Duas semanas depois, a família quer saber: onde está Carlos Eduardo?

    Família de Cadu e polícia continuam buscas pelas matas da região; jovem desapareceu, segundo testemunhas, depois de ser levado por PMs na periferia de Jundiaí (SP)

    Carlos Eduardo dos Santos Nascimento, o Cadu, está desaparecido desde o dia 27 de dezembro | Foto: arquivo pessoal

    Os familiares de Carlos Eduardo dos Santos Nascimento, 20 anos, estão há duas semanas sem notícias do jovem, que desapareceu, segundo testemunhas, depois de uma abordagem policial na tarde do último dia 27 de dezembro, no bairro Jardim São Camilo, periferia de Jundiaí, interior de São Paulo.

    O jovem estava em um bar, na rua Benedito Basílio Souza Filho, no bairro Jardim São Camilo, com mais quatro amigos quando foi abordado pela PM. Todos foram revistados, mas apenas Carlos Eduardo, o único negro do grupo, teve o celular apreendido e foi levado pelos policiais.

    As investigações sobre o paradeiro de Carlos Eduardo, o Cadu, como é conhecido por todos, estão sendo feitas pela Polícia Civil, via DIG (Delegacia de Investigações Gerais de Jundiaí), e pela Polícia Militar, via Corregedoria. Três policiais, um sargento e dois soldados, todos do 49º BPM/I (Batalhão da Polícia Militar do Interior), foram afastados das ruas.

    A Ponte esteve em Jundiaí e conversou com o pai do jovem, o segurança Eduardo Aparecido do Nascimento, 50 anos. “Qualquer barulho no meu celular eu já fico desesperado. Não estou mais dirigindo, imagina sair com o carro e receber uma notícia ruim do meu filho?”, disse Eduardo à reportagem.

    A mãe de Cadu, a dona de casa Carla Santos, 38 anos, está muito abalada e não quis conversar com a reportagem sobre o desaparecimento do filho. Pensar em Cadu, principalmente rememorar a infância do filho mais velho, afirmou Carla, é tocar em uma ferida que está muito aberta.

    A última vez que Eduardo falou com o filho foi na noite de Natal, quando Cadu disse que passaria o Ano Novo com ele e a esposa. “No Ano Novo vou aí, quero pegar um rango da Cidinha”, disse Cadu ao pai ao telefone.

    Eduardo sorri ao contar a relação do filho e com a sua esposa, mas lembra que nem sempre foi assim. “Acho que o Cadu tinha aquele medo que as pessoas têm da palavra madrasta. Demorou um pouco, mas ela conquistou ele”, afirma.

    O celular de Cadu, até pouco tempo, mostrava o horário das 17h do dia 27 de dezembro como última visualização no aplicativo de mensagens WhatsApp. Quando os familiares ligam para o aparelho, cai direto na caixa postal, desde o sumiço do jovem. Agora, seu perfil no WhatsApp parece desativado, sem foto ou informações de visualização.

    Eduardo, pai de Cadu, mostra que conta do filho no WhatsApp foi desativada | Foto: Caê Vasconcelos/Ponte Jornalismo

    Na última quinta-feira (9/1), os pais de Cadu foram conversar com um advogado que se disponibilizou a acompanhar o caso. Depois de uma hora e meia de reunião decidiram que não aceitariam. “Não sentimos firmeza”, disse o pai de Cadu assim que saiu da reunião. O clima da família é de desconfiança e medo de confiar nas pessoas.

    Os amigos de Cadu e testemunhas da operação policial não querem falar sobre o assunto. “A princípio eles estavam conversando com a gente. Mas agora se afastaram. Eu não sei o motivo, mas se afastaram. Me disseram que não iam mais falar sobre o assunto”, conta o pai, sem disfarçar a decepção.

    Ele afirma que, além da paixão pelo futebol – viver de futebol já foi foi um dos sonhos de Cadu na infância – os amigos são a segunda coisa favorita do jovem. “Ele tem tantos amigos… mas nenhum amigo dele está fazendo por ele o que ele faria”, lamenta o pai.

    “Se acontecesse isso com um amigo, você pode ter certeza, ele teria ido na delegacia contar o que viu. Mas os amigos não estão fazendo isso por ele. Não querem depor, não querem falar nada. Se fosse o contrário ele estaria lá e cobraria os outros para estarem lá”, continua.

    Carlos Eduardo ainda não sabia muito bem o que fazer no futuro, mas o pai conta que um dos sonhos do filho era abrir sua própria barbearia. “Eu falei pra ele ir atrás que dá certo, ele disse que ia pensar. Mas aí aconteceu tudo isso”.

    “O Cadu ia terminar o ensino médio, ia voltar a estudar esse ano, para fazer uma faculdade, porque eu sou segurança em uma faculdade e ele não pagaria nada, teria bolsa. Ele disse que ia terminar e falávamos disso depois. Mas não deu tempo…”, diz Eduardo, que não esconde a ponta de esperança em rever o filho. “Sei que vai dar tempo, sim”.

    Os primeiros dias depois do desaparecimento

    O pai conta o desespero quando recebeu a notícia de que o filho foi levado pela Polícia Militar. Foram três dias correndo de um lado para o outro sem nenhuma informação. Eduardo relata que, até o dia terceiro dia, não conseguiu sequer registrar o desaparecimento do filho na delegacia.

    Delegacias, batalhões da polícia, hospitais foram os locais que o pai percorreu atrás do filho no primeiro dia de desaparecimento. “Deixei para ir no IML por último. Felizmente ele não estava lá. Tá sendo bem complicado pra gente. Imagina, desde o dia 27 você não ter notícia nenhuma? Não saber se está vivo, se está morto, como que ele está”, afirma Eduardo.

    “Quando ele foi supostamente detido, ligaram para a namorada dele, que entrou em contato com a mãe dele, que me ligou. “Prenderam o Carlos Eduardo”. Ela disse que não sabia o motivo, mas que não podia ir lá ver, porque estava no hospital. Então eu fui até o plantão policial. Quando cheguei lá, me informaram que ele não estava preso”, conta.

    Foi quando, afirma o pai, amigos de Cadu avisaram que ele foi levado pela PM e que poderia estar no batalhão da corporação. Mesmo sabendo que pessoas detidas não são levadas para o batalhão, Eduardo foi até lá. “Me falaram que não houve operação nenhuma no São Camilo”, afirma.

    No dia 28 de dezembro, Eduardo voltou aos três locais do dia anterior, mas a resposta era a mesma: ninguém sabia de Cadu. “Aí começamos a fazer as denúncias e apareceu que teve, sim, abordagem no Jardim São Camilo, que foram abordados cinco meninos, quatro foram revistados e o Cadu levado pela viatura. Agora os policiais estão afastados, fazendo serviço burocrático, recebendo, com a família deles e a gente não tá com o nosso filho”, critica o pai.

    As buscas

    Desde o dia 27 de dezembro, buscas por Cadu são feitas em Jundiaí. A princípio, familiares e amigos do jovem se reuniam e saíam pelos locais de mata da região atrás de alguma pista. Cerca de 40 pessoas somavam forças para tentar achar o jovem.

    Na última terça-feira (8/1), afirma o pai de Cadu, pela primeira vez, as buscas contaram com a presença da Corregedoria da Polícia Militar e de cães farejadores do Batalhão de Choque. O local das buscas foi um matagal em Jarinu, município de São Paulo localizado a 35 km do local onde Cadu desapareceu. O cheiro de Cadu foi sentido duas vezes no local, afirmou o pai à Ponte.

    “Já fizemos várias buscas, mas não conseguimos localizar nada. Tá difícil. Ontem foi feita a primeira busca com cães farejadores, que a Corregedoria trouxe para cá. Antes estava sendo só a gente procurando. Eu, a mãe dele, minha esposa, os cunhados, os tios, alguns amigos… só a partir de ontem que a polícia entrou na mata”, conta Eduardo.

    Outro lado

    A Ponte questionou a SSP-SP (Secretaria da Segurança Pública de São Paulo), liderada pelo general João Camilo de Campos neste governo de João Doria (PSDB), sobre o andamento das investigações. Às 7h40 desta sexta-feira (10/1), a InPress, assessoria de imprensa terceirizada da pasta, enviou nota apontando que “todas as circunstâncias relativas ao caso são apuradas pela Polícia Civil e pelo 49º Batalhão de Polícia Militar de Jundiaí”.

    “A Corregedoria da PM acompanha o caso e, juntamente com equipes da área, realiza buscas pela região, com o apoio de canil da PM e do Corpo de Bombeiros. Os policiais envolvidos na ocorrência permanecem afastados”, finaliza o documento enviado pela SSP.

    Atualização às 16h23 desta sexta-feira (10/1) para inclusão da nota da SSP.

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