Movimentos sociais e PM divergem em audiência sobre direitos humanos

    Texto-base de plano de Educação em Direitos Humanos será enviado para avaliação da Alesp e do Governo até dezembro

    Na última quinta-feira (28), a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo realizou a última audiência pública para elaboração do texto-base do Plano Estadual de Educação em Direitos Humanos de São Paulo (Peedhsp). Nessa audiência não houve votação consultiva, apenas a sistematização das contribuições e leitura e aprovação do texto-base, pelo Condepe.

    Representantes das mais diversas frentes estiveram presentes da leitura do plano fazendo contribuições finais. Desde movimentos sociais como o MTST, Movimento Negro, Movimento de Mulheres, Professores, Movimentos Culturais, artisticos e estudantis, passando pelos mais variados grupos de direitos humanos até representantes da Polícia Militar, tanto do primeiro escalão, como familiares de PMs.

    “Tivemos um debate de alto nível, com representação do Ministério Público, da Defensoria e especialistas da USP, que ajudaram a elaborar o texto-base”, avalia Eloisa Gabriel, membro do Comitê Estadual de Direitos Humanos e da Coordenação do Peehsp.

    Ao abrir para contribuições do plenário, as discussões se tornaram mais acaloradas. Representantes e familiares da Polícia Militar novamente criticaram as metas estabelecidas para o eixo de Segurança Pública. Eloisa explica que definir esses pontos é necessário para o monitoramento de resultados e para evitar que o texto se torne “uma carta de intenção”.

    As críticas giraram em torno da interferência na formação dos Policiais Militares, que, segundo Eloisa, afirmam não precisar das exigências do plano, “porque já tem um manual à luz da ONU e de tratados internacionais”. Além disso diziam que “o plano defende somente as minorias”. Eloisa diz que especialmente as mulheres do grupo se identificavam como “defensoras da PM”.

    Eloisa ressalta que o eixo de Segurança Pública não pertence somente à PM, mas também ao Ministério Público, Defensoria Pública, Secretaria da Segurança Pública e Polícia Civil. Esse mesmo apontamento apareceu na fala do promotor de Direitos Humanos no Ministério Público Estadual, Eduardo Valério, durante a audiência.

    Apesar das contrariedades, a discussão foi democrática dando espaço para contribuições de todos os lados, conforme explica Alderon Costa, Ouvidor da Defensoria Pública e membro do Comitê Estadual de Direitos Humanos. “Não deu para debater todos os tópicos, mas a escuta foi muto democrática e participativa. Ninguém pode acusar o Plano de falta de diálogo”, ponderou.

    A presidente do Condepe, Maria Nazareth Cupertino, afirma que “foi importante esse encontro dos diferentes, apesar de todos os preconceitos desferidos, porque a sociedade civil e os movimentos sociais conseguiram impor sua posição de defesa dos Direitos Humanos”.

    A participação do Movimento Negro foi intensa na discussão e apostou numa possível aproximação de diálogos. “A fala foi muito marcante, porque dizia que apesar das divergências de ideias, todos ali necessitam de Direitos Humanos. Inclusive os policiais que estavam ali, porque quando um PM espanca alguém na periferia ou realiza uma abordagem truculenta, ele está agredindo a própria corporação”, afirma Eloisa.

    Numa tentativa de aproximação, um representante do Movimento Negro entregou de presente um livro sobre questões raciais para um Comandante da Polícia Militar, que retribuiu com o Manual de Direitos Humanos da Polícia Militar.

    Representantes de um assentamento do MTST, na região do M-Boi Mirim, também marcaram presença e aproximaram o diálogo com os PMs. Um deles pediu a palavra e “deu o exemplo de um colega de infância que conseguiu entrar na PM e quando foi cumprir ordens (de desapropriação) se viu na mesma condição e entrou num profundo sofrimento psíquico que o levou ao suicídio”. A fala foi aplaudida pelos Policiais Militares.

    O deputado estadual Coronel Telhada esteve presente na mesa de abertura, fazendo um discurso inicial, mas deixou a audiência logo depois.

    Estavam na mesa: Nazaré Cupertino (CONDEPE), Marcia Guerra (Comitê Estadual de Direitos Humanos), Denise Carrera (Ação Educativa), Roberto da Silva (FEUSP), Paulo Mariante (Comissão Estadual de Educação em Direitos Humanos de São Paulo), Maria Rehder (Campanha Nacional pelo Direito à Educação), Alderon Costa (Ouvidor Geral da Defensoria Pública do Estado de São Paulo), representantes das Secretarias Estadual de Educação, Desenvolvimento Social, Segurança Pública, Justiça, Defesa e Cidadania, o promotor Eduardo Ferreira Valério, os deputados Beth Sahão, Carlos Bezerra Jr. (Comissão de Direitos Humanos da Alesp), João Paulo Rillo (Presidente da Subcomissão de Educação em Direitos Humanos) e Flavia Piovesan (Secretaria Nacional de Cidadania).

    Após a audiência, os eixos passam a se reunir para consolidar suas propostas. Finalizando o processo, o texto será encaminhado para a apreciação do Condepe e depois para aprovação na Assembleia Legislativa de São Paulo. A expectativa é que até dezembro, o plano seja encaminhado para o Governo.

    “Pela primeira vez, conseguimos fazer um plano de Direitos Humanos com a participação intensa do Estado. Foram 21 audiências públicas encarando todas as tensões possíveis que o tema gera, até pelo resquício da Ditadura Militar que temos ainda”, diz Alderon. O Ouvidor da Defensoria afirma que está esperançoso de que o plano contribua para a efetivação de uma cultura de Direitos Humanos nas instituições do Estado, tendo como ponto de partida a educação.

    Maria Nazareth afirma que está otimista com o que foi discutido no ciclo de audiências. “Nós temos uma sociedade atenta ao Plano e à sua implementação”, disse.

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