Estado matou o filho de Givonete e a abandonou à própria sorte

    Aposentada perdeu o filho assassinado em maio de 2006. Aos 66 anos, passou por depressão, artrite, trombose e, sem dinheiro para tratamento, corre o risco de ficar cega

    Aos 66 anos, Givonete Damasceno Filgueira apresenta uma série de problemas de saúde. É cega de um olho, tem uma trombose que a força a ficar boa parte do tempo deitada em um dos três sofás de sua sala, de aproximadamente 5 metros quadrados no bairro da Canaleira, em Santos, litoral de São Paulo. Ela depende de remédios do governo para sobreviver. As doenças vieram a partir de maio de 2006, quando seu filho, Robson Damasceno Filgueira, foi assassinado nos Crimes de Maio.

    Leia também: Vera Lúcia Gonzaga dos Santos: mais uma vítima dos crimes de maio de 2006

    Naquele ano, o PCC (Primeiro Comando da Capital) atacou uma série de prédios e integrantes da segurança pública de São Paulo, causando 59 mortes de agentes públicos. Em resposta, o Estado atacou. O revide provocou um banho de sangue entre os dias 12 e 26 daquele mês.

    Policiais que vestiam a farda da corporação ou usavam as toucas ninjas dos grupos de extermínio reagiram a esmo aos ataques do PCC. Mataram 505 pessoas em todo São Paulo. Robson era uma delas. O Estado deixou Givonete à sua sorte, sem ter o alicerce da família, então feito pelo seu filho.

    De lá por diante, a aposentada tem a saudade como principal sua doença. Passou por uma depressão e tem sentido na pele, nas pernas e na vista o peso da ausência. Quem a ajudava era Robson. Sem ele, a vida é outra. “Esse filho era o maior amor que a gente tinha. Virou tudo com a perda”, lamenta.

    ‘Nete, mataram o teu filho!’

    Ao chegar à casa de dona Givonete, eu e Débora Silva, coordenadora do grupo Mães de Maio, que luta por justiça para as vítimas da violência de Estado, somos recepcionados por ela em sua sala de estar — pequena —, uns cinco metros quadrados. Ela está sentada num dos três sofás dispostos — cada um com dois assentos —, muito simpática e acolhedora pede para nos acomodarmos, oferece um café e diz para ficarmos à vontade. 

    A família no bairro Caneleira, em Santos | Foto: Ailton Martins/Ponte

    Iniciamos a entrevista, dona Givonete prontamente explica que, devido à trombose que teve nas pernas, possui problemas de mobilidade, com isso não consegue acessar o andar superior da casa, local onde ficam os quartos, portanto a sala de estar transformou-se em seu quarto e também o local onde passa a maior parte de seu tempo. Todos os afazeres domésticos basicamente são por conta de sua nora e de seu companheiro, José Filgueira, 71.

    Leia também: O Estado no banco dos réus: MP pede indenização a 564 vítimas dos Crimes de Maio

    Dona Givonete apesar de todos os problemas de saúde, que não são poucos, apresenta muita força e resistência quando se expressa. Ao término de sua falas sempre agradece a Deus por mais um dia: “Eu sou evangélica, tenho muita fé e sei que existe algum motivo pra tudo isso acontecer”.

    Sobre a morte do filho, em um Dia das Mães, 14 de maio, conta que recebeu a notícia de uma sobrinha: “Nete, mataram o teu filho!”. Sua reação foi perguntar: “Como, se ele é forte?”. Havia sido assassinado em um baile, por um grupo encapuzado. Anos depois, um de seus netos também foi assassinado.

    Dona Givonete mora em bairro pobre de Santos, no litoral de São Paulo | Foto: Ailton Martins/Ponte

    A tragédia desencadeou um processo de adoecimento psíquico em toda a família. Na casa, cinco pessoas passaram a fazer tratamento psicológico depois do assassinato.

    Entre uma pergunta e outra, ela pede para que o companheiro, que acompanha a entrevista, pegue seus remédios, que estão na cozinha, dentro de uma caixinha de sapatos. Nela estão os inúmeros remédios que toma. “Eu preciso tomar todos esse remédio pra continuar enxergando e vivendo!”, diz. Em seguida, ela mostra a injeção que custa R$ 12 mil e que o governo lhe fornece integralmente sem custos adicionais, e a “lágrima”, um medicamento que custa R$ 135,00, esse que ela tem que custear.

    Construa a Ponte!

    Para esses últimos, o dinheiro não tem dado conta. Seu maior medo é ficar cega. A mulher tem conseguido os remédios para a visão graças a doações, pois o valor das medicações é alto. “Graças a Deus estou aqui com vida. Eu sou evangélica, tenho muita fé e sei que existe algum motivo pra tudo isso acontecer, mas peço: não quero perder minha vista. Preciso continuar o tratamento”.

    Para quem quiser ajudar dona Givonete:

    Givonete Damasceno Filgueira
    Banco: Bradesco
    Agência: 6572
    Conta: 0010805-7
    CPF: 529.548.544-72

    Já que Tamo junto até aqui…

    Que tal entrar de vez para o time da Ponte? Você sabe que o nosso trabalho incomoda muita gente. Não por acaso, somos vítimas constantes de ataques, que já até colocaram o nosso site fora do ar. Justamente por isso nunca fez tanto sentido pedir ajuda para quem tá junto, pra quem defende a Ponte e a luta por justiça: você.

    Com o Tamo Junto, você ajuda a manter a Ponte de pé com uma contribuição mensal ou anual. Também passa a participar ativamente do dia a dia do jornal, com acesso aos bastidores da nossa redação e matérias como a que você acabou de ler. Acesse: ponte.colabore.com/tamojunto.

    Todo jornalismo tem um lado. Ajude quem está do seu.

    Ajude

    mais lidas