Decreto que desapropriou agricultores no RJ na gestão Cabral pode ser revogado

    Alerj estuda devolver terras retiradas de agricultores pelo ex-governador do Rio, Sérgio Cabral, em 2009, em decreto considerado ilegítimo por especialistas

    Comissão da Alerj durante discussão para elaborar pedido de revogação de decreto (Carolina Moura | Ponte Jornalismo)

    Há oito anos, durante o governo do Sérgio Cabral, mais de 1.500 agricultores foram expulsos de suas terras no 5º distrito de São João da Barra, Açu, no Norte do estado do Rio de Janeiro, para dar lugar ao Porto do Açu e a promessa de um Complexo Industrial, do empresário Eike Batista. Um projeto para anular as desapropriações feitas pelo Poder Executivo e devolver as terras aos seus devidos donos está sendo formulado por parlamentares da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj).

    Noêmia Magalhães, de 70 anos, contou que durante todos esses anos viu colegas morrerem de desgosto ao ver sua casa ser demolida, alguns adoeceram, outros nunca mais apareceram. “Como podem fazer isto com a população? Estamos querendo nossos direitos”, disse ela. “Eles tentaram nos enterrar, mas esqueceram que somos sementes”, completou. “Estamos aqui, senhores deputados, porque é a nossa casa. Não queremos que vocês fiquem do nosso lado, mas do lado do bem”.

    Segundo o vice-presidente da Associação de Pequenos Produtores e Agricultores do local (Asprim), Rodrigo Santos, eram produzidas mais de 185 mil toneladas de hortifrutigranjeiros na região. “Os agricultores fortaleciam Campos e o Rio, até que começaram a ter uma redução na produção desde que a desapropriação começou a transcorrer. Isso não foi compensado pelo estado. Hoje estamos produzindo muito menos e a despesa dos produtores está cada vez maior”, explicou Santos.

    O deputado presidente da Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da Alerj, Marcelo Freixo (Psol), afirmou que o Porto nunca operou com a capacidade anunciada e que boa parte das terras desapropriadas estão hoje abandonadas. “Hoje foram sete partidos diferentes presentes nesta audiência. Podemos conseguir uma grande maioria dos deputados concordando em anular o decreto das desapropriações”, disse o deputado. “Isto vai devolver às famílias a dignidade, a justiça e terra”, afirmou.

    A defensora pública de São João da Barra, Ana Carolina de Araújo, declarou que não há destinação para as terras que sofreram desapropriação e, especialmente por isso, o ato do ex-governador pode ser considerado ilegítimo. “Foi uma retirada cruel para colocar nada no lugar. Não houve motivo legítimo nem legal para a criação do decreto. Houve violação de direitos e benefício exclusivo de interesses particulares“, informou.

    Relembre o caso

    No dia 19 de junho de 2009, o Poder Executivo decretou a desapropriação de cerca de 72 km² de terras do 5º distrito de São João da Barra, Açu, Norte Fluminense, com o objetivo de implantar no local um Complexo Industrial. A área foi entregue à empresa LLX, do empresário Eike Batista, por meio da Companhia de Desenvolvimento Industrial do Estado do Rio de Janeiro (Codin). Agricultores reclamam de violência e descaso por parte da Codin e dizem que ainda não receberam indenizações. Dona Noêmia Magalhães, moradora e agricultora da região, relatou que alguns de seus vizinhos chegaram a ser retirados à força e tiveram suas casas demolidas. Ela, que continua morando na área como forma de resistência, já recebeu ligações com tom de ameaça e já teve revólver apontado para sua cabeça.

    Outro lado

    A Companhia de Desenvolvimento industrial do Rio de Janeiro (Codin) – que seria responsável pelo gerenciamento das indenizações aos agricultores – foi procurada por e-mail pela Ponte Jornalismo, mas, até o momento, não se manifestou.

    Já que Tamo junto até aqui…

    Que tal entrar de vez para o time da Ponte? Você sabe que o nosso trabalho incomoda muita gente. Não por acaso, somos vítimas constantes de ataques, que já até colocaram o nosso site fora do ar. Justamente por isso nunca fez tanto sentido pedir ajuda para quem tá junto, pra quem defende a Ponte e a luta por justiça: você.

    Com o Tamo Junto, você ajuda a manter a Ponte de pé com uma contribuição mensal ou anual. Também passa a participar ativamente do dia a dia do jornal, com acesso aos bastidores da nossa redação e matérias como a que você acabou de ler. Acesse: ponte.colabore.com/tamojunto.

    Todo jornalismo tem um lado. Ajude quem está do seu.

    Ajude

    mais lidas