‘Bolsonaro beneficia milícias ao suspender identificação de armas’

    Para Bruno Langeani, do Sou da Paz, pessoas que usam armas dentro da lei não se preocupam com rastreamento

    Marcação de munições garantia ao Estado controlar circulação de armas e munições; na foto, munição usada em chacina em Sapopemba, zona leste de SP, no ano passado | Foto: Arthur Stabile/Ponte Jornalismo

    O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) usou o seu perfil pessoal no Twitter para informar que revogou, nesta sexta-feira (17/4), as portarias do Comando Logístico (COLOG) nº 46, 60 e 61, de março de 2020, que tratavam do rastreamento, identificação e marcação de armas, munições e outros produtos.

    A decisão do presidente fortalece as milícias e o desvio de armas, afirma Bruno Langeani, gerente do Instituto Sou da Paz, em entrevista à Ponte. Além disso, a decisão do presidente acontece em um momento onde todos os olhares estão para medidas governamentais de combate ao coronavírus.

    “Quem faz as atividades dentro da lei, que pratica o tiro esportivo dentro da lei, não teria motivos para se preocupar com o aumento da rastreabilidade, com uma melhoria da marcação. Essa medida atinge e prejudica quem faz atividade ilegal”, declara.

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    O grupo que se privilegia dessa decisão do presidente são os CACs (caçadores, atiradores e colecionadores). Langeani aponta que nomes conhecidos do caso Marielle Franco, vereadora carioca assassinada em 14 de março de 2018, e do “Escritório do Crime”, grupo miliciano do Rio de Janeiro, fazem parte desse grupo.

    “Não é coincidência que o assassino da Marielle [PM da reserva Ronnie Lessa] e o motorista [ex-PM Elcio Vieira de Queiroz] tivessem registro de atirador esportivo, tivessem comprados armas com esse carimbo do Exército. Não surpreende também que um outro miliciano, apontado como um dos chefes do ‘Escritório do Crime’, o capitão Adriano Magalhães da Nóbrega também tivesse armas registrados do Exército sob essa categoria”, argumenta.

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    “Como esses CACs têm autorização para comprar um número maior de armas e armas mais potentes, um número ainda maior de munições, isso é algo que fortalece as milícias, porque você tem a possibilidade de uma pessoa só comprar de forma legal várias armas de guerra e um número alto de munições”, continua Langeani.

    Langeani também aponta para o fato de que o controle da marcação de armas e de munição afeta a segurança pública e o combate ao crime organizado. “Ano passado já houve uma série de flexibilizações que facilitam a compra de armas mais potentes, de mais munições e recargas de munições por esses grupos de CACs”.

    A marcação de munições e armas é importante também para ajudar na elucidação de crimes.

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    A rastreabilidade das armas e munições, explica o gerente do Sou da Paz, é um assunto técnico e que é tratado apenas no Exército, sem passar pela presidência e pelo Ministério da Defesa.

    “Um presidente se imiscuir em um tema como esse já é bastante incomum, ainda mais se a gente considerar que o Brasil está no meio de uma pandemia e todas a energias do principal líder do Executivo deveriam estar voltadas para a preservação de vidas e de combate à Covid-19”, critica.

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