Cinco acusados por assassinato de radialista em Goiás vão a júri popular

    Ministro do STF recuou de decisão que anulava julgamento pelo tribunal do júri e defesa de Valério Luiz de Oliveira espera definição de data nos próximos dias

    Caramante

    O assassinato do radialista e cronista esportivo Valério Luiz de Oliveira vai completar 6 anos. O julgamento dos acusados pelo crime, no entanto, não aconteceu. A família do jornalista e entidades ligadas aos direitos humanos e a liberdade de Expressão e Imprensa continuam enfrentando os obstáculos que a própria lei prevê, com recursos impetrados pelos acusados em instâncias superiores, que atrasam o desfecho da história.

    Mas, na semana passada (1/2), uma mudança importante no caso: o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Ricardo Lewandowski voltou atrás de uma decisão monocrática que ele tomou antes do recesso judicial, em 18 de dezembro do ano passado, de não mandar os acusados a Júri Popular. Com isso, Lewandowski acata o que a justiça de Goiás já havia decidido e manda para júri popular os cinco acusados do assassinato de Valério, entre eles o cartola do Atlético Clube Goianiense, Mauricio Sampaio, apontado como mandante.

    “Todos os cinco têm evidências de participação de uma forma ou de outra na morte do meu pai, então trabalharemos para que todos sejam julgados pelo mesmo júri popular”, afirma o filho do radialista, Valério Luiz Filho, que é advogado e atua como assistente de acusação no caso.

    O ministro do STF atendeu um agravo regimental interposto – uma espécie de recurso previsto em regimento para questionar uma decisão tomada individualmente, como foi a de Lewandowiski – pela subprocuradora-geral da República, Cláudia Sampaio Marques, sugerindo que o ministro voltasse atrás, já que ela considerava que a sentença de pronúncia apresentou elementos suficientes para autorizar o julgamento dos acusados pelo tribunal do júri por crime de homicídio qualificado. O recurso seria julgado pelo colegiado da Corte, mas, antes mesmo que isso acontecesse, o ministro do STF revogou a própria decisão.

    “Já peticionei na 1ª instância para que comecem os preparativos do júri. Para ir para o júri, precisa ter comprovação de existência do crime. Indício de autoria com elementos mínimos ligando aquelas pessoas acusadas ao crime que aconteceu, como foi com a morte do meu pai. O judiciário goiano entendeu que havia tudo isso, a subprocuradora também e, agora, o STF”, explica Valério Luiz.

    Na decisão, Lewandowski utiliza justamente o artigo 413 do CPP (Código do Processo Penal), que determina que o juiz pronunciará o acusado se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria. No texto, o ministro ressalta que “nessa fase, a dúvida milita em favor da sociedade que, através do julgamento pelo tribunal do júri, decidirá sobre essa certeza”. Lewandowski afirmou, ainda, que o STF possui o entendimento de que na fase de pronúncia não se exige juízo de certeza, bastando indício suficiente sobre a autoria ou participação do agente. “Na espécie, e agora diante de todos os elementos do caso concreto, penso que, de fato, a sentença de pronúncia preenche os requisitos legais, ao tratar sobre a materialidade e autoria”.

    Entenda o caso

    Assassinado às 14 horas do dia 5 de julho de 2012, após participar de um programa esportivo na Rádio Jornal 820 AM, Valério manobrava o carro quando foi surpreendido por um motoqueiro armado que atirou seis vezes, atingindo o jornalista com cinco disparos.
    Enquanto via o filho morto no carro, o também radialista Mané de Oliveira e hoje deputado estadual, gritava, denotando que sabia quem seriam os autores.

    Em 10 de julho do mesmo ano, uma carta anônima foi enviada a todos os veículos de imprensa e gabinetes de autoridades de Goiás com detalhes de crimes que teriam sido cometido por policiais militares, um deles, o assassinato de Valério Luiz. A mesma carta dava sinais de que a diretoria do Atlético Clube Goianiense estaria envolvida na morte e aponta o cabo da PM Ademá Figuerêdo como o autor dos disparos.

    No dia 1° de fevereiro de 2013, A Polícia Civil de Goiás prendeu temporariamente o açougueiro Marcus Vinícius Pereira Xavier, considerado o “faz-tudo” de Maurício Sampaio, Urbano de Carvalho Malta e o sargento da PM Djalma Gomes da Silva, que atuava no Comando de Missões Especiais. No dia seguinte, a Polícia Civil de Goiás prendeu temporariamente o ex-cartorário e atual presidente do Atlético Clube Goianiense, Maurício Borges Sampaio, apontado como mandante do crime.

    Algumas semanas depois, a Polícia Civil finalizou o inquérito, indiciando Marcus Vinícius Pereira Xavier, Urbano de Carvalho Malta e Djalma Gomes da Silva como articuladores do homicídio, Ademá Figuerêdo Aguiar Filho como autor dos disparos e Maurício Borges Sampaio como o mandante do crime. Em 27 de fevereiro, o MP-GO (Ministério Público do Estado de Goiás) denunciou os cinco indiciados por homicídio duplamente qualificado.

    No dia seguinte, Maurício Sampaio conseguiu habeas corpus na 1° Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Goiás, mas, no dia seguinte, o juiz Lourival Machado, da 2° Vara Criminal de Goiânia, converte em preventiva as prisões temporárias dos quatro acusados. Sampaio, então, retornou à prisão.

    Em novo habeas corpus, em 5 de março, Sampaio é solto por decisão liminar do desembargador Gérson Santana Cintra. Nove dias depois, no julgamento deste segundo habeas corpus, outros desembargadores vão contra a decisão de Gérson e decidem pela prisão preventiva de Sampaio.

    Depois de três idas a prisão e da primeira decisão que mandaria os cinco para júri popular, Maurício Sampaio, apontado como mandante do crime, reassume a Presidência do Atlético Clube Goianiense, mesmo time que o radialista, além de torcedor, costumava criticar. Em 12 de dezembro de 2016, Maurício é reeleito presidente do Atlético.

    A defesa dos acusados não respondeu aos pedidos de entrevista. O Atlético goianiense não quis comentar.

    Falsidade ideológica e coação de testemunhas

    Em abril de 2013, o delegado Manoel Borges de Oliveira ouve um dos réus, Marcus Vinícius, que, segundo investigações, teria sido forçado a negar a participação de Sampaio no crime.

    A defesa aproveitou-se do depoimento e pediu novo habeas corpus. Em 21 de maio, Sampaio é libertado de novo pelo Tribunal de Justiça e não voltou mais à prisão. Dois dias depois, o delegado Manoel Borges é afastado das funções por suspeita de irregularidades na oitiva de Marcus Vinícius e, em junho, denunciado pelo Ministério Público por falsidade ideológica.

    Em maio, o juiz Antônio Fernandes de Oliveira revoga as prisões preventivas de Urbano Malta, do cabo Ademá Figuerêdo, do sargento Djalma da Silva e do açougueiro Marcus Vinícius – que fugiu do Brasil e passou a constar na lista de procurados da Interpol. Ele foi preso em 8 de agosto de 2014, em Portugal.

    Já que Tamo junto até aqui…

    Que tal entrar de vez para o time da Ponte? Você sabe que o nosso trabalho incomoda muita gente. Não por acaso, somos vítimas constantes de ataques, que já até colocaram o nosso site fora do ar. Justamente por isso nunca fez tanto sentido pedir ajuda para quem tá junto, pra quem defende a Ponte e a luta por justiça: você.

    Com o Tamo Junto, você ajuda a manter a Ponte de pé com uma contribuição mensal ou anual. Também passa a participar ativamente do dia a dia do jornal, com acesso aos bastidores da nossa redação e matérias como a que você acabou de ler. Acesse: ponte.colabore.com/tamojunto.

    Todo jornalismo tem um lado. Ajude quem está do seu.

    Ajude

    mais lidas