Favela do Amor, em Santo André (SP), tem dia de atividades em homenagem a Lucas, morto em 2019

Adolescente completaria 17 anos nesta segunda-feira (25) se não tivesse sido encontrado morto em uma represa dois dias após, segundo testemunhas, uma ação da PM na favela onde ele morava

Atividade aconteceu na rua da favela onde menino Lucas vivia, em Santo André | Foto: Kaique Dalapola/Ponte

Crianças e adultos tiveram um domingo cheio de atividades artísticas na Favela do Amor, no Jardim Santa Cristina, em Santo André (ABC Paulista), neste domingo (24/4). O local que recebeu as atividades é onde vivia o menino Lucas Eduardo Martins dos Santos, que completaria 17 anos nesta segunda-feira (25/4) se não tivesse sido morto em novembro de 2019. 

O garoto desapareceu após, segundo testemunhas, uma ação da Polícia Militar na favela. Dois dias depois, o corpo do adolescente foi encontrado em uma represa. A história embasa o minidocumentário Vidas Represadas, que foi exibido na rua da comunidade neste domingo, e emocionou familiares e vizinhos do adolescente.

O evento, que foi organizado pela Rede de Proteção e Resistência contra o Genocídio, pediu novamente respostas e justiça para o caso de Lucas, além de ter levado diversas atividades, incluindo música e pinturas, para a comunidade. 

Para a mãe do menino, Maria Marques Martins dos Santos, de 42 anos, esse tipo de evento é importante para ela e para a toda a comunidade. “Trazer essa alegria para as crianças e ver os sorrisos dos amigos do Lucas, dos irmãos dele, me deixa feliz e mostra que temos apoio”, diz. 

Maria, no entanto, ressalta que todos os momentos ficam tristes sem a presença de Lucas. “Queria que ele estivesse presente. É uma revolta que permanece em mim, porque acontece tudo e a Justiça nunca faz nada. A polícia é culpada, eles são os assassinos, mas não pagam”. 

Rua tem grafite com rosto do menino que completaria 17 anos nesta segunda-feira (25) | Foto: Kaique Dalapola/Ponte

Ela ficou emocionada ao assistir o documentário que conta sobre o filho. Segundo ela, “cada dia que passa e tudo que é feito faz a saudade aumentar”. Maria acredita que a circulação da obra pode auxiliar na busca por justiça e não deixar que o filho seja esquecido.  

A diretora artística do documentário Vidas Represadas, Soraia Costa, do Instituto Social Cultural Brasil, também acredita que a obra pode proporcionar uma reflexão importante para manter viva a memória do menino morto. “Reviver essa história faz com que a denúncia continue sendo pautada e a gente continue buscando essa resposta que ainda não nos foi dada, que é: quem matou o Lucas?” 

Mulheres da Rede de Proteção que participaram da organização da atividade | Foto: Kaique Dalapola/Ponte

A articuladora da Rede de Proteção Katiara Oliveira, que também participou da produção do documentário, destaca que o filme “é uma forma de deixar um registro de uma situação complexa, e mostrar que todas as quebradas têm ‘desova’ e têm medo da polícia, então é uma ferramenta para fortalecer as quebradas”. 

Katiara afirma que o documentário é para “desmentir a versão da polícia e o laudo que aponta que o Lucas morreu por afogamento, e para denunciar as ‘desovas’, o racismo e dar visibilidade ao caso do Lucas”.  

O filme, produzido pela Rede de Proteção, foi construído coletivamente, com participações de moradores da comunidade, incluindo a mãe do Lucas. Esse cuidado na construção do documentário, segundo Soraia, fez com que o retorno fosse bastante positivo. 

Antes da exibição do documentário, duas irmãs gêmeas de 10 anos, filhas da advogada e rapper Jacque Cipriany, fizeram uma intervenção artística desenhando no corpo de quase todos presentes. “Elas foram dormir cedo ontem, e acordaram seis e pouco da manhã, na maior ansiedade de colaborar na atividade”, conta a rapper. Na parte final do evento, ela também se apresentou, juntamente com outros cantores de rap que convidados para a atividade.

Crianças fizeram desenhos em parte da atividade em Santo André | Foto: Kaique Dalapola/Ponte

Advogados de diversas áreas também fizeram o que foi chamado de “mutirão jurídico”, auxiliando os moradores a esclarecer dúvidas e dando direcionamentos de pendências judiciais, e o evento teve também uma apresentação da atriz Débora Constantino para as crianças. 

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A bibliotecária Roberta Kelly França, articuladora da Rede de Proteção na região do ABC Paulista, acredita que a atividade cumpriu o objetivo de “mostrar para a família que não está sozinha”. Segundo ela, “esse ato não mostra quem matou o Lucas, não é uma resposta direta, mas mostra para família que nos importamos. E é isso que nos falta como sociedade: mostrar que quando uma criança morre de forma violenta, devemos todos nos importar”. 

Apresentação da atriz Débora Constantino | Foto: Kaique Dalapola/Ponte

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