Após 10 anos, Justiça condena 5 ex-PMs por tortura e 2 por fraude contra motoboy negro espancado até a morte

Eduardo Santos foi detido ilegalmente e agredido com socos, chutes e golpes de cassetete dentro do 9º Batalhão da PM na capital paulista em 2010

Eduardo Luiz Pinheiro dos Santos foi torturado por PMs em 2010 | Foto: Reprodução

O Tribunal de Justiça de São Paulo condenou cinco ex-policiais militares por tortura que resultou na morte do motoboy Eduardo Luiz Pinheiro dos Santos, 30 anos, em 9 de abril de 2010, na capital paulista. Outros dois ex-PMs também foram condenados apenas por fraude processual por terem mentido que o encontraram na rua agredido e outros dois por omissão. A sentença, proferida na sexta-feira (22/10), aconteceu 10 anos e meio após o crime e os acusados podem recorrer em liberdade.

Wagner Aparecido Rosa, Antonio Sidnei Rapelli Junior, Alexandre Seidel, Raphael Souza Cardoso e Nelson Rubens Soares foram condenados, cada um, a 12 anos de prisão em regime fechado pelo crime de tortura com resultado morte cuja pena foi aumentada por ter sido praticada por agentes públicos. Wagner e Antonio também foram condenados a dois anos e dois meses de detenção, em regime inicial semiaberto, e pagamento de 90 dias-multa, por fraude processual. Fernando Martins Lobato e Jair Honorato da Silva Junior foram condenados a dois anos, quatro meses e 24 dias detenção, em regime inicial semiaberto, por omissão do crime de tortura. Ismael Pereira de Jesus e Rodrigo Monteiro foram condenados a dois anos e dois meses de detenção, em regime inicial semiaberto, e pagamento de 90 dias-multa, por fraude processual.

Já os policiais Andressa Silvestrini, Jordana Gomes Pereira e Rafael Silvestre Meneguini foram absolvidos do crime de omissão de tortura pela atuação não ter sido comprovada.

O juiz Fabrizio Sena Fusari também determinou a perda do cargo público para Wagner, Antonio, Alexandre, Raphael e Nelson, mas a Polícia Militar já havia os expulsado da corporação em 2012. Além deles, a PM expulsou Jair, Rodrigo, Ismael e Fernando.

Em 2010, após o assassinato do motoboy, o então comandante-geral da PM e hoje secretário executivo da corporação, coronel Álvaro Batista Camilo, escreveu uma carta à família do motoboy pedindo desculpas pelo crime. O Ministério Público Estadual havia denunciado os policiais por homicídio, mas voltou atrás em 2017 durante o processo de instrução (produção de provas e audiências), substituindo pelo crime de tortura com resultado morte porque entendeu que os acusados não tiveram a intenção de matar. O Tribunal de Justiça aceitou a mudança da denúncia.

Polícia Científica identificou diversas escoriações e hematomas no corpo de Eduardo e definiram que a causa da morte foi politraumatismo | Foto: reprodução

Na época, Eduardo e outras três pessoas foram abordadas pelos então policiais Raphael Souza Cardoso e Antonio Sidnei Rapelli Junior após uma briga por um suposto furto de bicicleta. Elas relataram que o jovem estava um alterado e deu uma rasteira em Rafael, momento em que foi agredido com socos no peito. Devido à quantidade de pessoas, a dupla solicitou reforço e chegaram os policiais Wagner Aparecido Rosa e Alexandre Seidel. O motoboy ainda levou um jato de spray de pimenta no rosto por se recusar a entrar na viatura e foi algemado, segundo as testemunhas.

Ao invés de serem encaminhados ao 13º Distrito Policial da Casa Verde, os quatro foram levados à 1ª Companhia do 9º Batalhão Metropolitano da Polícia Militar e não foi registrado nenhum boletim de ocorrência do suposto crime de furto, que independe de representação da vítima, e nem avisaram à rede de comunicação da PM, o Copom. Ou seja, foi uma detenção ilegal. Enquanto as três testemunhas ficaram em uma sala vigiadas pelos policiais Fernando Martins Lobato e Jair Honorato da Silva Junior, Eduardo foi colocado em outra, onde foi agredido diversas vezes, com chutes, socos e golpes de cassetete – que chegou a quebrar. Segundo elas, era possível ouvir os gritos de dor do motoboy pedindo para parar e gritando por socorro.

Elas também relataram que viram Wagner carregando uma arma com Alexandre indo para a sala e que ouviram de quatro a cinco disparos, mas que Eduardo teria conseguido correr. Ao ser “recapturado”, ainda foi agredido outras vezes. Um policial chamado de “chefe” pelos outros, Nelson Rubens Soares, também participou das agressões. As testemunhas foram liberadas, mas não viram o motoboy deixar o batalhão. Informaram que ao menos 10 policiais se revezaram para agredir o jovem.

Wagner disse em interrogatório que solicitou que Antonio Rapelli fosse levado à Base Comunitária Campo de Bagatelle pelos então policiais Ismael Pereira de Jesus e Rodrigo Monteiro. No caminho, teriam sido informados por um motorista que havia um corpo caído na Avenida Brás Leme com a Rua Voluntários da Pátria. O grupo disse que socorreu a vítima até o Pronto Socorro Municipal Dr. Lauro Ribas Braga, na zona norte, porque ainda estaria com vida, mas Eduardo já chegou morto ao hospital. O boletim de ocorrência feito na Polícia Civil constava como “morte suspeita” e “identidade desconhecida” e, novamente, não informaram ao Copom sobre terem encontrado um corpo. Os policiais não mencionaram que Eduardo esteve momentos antes no batalhão, alegando que não o tinham reconhecido.

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A família só localizou o jovem quatro dias depois da abordagem. Na época, o então governador Alberto Goldman (DEM) autorizou o pagamento de indenização à família de Eduardo.

O que dizem os ex-PMs

A Ponte procurou o escritório Malavasi Advogados, que representa os réus no processo, e aguarda uma resposta.

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