Organizações pedem que governo brasileiro convide ONU para investigar racismo estrutural e violência de Estado no país

Carta organizada pela Human Rights Watch solicita visita do recém criado mecanismo sobre justiça e igualdade racial na segurança pública das Nações Unidas, que depende de convite do Itamaraty; “Brasil deveria ser priorizado”, diz pesquisador

PM de São Paulo durante ato contra o aumento da tarifa do transporte público, em 26 de janeiro 2016 | Foto: Daniel Arroyo / Ponte Jornalismo

Em uma carta encabeçada pela Humans Rights Watch, mais de cem entidades da sociedade civil pedem para que o governo braslieiro convide o novo mecanismo da Organização da Nações Unidas (ONU) sobre justiça e igualdade racial na segurança pública para realizar uma visita oficial para examinar o problema do racismo estrutural no país.

De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em 2020 mais de 6.400 pessoas foram mortas pela polícia. Dentre os assassinados, 80% eram negros. A ideia dos signatários é que representantes internacionais possam vir ao Brasil para  coletar informações junto a membros das comunidades diretamente impactadas, organizações da sociedade civil, autoridades e especialistas em segurança pública.

A letalidade das forças de segurança do Estado não é uma exclusividade brasileira. Em diferentes países do mundo, há casos de cidadãos comuns que foram mortos em abordagens desastrosas. Foi por conta de uma dessas ações que a ONU decidiu investigar a fundo qual a relação da truculência policial contra a população negra e como os governos estão tratando do tema.

https://ponte.org/guerra-as-drogas-guerra-aos-negros/

“No ano passado, o escritório da alta comissária de direitos humanos da ONU, Michelle Bachelet, apresentou um relatório sobre racismo estrutural em todo o mundo. Esse documento surgiu depois da mobilização que houve nos Estados Unidos por conta da morte de pessoas negras pela polícia. Esse tema nunca tinha sido discutido de forma tão direta dentro da ONU”, explica César Muñoz, pesquisador sênior da Humans Right Watch.

Para que possam fazer o trabalho de investigação e diagnóstico da relação entre violência de Estado e o racismo estrutural no Brasil, o Ministério das Relações Exteriores deve fazer um convite formal à ONU. O mecanismo de especialistas é encarregado de examinar as causas do racismo estrutural sistêmico, particularmente no uso excessivo da força e outras violações da lei internacional de direitos humanos por agentes de segurança pública contra africanos e afrodescendentes.

“O mecanismo foi criado em janeiro deste ano. É algo muito recente e acreditamos que o Brasil deva ser priorizado. Se olharmos para o resto do mundo, percebemos que é aqui onde há um problema mais grave. É a chance que o país tem de receber uma missão externa de especialistas independentes que podem contribuir para reformas que são necessárias”, declara Muñoz.

Diante do discurso do governo Jair Bolsonaro que avaliza a maior rigidez das forças policiais no país, ativistas de direitos humanos temem que o país não queira receber os representantes da ONU para dar esclarecimentos sobre o alto número de pessoas negras mortas pela polícia. Por isso, para Cesar Muñoz, essa carta funciona como uma forma de pressionar o Executivo a pelo menos responder o porquê não faria o convite.

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“Na prática o governo tem incentivado a violência policial, seja com as falas do presidente ou apresentando projetos de lei que fariam mais difícil a responsabilização de policiais por abusos. Temos que pressionar este governo, e uma das formas é pedindo esta visita do mecanismo da ONU. Recentemente foi autorizado a entrada de representantes internacionais para outros relatórios. Em breve será divulgado um sobre violência contra mulheres”, exemplifica o pesquisador.

Outro lado

A Ponte questionou a área de comunicação do Ministério das Relações Exteriores para saber se haverá convite por parte do governo brasileiro para o mecanismo da ONU visitar o Brasil e fazer um relatório sobre racismo estrutural e violência policial. Até o momento da publicação desta matéria não houve resposta da pasta.

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