“Calma, minha filha, por favor”, diz moradora da Rocinha no meio do tiroteio

    Maior favela da América Latina vive dias de terror por causa de briga de facções desde o domingo; polícia já prendeu três pessoas e investiga atuação da facção paulista PCC

    Imagens estão sendo divulgadas em redes sociais de moradores | Foto: Facebook

    Um confronto entre traficantes, que começou por volta das 6h de domingo (17/9), deixou os moradores da comunidade da Rocinha, no Rio de Janeiro, a maior da América Latina, apavorados. Segundo a Polícia Civil, traficantes invadiram o morro armados para tirar o traficante Rogério Avelino da Silva, conhecido como Rogério 157, a mando de Antônio Francisco Bonfim Lopes, o Nem, que continua no comando do morro mesmo preso. Durante toda a segunda-feira, equipes da Polícia Militar e Civil fizeram uma grande operação no local.

    De acordo com a Secretaria de Segurança do Estado do Rio de Janeiro, até o momento três pessoas foram presas: Edson Gomes Ferreira, 30 anos, preso por tráfico e associação ao tráfico, Wilken Nobre Barcellos, 20, com uma pistola, e Fábio Ribeiro França, de 19 anos, preso com granadas. Numa suposta troca de tiros, um suspeito foi baleado e morreu. Com ele, a PM teria apreendido uma pistola 9 milímetros.  Nas demais buscas, foram realizadas apreensões de drogas variadas, uma central clandestina de cartão de crédito, máquinas de caça-níquel e partes de fardas do Exército e dos Fuzileiros Navais.

    “Mãe, avisa ao pessoal do seu trabalho que vai ter toque de recolher. A partir das cinco da tarde ninguém entra e ninguém sai. Vai começar a guerra de novo” alertou uma moradora, que não quis se identificar, à sua mãe. Segundo um mototaxista que também não quis se identificar, durante o dia todo o morro ficou fechado e não foi trabalhar. “Eu tenho que pagar por semana, para conseguir trabalhar, 89 reais para a boca de fumo”, disse ele. Diversos vídeos mostrando a situação da Rocinha estão circulando pelas redes sociais. Em um deles, dá para ouvir uma moradora pedir para sua filha ter calma. “Mãe, pelo amor de Deus, mãe”, diz a filha, chorando. “Calma minha filha, por favor, calma”, responde a mãe, ao ver os traficantes saírem do carro do lado da sua casa.

    Segundo a Polícia Civil, a invasão aconteceu depois que o traficante Antonio Francisco Bonfim Lopes, conhecido como “Nem” deu ordem, do presídio onde cumpre pena, em Rondônia, para que seu sucessor, Rogério 157, deixasse a favela. Rogério não quis sair. Em agosto, parceiros de confiança de Nem foram encontrados mortos. A cúpula do ADA. (Amigos dos Amigos), que domina a favela, se uniu para expulsar o atual chefe. O delegado titular da 11ª DP (Rocinha), Antonio Ricardo, declarou que investiga a atuação do Primeiro Comando da Capital (PCC) na comunidade.

    A Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da Rocinha declarou que as imagens que estão circulando mostram o momento exato que traficantes fogem de policiais depois de um confronto no alto do morro. No vídeo, também é possível ver duas viaturas paradas. Ainda de acordo com a UPP, naquele momento os policiais haviam desembarcado dos veículos para se esconderem nos dois carros abandonados pelos bandidos, porque não tinham efetivo suficiente.

    As equipes da UPP da Rocinha e da 11ª Delegacia de Polícia já identificaram oito pessoas que participaram da invasão. A Polícia Civil encontrou dois corpos carbonizados dentro da comunidade.O porta-voz da Polícia Militar, major Ivan Blaz, disse que foi entendido pelo comando da UPP que uma intervenção armada contra os traficantes poderia promover danos colaterais para a população da comunidade. “O apoio superior foi demandado. Logo no raiar do dia, o cerco já estava montado na área da Rocinha, com cerca de 300 agentes na comunidade, tanto na porta da comunidade como dentro”, declarou ontem em coletiva de imprensa.  “A visão prioritária é estabilizar o terreno. Já temos várias horas sem confronto armado, com mandado de busca e captura. Essa ação é importante”, completou ele.

    “Você lidar com possibilidades diárias de invasão em toda região do Rio, não há efetivo que suporte isso. Nossa missão enquanto Polícia Militar é difícil. A UPP fez o que pode até o momento que era permitido”, continuou o major. “Não há outras instâncias na sociedade capaz de lidar com isso além da polícia. A gente fala de Rio de Janeiro. São 1.200 comunidades em todo território. Comunidades com diferentes facções criminosas. Não há planejamento eficaz que lide com isso”, finalizou Blaz.

    Segundo moradores, os tiros voltaram nesta segunda-feira (18/9), por volta das 18h. “Agora é cada um por si e Deus por nós. Isso aqui está uma guerra”, disse uma moradora que não quis se identificar. “Que Deus nos proteja”, finalizou.

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