Menino de 12 anos foi morto pela PM de SP sem resistência, afirma ouvidor

    Duas semanas antes do crime, PM teria falado para a mãe de Miguel comprar um ‘caixão pequeno’; ouvidor diz que, se confirmada, ameaça é ‘indício de crime premeditado’

    Miguel de Souza tinha apenas 12 anos | Foto: arquivo pessoal

    Sem resitência e com um tiro nas costas. Foi assim que Miguel de Souza, 12 anos, morreu depois de uma perseguição policial em São José dos Campos, interior de São Paulo. O Relatório da Ouvidoria, divulgado nesta sexta-feira (25/10), contesta a versão oficial, que alegava confronto e ação em legítima defesa.

    “Pelas fotos do laudo de local é possível verificar que a vítima foi morta quando saía do banco de trás do veículo e, segundo testemunhas, não estava armado. O laudo necroscópico aponta que o primeiro tiro atingiu a vítima na parte posterior, ou seja, quando ela estava de costas”, diz o documento.

    O laudo nescrocópio aponta que Miguel foi atingido com arma de fogo duas vezes: um tiro no tórax esquerdo e outro no braço, que atravessou e também atingiu o tórax.

    A mãe de Miguel, Andréa Gonçalves, 36 anos, disse que semanas antes o cabo Thiago Santos Sudré, conhecido na região como “Carioca”, apareceu na casa da família com Miguel muito machucado e ameaçou matar o menino, caso o encontrasse novamente na rua.

    “Mandei ele [Carioca] sentar no sofá e falei que meu filho era doente, um dependente químico. Foi onde ele falou assim pra mim: ‘Mãe, a senhora compra um caixão pequeno que se eu pegar o seu filho na rua eu vou matar ele”, disse em entrevista à Ponte.

    O ouvidor Benedito Mariano avalia o caso como “muito grave”. “Se comprovado o que foi dito pela mãe, de que duas semanas antes o policial teria ido até sua casa dizendo que se encontrasse o garoto iria matá-lo, é algo muito grave. É indício de crime premeditado, é muito grave. Dos casos que atendo, não vi nenhuma situação parecida. É grave”, disse à Ponte.

    A perseguição do dia 6 de setembro começou, de acordo com o boletim de ocorrência, depois que policiais em patrulhamento identificaram um carro Volkswagen, modelo FOX. Os oficiais pediram para o motorista parar, mas não foram respeitados. Nesse momento há controvérsia entre a versão oficial e o laudo da Ouvidoria.

    Os PMs da ação disseram que Miguel estava armado e que não largou a arma após solicitação. Já a Ouvidoria aponta morte sem resistência e sem confronto. Três menores, de 17, 14 e 13 anos, foram detidos e levados para a Fundação Casa. A vítima do roubo não reconhece nenhum dos suspeitos como o assaltante do veículo.

    Desde o dia em que perdeu seu filho, Andréia passou a ser ameaçada e foi buscar proteção na casa de parentes. Segundo ela, o apartamento onde a família morava, no Parque dos Ipês, periferia de São José dos Campos, foi invadido. “Entrou para quê? Me amedrontar? Eu recebi várias ameaça pelo Facebook, de fake, que a polícia da corregedoria vai ver quem são”, afirma.

    Devido as ameaças, Mariano explica que Andréa foi incluída no quadro do Porgrama de Proteção a Testemunhas no Brasil (Provita) – que tem uma série de restrições, como afastamento de familiares e amigos, manter o local de abrigamento em sigilo, etc – e que todos os laudos foram formalizados ao corregedor. “Evidentemente precisa ser investigado pelo delegado responsável em São José dos Campos”, completa.

    Fama de matador

    O laudo da ouvidoria também destaca que o cabo Thiago Santos Sudré já matou outras oito pessoas durante a carreira. Em São José dos Campos o PM é conhecido pelo vulgo “Carioca” e familiares do Miguel alegam que ele atua com truculência na periferia da cidade.

    As novas mortes do policial, incluindo a de Miguel, aconteceram entre janeiro de 2011 e setembro deste ano. ” Eu quero justiça. Eu não tenho nada contra a Polícia Militar, o meu problema é só com esse policial”, completou Andréa em entrevista à Ponte.

    A reportagem questionou a SSP-SP (Secretaria de Segurança Pública de São Paulo) sobre a divulgação do relatório e se alguma atitude foi tomada em relação ao cabo Thiago Santos Sudré, o “Carioca”. Até a publicação desta reportagem, não houve resposta.

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