Ato contra legalização do aborto endurece debate na Argentina

    Quatro dias antes da votação que decidirá o destino do aborto legal no país, manifestantes “pró-vida” enchem as ruas de Buenos Aires

    Manifestantes contrários à legalização do aborto em Buenos Aires | Foto: Olavo Barros/Ponte

    A quatro dias de uma votação que promete ser histórica no Senado argentino, o debate sobre a aprovação do projeto de lei da IVE (sigla em castelhano para Interrupção Voluntária da Gravidez) está longe de ter um desfecho claro.

    A questão do aborto novamente levou uma multidão de manifestantes a encher as ruas de Buenos Aires, mas neste sábado (4/8) eles não vestiam os lenços verdes pelo direito de escolha das mulheres, como em protestos anteriores, e sim a cor azul dos manifestantes “pró-vida”, contrários à legalização do aborto.

    Manifestantes contrários à legalização do aborto em Buenos Aires | Foto: Olavo Barros/Ponte

    Hoje foi a vez desse grupo mostrar sua força, levando à capital argentina centenas de milhares de pessoas, vindas de todas as partes do país. A multidão ocupou as imediações do Obelisco, marco histórico da cidade, pedindo que a Câmara Alta argentina rejeite a proposta, na votação marcada para a próxima quarta-feira (8/8).

    Com palco montado em frente ao monumento e com estimativa de público de 500 mil pessoas, segundo a organização do evento, os oradores gritam ao microfone:

    “Um aplauso ao nosso país! Um aplauso à vida! Digamos sim às duas vidas!”

    Manifestantes contrários à legalização do aborto em Buenos Aires | Foto: Olavo Barros/Ponte

    “Sou contra [a aprovação do Projeto de Lei da IVE], porque é a palavra de Deus. A vida começa em sua concepção”, conta o jovem Sebastian Negrette, 30, que tomou um dos 4 ônibus que viajaram cerca de 16 horas desde a província de Missiones até a capital para participar da manifestação.

    O manifestante Ricardo Spizzo, 39, também criticou a Campanha Nacional pelo Direito ao Aborto Legal, Seguro e Gratuito. “A vida é o primeiro direito. Legalizar o aborto vai contra a Declaração Internacional de Direitos Humanos. Aborto legal é mentira porque é inconstitucional; seguro é mentira, porque é matar o bebê e colocar em risco a vida da mãe; e gratuito também é mentira, porque vamos pagar com nossos impostos e a crise do país não permite bancar algo dessa envergadura. É inviável”, afirma.

    Manifestantes contrários à legalização do aborto em Buenos Aires | Foto: Olavo Barros/Ponte

    Com uma pequena banca armada para vender doces e tortas a fim de arrecadar fundos para que jovens do interior da argentina pudessem viajar à capital e participar da manifestação em frente ao Congresso da Nação no dia 8, os representantes da organização “Jovens Pela Vida” Santiago Nolazco, 22 anos, e Sofia Buchanan, 20, movimentaram-se para agregar outros jovens que pensavam como eles.

    “Depois da votação na Câmara dos Deputados, resolvemos nos comunicar pelas redes sociais e abrir uma conta no Instagram. Não havia lideranças jovens [contra a aprovação da lei]. Recebemos mensagens de todas as províncias de todas as partes do país” contou Sofia, que deixou de lado as comemorações no dia de seu próprio aniversário para se manifestar.

    Manifestantes contrários à legalização do aborto em Buenos Aires | Foto: Olavo Barros/Ponte

    “A intenção é despertar a juventude para ir às ruas e lutar pela vida. São jovens católicos, evangélicos e até ateus. Não tem um culto. É uma união de todos que acreditam que não tem mais ou menos valor uma vida. Médicos dizem que a vida começa na concepção e eu me baseio nisso e não na fé”, completa Santiago, que se declara católico. Sofia, também católica, reforça: “Somos apolíticos e não respondemos a nenhuma religião”.

    Os jovens também denunciam agressões que vêm sofrendo por se colocarem contra a aprovação do aborto pelo Senado. “Tivemos nossa primeira conta no Instagram hackeada e tivemos que abrir outra. Arrancaram o paninho cor celeste da mochila de uma amiga. Temos medo de sair na rua [e dizer que estão contra a legalização do projeto de lei]”, finaliza.

    Manifestantes contrários à legalização do aborto em Buenos Aires | Foto: Olavo Barros/Ponte

    Entre os organizadores do evento, está a Aciera, sigla em castelhano para Aliança Cristã das Igrejas Evangélicas da República Argentina. O presidente da associação, Rubén Proietti, afirma: “Queremos que este ato influencie a votação dos senadores. Não é por uma lei e sim por uma consequência irresponsável da decisão de um homem e de uma mulher”. E complementa: “Vamos seguir atendendo a todas, as que fazem ou que querem fazer aborto. Principalmente aquelas destruídas pelos sintomas do pós-aborto, pois ninguém fala disso”.

    Manifestantes contrários à legalização do aborto em Buenos Aires | Foto: Olavo Barros/Ponte

    Tirando selfies com os manifestantes presentes, a presidente da Comissão de População e Desenvolvimento Humano do Senado da Nação Argentina, a senadora Miriam Boyadjian, do MPF (Movimiento Popular Fueguino), explicou porque é contra a aprovação do projeto. “Na verdade, o que temos que defender é que o direito mais importante é a vida por ela mesma. Esse é o valor jurídico e esse é o valor que Deus nos deu e que creio que hoje temos que defender. A meia-sanção [aprovada na Câmara dos Deputados] é totalmente inconstitucional, está carregada de vícios.”

    Manifestantes contrários à legalização do aborto em Buenos Aires | Foto: Olavo Barros/Ponte

    A senadora também se mostra confiante com a vitória da posição que defende na votação da próxima quarta. “Tenho muita fé que se vai rejeitar a lei. Hoje, conseguimos 36, 37 votos, e acreditamos que podemos sustentar essa posição até o dia 8, e vamos estar plantados e firmes para que isso aconteça”.

    O número necessário para formar maioria simples no Senado Argentino e, assim, aprovar ou rejeitar o projeto de lei é de 37 votos.

    Manifestantes contrários à legalização do aborto em Buenos Aires | Foto: Olavo Barros/Ponte
    Manifestantes contrários à legalização do aborto em Buenos Aires | Foto: Olavo Barros/Ponte

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