Governo busca responsabilizar vítimas por mortes em Paraisópolis, diz defensor

    Dimitri Sales, presidente do Condepe, fala em ‘vazamento seletivo’ de informações; Corregedoria da PM teve acesso parcial aos laudos

    Ato realizado em 4/12 em frente ao Palácio do Governo de SP repudiou ação da PM | Foto: Daniel Arroyo/Ponte Jornalismo

    O presidente do Condepe (Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana), Dimitri Sales, afirma que tem sido seletiva a divulgação dos laudos que apontam as causas das mortes das 9 vítimas do massacre de Paraisópolis, no dia 1º/12, na tentativa isentar a Polícia Militar de qualquer responsabilidade.

    Nesta sexta-feira (13/12), uma reportagem da Folha de S.Paulo afirma que teve acesso aos laudos e que eles indicam que nos corpos foram identificados traumas condizentes com pisoteamentos, como “contusões e escoriações”. A informação legitima a versão dada desde o princípio pela PM. Até o momento, 37 PMs estão afastado das ruas.

    “A gente não teve acesso aos laudos e soubemos que não foram liberados todos os laudos. O que me parece é que há um vazamento seletivo na tentativa de comprometer a opinião pública tirando a responsabilidade de quem praticou atos ilegais e com abuso de autoridade, para recair sobre as vítimas a responsabilidade pela sua morte”, pondera Dimitri Sales.

    O estudante universitário Danylo Amílcar, 19 anos, irmão de Denys Henrique Quirino da Silva, 16, uma das vítimas do massacre, afirma que a reportagem tende ao engano “O que aconteceu em Paraisópolis foi a morte de nove pessoas em decorrência de uma ação truculenta da polícia. As pessoas morreram porque foram cercadas pela polícia e espancadas. Vídeos mostram isso. Ela [a reportagem] não ajuda em nada na investigação, mas não achamos que vai atrapalhar as investigações”, afirmou.

    Nem mesmo a Corregedoria da PM, que está apurando a eventual responsabilidade dos policiais no episódio, recebeu todos os laudos. O corregedor, coronel Marcelino Fernandes, orientou a reportagem a falar com a SSP-SP (Secretaria de Segurança Pública de SP) sobre o caso e se limitou a dizer que o órgão segue empenhado em apurar os fatos. “É preciso apurar por que nove pessoas morreram. A questão é essa. O Estado tem que apresentar para a sociedade o que aconteceu e quem são os responsáveis. Ponto final”, afirmou ao telefone.

    Um outro trecho da reportagem da Folha de S.Paulo traz resultados de exame toxicológico e destaca que todas as vítimas tinham usado algum tipo de droga. “Na lista de elementos detectados, estão álcool, cocaína, lança-perfume (loló), anfetamina e crack. A maioria das vítimas ingeriu álcool e lança-perfume, duas delas apenas o lança –produto muito comum nesse tipo de bailes de periferia. Uma das vítimas tinha, porém, quatro tipo de substâncias diferentes pelo corpo: álcool, lança-perfume, cocaína e crack”, diz reportagem.

    Danylo Amílcar afirma que essas informações tentam criminalizar as vítimas. “Nenhuma das 9 pessoas morreram por conta de uso de drogas, morreram pela violência policial. O vazamento de informações, da maneira como ocorreu, produz enganos, e favorece o discurso dos que querem criminalizar as vítimas”, diz irmão de uma das vítima.

    Para Dimitri Sales, esse tipo de informação pode inverter a lógica na cabeça da opinião pública. “Isso é um absurdo e continuamos firmes no dever de apurar rigorosamente as responsabilidade diretas e indiretas de quem quer que seja. O que não pode é culpabilizar ou responsabilizar as vítimas por sua trágica partida”, pondera o advogado e presidente do Condepe.

    Na semana passada, reportagem da Ponte trazia algumas análises preliminares, de acordo com os atestados de óbito, que apontavam que o uso de gás pode ter contribuído para as mortes. Pelo menos duas vítimas morreram asfixiadas.

    A Ponte procurou a SSP-SP (Secretaria de Segurança Pública de SP) para comentar as declarações do presidente do Condepe e também para saber sobre os laudos. Em nota, a pasta confirma que os laudos foram recebidos pelo DHPP e anexados ao inquérito. “De acordo com a autoridade policial responsável pelo caso, as primeiras análises mostram quem as vítimas têm traumas compatíveis com os de pisoteamento. Até o momento, cerca de 40 oitivas já foram anexadas ao inquérito e a equipe analisa imagens, áudios e demais informações da investigação”, diz nota. Por fim, reforça que a Corregedoria da PM também apura todas as circunstâncias relativas à ocorrência em um IPM (Inquérito Policial Militar).

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