Mulher trans é internada com queimaduras em 40% do corpo após ataque no centro do Recife (PE)

Adolescente é suspeito de atear fogo em Roberta Silva, 33, que vive em situação de rua na cidade; vítima está internada no Hospital da Restauração e teve grande área do corpo atingida pelas chamas

Fachada do Hospital da Restauração, onde Roberta está internada | Foto: Secretaria Estadual de Saúde de Pernambuco

A jovem trans Roberta Nascimento da Silva, 33, está internada no Hospital da Restauração, em Recife (PE), após ter tido 40% do corpo queimado durante a madrugada de quinta-feira (24/6). Segundo nota da prefeitura, um adolescente é suspeito de ter ateado fogo na vítima, que vive em situação de rua no Cais de Santa Rita, no centro da capital.

A codeputada do mandato coletivo Juntas, Robeyoncé Lima (PSOL), visitou Roberta na manhã desta sexta-feira (25/6) e disse que ela está consciente. “Ela está toda enfaixada da cintura para cima, teve braços, pescoço e parte da cabeça com queimaduras, mas consegue se comunicar”, disse à Ponte. Segundo a parlamentar, inicialmente, ela estava na ala masculina do hospital e depois foi transferida para ala feminina quando vereadores e outras organizações se mobilizaram no local. “Não teve o respeito ao nome social, nós interviemos e ela foi para a ala feminina.”

De acordo com o G1, que teve acesso ao boletim de ocorrência, testemunhas disseram à Polícia Militar que um homem estaria com a vítima em um barraco de lona e teria ateado fogo a ela, tentando fugir em seguida, próximo ao Terminal de Ônibus do Cais de Santa Rita. Ele foi apreendido depois. Robeyoncé relata que a jovem confirmou à ela que foi um rapaz de 17 anos que jogou um líquido nela e ateou fogo em seguida.”Ela me disse que não conhece o menor de idade.”

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Segundo a parlamentar, Roberta acredita que foi vítima de transfobia: “Justamente no mês em que se comemora o orgulho LGBT+, a gente percebe que estamos longe ainda de conquistar uma cidadania plena num país que é recordista de mortes de transexuais e travestis”.

À reportagem, a prefeitura informou que Roberta foi atendida pelo Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) e encaminhada ao Hospital da Restauração, que tem especialidade em atendimento a queimaduras, e que uma equipe do Centro de Referência em Cidadania LGBT do Recife fez uma visita à família da vítima, em Jaboatão dos Guararapes, na região metropolitana, para acompanhar o caso e dar apoio na recuperação. A assessoria também declarou que a vítima já utilizou serviços de assistência à população de rua no município, entre 2015 e 2019, e que o Centro de Referência está “atuando para garantir os direitos de Roberta”.

Em um primeiro contato com a assessoria de imprensa do hospital, foi informado que Roberta chegou ao local sem documentos, com 40% do corpo queimado, e que por isso tinha sido encaminhada à ala masculina. Depois, foi realocada para a ala feminina. Inicialmente, ela está estável. A assessoria solicitou que fosse realizado novo contato ainda na manhã deste sábado (26/6) para atualizar o estado de saúde da jovem, mas não retornou as ligações da reportagem.

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O prefeito de Recife João Campos (PSB) se posicionou no Twitter e considerou o crime “intolerável”.

A assessoria da prefeitura informou que o caso está sendo investigado pela Polícia Civil através da Gerência de Polícia da Criança e do Adolescente e que o ato infracional “deverá ser tratado como tentativa de feminicídio”. Em nota*, a Secretaria Estadual de Defesa Social confirmou que o o adolescente de 17 anos foi autuado por ato infracional análogo a tentativa de homicídio qualificado e que, após avalição do Ministério Público Estadual, ele “foi encaminhado a uma Unidade de Atendimento Inicial (Uniai) da Secretaria de Criança e Juventude”.

A pasta também informou que, de janeiro a maio deste ano, “13 pessoas da população LGBTQIA+ foram vítimas de Crime Violento Letal Intencional (CVLI) em Pernambuco. No ano passado, no mesmo período, o total de CVLIs contra essa população em Pernambuco foi de 47, o que representa uma redução de 72,34% entre os dois anos. Vale ressaltar que essas estatísticas levam em conta a orientação sexual ou gênero declarado pelas vítimas”. 

A ativista Caia Coelho, da Natrape (Nova Associação de Travestis e Transexuais de Pernambuco), disse que movimentos sociais estão articulando um protesto em repúdio à violência contra a população trans.

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Em resposta ao tweet do prefeito, a Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais) destacou pesquisa que apontou, em 2020, que ocorreram sete assassinatos de pessoas trans em Pernambuco: “Precisamos de políticas específicas para enfrentar essa violência que segue negligenciada”.

*Reportagem atualizada às 13h29, de 28/6/2021, após recebimento de nota da Secretaria de Defesa Social

Correções

*Reportagem atualizada às 13h29, de 28/6/2021, após recebimento de nota da Secretaria de Defesa Social

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