‘Inocentar PM é incentivar abuso policial’, lamenta pai de adolescente morto

    Major Herbert Saavedra foi inocentado pelas mortes de Felipe e Douglas, ocorridas há 7 anos na Grande SP; júri considerou que PM agiu em legítima defesa

    Douglas e Felipe eram amigos de infância | Foto: arquivo pessoal

    “É lamentável [o resultado do julgamento]. Eu resumi tudo como sendo um grande circo, aquelas encenações que a defesa fez, uma afronta para com a justiça e um incentivo para que cada vez mais a polícia use e abuse”, afirma José Valdo da Silva, a respeito do julgamento do major Herbert Saavedra, acusado de matar seu filho, Douglas da Silva, em 2011. Douglas foi assassinado junto com o amigo Felipe Macedo Pontes, ambos com 17 anos, no bairro Demarchi, em São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo.

    Saavedra – um dos três PMs acusados pelo Ministério Público de terem cometido os crimes – foi julgado pelo tribunal do júri na última quarta-feira (29/8), no Fórum de São Bernardo, e considerado inocente por 4 votos a 3. A promotora do caso, Thelma Tahis Cavarzere, vai recorrer da decisão. O julgamento dos outros dois PMs, Alberto Fernandes de Campos e Edson Jesus Sayas Junior, ainda não tem previsão para acontecer.

    Para o MP, os policiais mataram Douglas com o objetivo de “assegurar a ocultação e a impunidade do homicídio que praticaram contra Felipe”. José Valdo lembra que, quando foi fazer o reconhecimento do corpo do filho, contou 5 disparos, todos nas costas de Douglas. “Não culpo os jurados. Eles estão ali ouvindo uma parte da história. O discuso da defesa era muito forçado. Eles disseram que o Douglas não sumiu, que ele teria dado entrada no hospital às 21h40 e os fatos aconteceram 21h30. É mentira. Eu próprio, na ocasião, fui até o pronto-socorro onde o meu filho foi localizado e a chegada dele lá se deu depois da meia noite”, contou Valdo.

    Douglas da Silva, “o filho que todo pai gostaria de ter”

    Felipe e Douglas eram amigos de infância e as famílias, bastante próximas. Os dois estudaram na mesma sala e se encontravam com frequência para jogar vídeo game. Valdo afirma que o filho era muito companheiro dele. “Nós eramos 4, uma família extremamente feliz e éramos sempre muito solidários uns com os outros. Era um menino muito bom, prestativo, é um menino que me atrevo a dizer que era o filho que todo o pai gostaria de ter”, diz.

    Passados três meses do crime, José Valdo começou a investigar as mortes por conta própria. No boletim de ocorrência feito na época, onde havia apenas a versão dos PMs, constava a informação de que assaltos estariam acontecendo no bairro e que esses crimes estariam sendo cometidos por dois adolescentes de moto. “Eu interroguei alguns comércios da região e descobri que essa versão era fantasiosa. De que não houve assaltos, não tinha nenhuma moto circulando, aterrorizando as pessoas”, lembra o pai de Douglas.

    “O meu sonho é que nada disso tivesse acontecido. Justiça eu não acredito. Você vê aí crimes grandes, sempre tem polícia envolvida. Eu já não confiava na polícia, hoje mais ainda”, declarou Valdo.

    Para o advogado Ariel de Castro Alves, do Condepe (Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana), que prestou auxílio aos familiares no caso, o resultado do júri foi uma afronta ao senso de justiça e um estímulo à violência policial.

    “A decisão dos jurados contraria frontalmente as provas dos autos. Uma testemunha ouvida pela polícia e pela justiça, um frentista de um posto de gasolina que trabalhava em frente ao local dos fatos, disse que viu a abordagem, onde os jovens saíram da moto com as mãos na cabeça e desarmados, quando os policiais fizeram vários disparos contra eles. A testemunha ainda chegou a presenciar os PMs forjando provas no local do crime, para simular um suposto confronto. Ela afirmou ter visto os policiais tirando armas de fogo de dentro da viatura da PM e colocando as nas mãos dos jovens”, declarou.

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