Entidade internacional critica fim de investigações de militares por 8 mortes no RJ

    Ministério Público Militar do Rio de Janeiro arquivou inquérito sobre possível autoria do Exército em chacina no morro do Salgueiro, ocorrida em 2017, sem fazer procedimentos básicos; Human Rights Watch critica decisão

    Estrada das Palmeiras, de onde partiram os disparos que mataram 8 pessoas | Foto: Daniel Arroyo/Ponte Jornalismo

    “Estabelece um precedente inaceitável”. Essa é a definição de Maria Laura Canineu, diretora da Human Rights Brasil, para a decisão do MPM (Ministério Público Militar) em arquivar a investigação que apurava a participação de integrantes do Exército na morte de oito pessoas no Morro do Salgueiro, em São Gonçalo, cidade localizada na região metropolitana do Rio de Janeiro.

    Desde 2016, homicídios cometidos por militares contra civis são de responsabilidade da Justiça militar, conforme lei assinada pelo então presidente Michel Temer em 2017. Baseado nesta nova regra, o MPM comandou a investigação e não encontrou provas que liguem os militares ao caso. Porém, Maria Laura questiona o trabalho.

    “Nossa percepção é de que não foram tomadas medidas suficientes para terem arquivado o caso, como entrevista das famílias. A gente os entrevistou, como Exército e MP militar não foram atrás?”, questiona. “Até a própria perícia da mata de onde os tiros vieram. Como arquiva uma investigação sem ter tomado medidas básicas e cruciais? São falhas graves”, continua a representante da HRW.

    Na madrugada do dia 11 de novembro de 2017, 11 pessoas foram baleadas por munição calibre 5,56 de disparos vindos da mata na Estrada das Palmeiras. Os atiradores vestiam preto, tinham o rosto totalmente coberto com balaclava, usavam fuzis com mira laser e lanternas para conseguir agir com precisão na escuridão. A população aponta que eram integrantes das Forças Armadas.

    Naquele dia existia uma operação na comunidade. Estavam presentes o Core (Coordenadoria de Recursos Especiais), da Polícia Civil fluminense, a PM e o Exército Brasileiro. Três veículos blindados entraram na comunidade por volta de 1h, sendo um caveirão com policiais civis, um Guarani, que tinha militares do Exército, e um terceiro com policiais civis e militares.

    Marcio Melanes Sabino, Marcelo Silva Vaz, Luiz Américo da Silva Menezes, Victor Hugo Costa Carvalho, Bruno Coelho da Agonia, Lorran de Oliveira Gomes e Josué Coelho morreram no local. A oitava vítima, o mototaxista Luiz Otávio Rosa dos Santos, foi socorrido e levado ao Hospital São Gonçalo e chegou a depor na polícia, mas não resistiu aos ferimentos e morreu em 1º de dezembro de 2017.

    Até hoje, não há a confirmação de quem puxou os gatilhos. “A Justiça militar, o MP militar, poderá acabar arquivando qualquer investigação e tem coloca o caso do Salgueiro na escuridão completa. Os tiros saíram da onde, do céu? Não é possível”, critica Maria Laura, que destaca ter ficado provado no processo que nem a Polícia Civil nem traficantes da área foram autores dos disparos.

    “São oito pessoas, oito famílias que merecem justiça, merecem esclarecimentos para que não se repita. Não é só pelo direito de justiça, mas também pelo precedente de punição que desestimule novas violações. Isso mostra que a Justiça militar não é imparcial o suficiente para promover justiça nos casos de graves violações cometidas pelo Estado”, analisa.

    Para a diretora da Human Rights, o arquivamento das investigações que ligam o Exército à chacina do Salgueiro reforça a necessidade de revogação da lei assinada por Michel Temer. Segundo ela, apenas autoridades civis são capazes de julgar com parcimônia crimes cometidos por militares.

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