Caso aconteceu na quadra de escola estadual no dia 23 de setembro; jovem ficou com lesões nas costas, rosto, braços e na mão direita
A família do jovem L.F.J., de 16 anos, tentará, com depoimento na Ouvidoria das Polícias de São Paulo, enquadrar os dois policiais militares acusados de agredir o garoto sob o crime de tortura. O caso aconteceu no dia 23 de setembro na Escola Estadual João Octávio dos Santos, localizada em Santos (SP).
Um boletim de ocorrência feito pelo pai do adolescente definiu o crime como “lesão corporal”, definição vista como distante da realidade pelo Condepe (Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana), que, atribui, com base nas imagens das lesões sofridas pelo jovem e no exame de corpo de delito, maior gravidade às agressões na abordagem.
“Existem sérios indícios de crime de tortura praticado pelos policiais militares nesse caso. A tortura ocorre quando alguém é constrangido com emprego de violência ou grave ameaça e submetido a intenso sofrimento físico e psicológico. A lei 9455 de 1997 prevê penas de dois a oito anos aos autores”, explica Ariel de Castro Alves, coordenador do grupo.
L.F.J. prestou depoimento na sexta-feira (7/10) no 6º Batalhão de Santos e, no começo da semana, será ouvido na Secretaria do Estado da Educação. O estudante e seu pai virão a São Paulo nesta semana para contar a versão dos fatos na Ouvidoria, que apura a conduta dos dois policiais envolvidos nesta abordagem, e tentar transformar a acusação em inquérito.
“Tortura é crime inafiançável e tem agravante quando praticado por um agente público. Aumenta a pena em caso de condenação. O garoto foi constrangido e agredido na frente dos colegas e não sabia qual o final das agressões deliberadas que sofreu”, aponta Alves.
Direção chamou PM por pedras arremessadas
Os dois policiais envolvidos no caso do jovem L.F.J. foram acionados pela direção da escola por conta de pedras lançadas da rua para dentro do colégio. Ambos atuam em uma base da PM próximo ao local, o que agilizou a ação. Quando entraram na quadra, encontraram o jovem e o agrediram.
Para o pai do adolescente, entretanto, os dirigentes da Escola Estadual João Octávio dos Santos deram outra versão para o sumiço do jovem, de 16 anos. “Fui para o colégio como se ele tivesse fugido. A diretora ligou mandando eu ir lá. Chegando, ela falou que meu filho tinha fugido. Assinei um termo de cinco dias de suspensão. Chegando em casa, liguei para ele, que me falou que não iria para casa por estar passando remédio no machucado que tinha. Pensei que fosse no pé, porque ele estava com um problema”, explica o pai à Ponte.
Segundo ele, iria brigar com o garoto para corrigir o ato. Quando o estudante voltou para casa, mostrou as lesões que sofreu e explicou o caso, a situação mudou. Sem conseguir dormir, o pai foi atrás dos policiais para entender o ocorrido. “Fui para a base, perguntei quais foram os PMs que receberam a ocorrência para apurar os fatos e um disse que foi ele. Deu a versão, que foi chamado para a escola e em nenhum momento colocou a mão no meu filho. Mostrei as fotos. Ele seguiu dizendo que não encostou a mão no meu filho, que era mentira”, relembra.
No boletim de ocorrência, um dos policiais afirma que, quando abordou L.F.J., o estudante tentou escapar e, ao ser segurado pelo agente, caiu e sofreu as lesões.
“A escola argumentou o chamado dos policiais pelas pedras jogadas. Mesmo que estivesse provado sendo o garoto o autor do ato de vandalismo, o que não aconteceu, ainda assim, não é motivo plausível para justificar a tortura praticada pela dupla de PMs”, critica Ariel de Castro Alves, que encaminhou a denuncia à Ouvidoria, tendo esta denunciado as violências para a Corregedoria e o Ministério Público.
Estudante cogita ir para colégio a 5 km de casa
L.F.J. trabalha junto com o pai, que é pedreiro, como ajudante em reformas. Inicialmente, ficou sem sair de casa após o caso, mas, depois de alguns dias, voltou à vida normal. Segundo o pai, ele não vai parar de estudar.
“Tento passar um pouco para ele aprender enquanto é menor de idade. Quero garantir ao menos uma profissão. Se não aprender, terá de correr atrás depois. Eu parei de estudar, não vou deixar ele fazer o mesmo. Tem os amigos na escola que darão apoio. Ele não vai parar de estudar, não”, diz o pai.
O adolescente, porém, sente receio de voltar para o mesmo colégio. Distante menos de um quilômetro da casa onde mora com os pais, a escola estadual é a mais próxima para ele. Caso queira se transferir em meio ao ano letivo, terá de ir para outra unidade, distante entre quatro e cinco quilômetros de onde mora.
“Ele quer mudar exatamente pelo trauma. Acho que não será necessário, não. Espero que não. Se tiver, vou apoiá-lo. Quero o melhor para ele”, garante o pai.