi condenado a 12 anos de prisão por sequestro e recorria em liberdade

    O ex-policial Jurandir Tiago da Silva, 44 anos, demitido da Polícia Civil de São Paulo por vender cópias de escutas telefônicas autorizadas pela Justiça para membros da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital), foi morto a tiros na noite desta sexta-feira (19/08), na Vila Curuça, região de São Miguel Paulista (zona leste de São Paulo).

    Demitido da Polícia Civil em 18 de setembro de 2008, “a bem do serviço público”, Jurandir Silva estava em um Ford Fiesta quando, por volta das 23h, chegava em casa e foi atingido pelos tiros.

    Atualmente, o ex-policial civil era estudante de Direito e recorria, em liberdade, de uma condenação de 12 anos de prisão pelo sequestro de um empresário, que ficou 29 dias em cativeiro, entre julho e agosto de 2011, em Itaquaquecetuba (Grande São Paulo).

    Em maio de 2011, o então policial civil Jurandir Silva, do 41º DP (Parque São Lucas), foi apontado pela advogada Maria Odette de Moraes Haddad, à época defensora de presos como Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, e Rogério Jeremias de Simone, o Gegê do Mangue, como responsável por vender cópias de escutas telefônicas contra alguns de seus clientes, todos eles ligados ao grupo criminoso PCC.

    Em um vídeo gravado dentro da Delegacia de Suzano (Grande São Paulo), a advogada afirmou a um grupo de policiais que sabia da existência de escutas telefônicas contra Gegê do Mangue e sua mulher porque havia comprado do policial Silva fitas cassete com as cópias de conversas telefônicas de seu cliente, que, mesmo preso, usava celular para fazer articulações.

    O vídeo captado na Delegacia de Suzano foi gravado pelo também policial civil Augusto Peña. Ele e outros dois policiais civis eram os responsáveis pela investigação que requisitou à Justiça os grampos telefônicos contra Gegê do Mangue.

    Durante aproximadamente 45 minutos, a advogada e Peña falam sobre os grampos telefônicos e sobre Jurandir Silva. No fim do vídeo, Peña diz para Maria Odette de Moraes Haddad que sabia da relação dela com o policial Jurandir.

    Foi nesse momento que a advogada resolveu entregar as fitas compradas de Jurandir Silva e entrega-las para Peña. A advogada diz no vídeo que passaria a ficar na mira do PCC por dois motivos: seria suspeita de ligação com o policial Jurandir e também que os membros do PCC poderiam suspeitar que ela comprava as fitas com os grampos telefônicos por valores menores do que os informados à facção criminosa.

    Jurandir Silva era considerado pelo Ministério Público Estadual como uma das principais testemunhas do sequestro cometido por Peña contra Rodrigo Olivatto de Morais, enteado de Marcola, do PCC.

    Em abril de 2008, Peña foi preso por ter exigido R$ 300 mil para não prender Rodrigo Olivatto. O resgate foi pago, segundo a Promotoria, por membros do PCC.

    Além de Peña, outro policial civil, José Roberto de Araújo, à época do Deic (Departamento de Investigações sobre o Crime Organizado), e Carlos Roberto dos Santos, “ganso” (informante, na gíria policial) foram presos pelo seqüestro de Rodrigo Olivatto, filho de Ana Maria Olivatto Herbas Camacho, 45, advogada e ex-mulher de Marcola, assassinada em outubro de 2002.

    O ganso Santos, de acordo com a Promotoria, foi o responsável por repassar informações de Rodrigo Olivatto para que os dois policiais civis conseguissem mantê-lo em cativeiro (na Delegacia de Suzano) por aproximadamente 48 horas.

    Crimes de maio de 2006

    Em abril de 2006, integrantes do PCC armaram um ataque contra a delegacia de Suzano porque, segundo apuração do Ministério Público, Peña não teria cumprido um acordo com membros do grupo criminoso para libertar Gilmar de Holanda Lisboa, o Pebinha, acusado de ser traficante em Diadema (ABC).

    Como os criminosos teriam pago R$ 40 mil para Pebinha não ficar preso em Suzano, o PCC resolveu atacar a delegacia da cidade. Sete pessoas morreram em 7 de abril. Quatro delas supostamente eram do PCC, dois eram policiais e um era amigo dos investigadores.

    Pouco mais de um mês após esse episódio, o PCC começou os ataques em massa contra as forças de segurança do Estado.

    Era 12 de maio quando Marcola, na sala do então diretor do Deic Godofredo Bittencourt, disse que parte da violência que o Estado enfrentaria se devia às atitudes de policiais como Peña.

    Somente depois se soube o que o presidiário Marcola quis dizer. Entre 12 e 20 de maio de 2006, 564 pessoas foram pessoas foram mortas durante a maior crise na segurança pública enfrentada pelo Estado de São Paulo. Durante os chamados “Crimes de Maio”, foram 505 civis e 59 agentes de segurança pública (policiais civis e militares, guardas municipais e agentes penitenciários mortos).

    Advogada condenada

    Em março de 2009, a advogada Maria Odete de Moraes Haddad foi presa sob suspeita de associação para o tráfico e formação de quadrilha e acabou condenada, em novembro de 2010, a sete anos e seis meses de prisão.

    De acordo com o Ministério Público Estadual, Maria Odete integrava a organização criminosa comandada pelo sequestrador Wanderson Nilton Paula Lima, o Andinho, ex-membro do PCC.

    Escutas telefônicas apontaram que Maria Odete havia recebido a missão de descobrir o endereço de uma jornalista da RAC (Rede de Comunicação Anhanguera) para que os integrantes da quadrilha a matassem.

    O motivo do atentado foi o descontentamento com uma reportagem que a jornalista fez para o jornal “Correio Popular” sobre o casamento de Andinho. Nela, a jornalista fez um perfil de Andinho desde a infância e isso causou sua fúria.

    Dois meses antes da prisão de Maria Odete, criminosos ligados a Andinho jogaram duas granadas _nenhuma delas explodiu_ contra a sede da Rede Anhanguera, em Campinas (interior de SP).

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