PM da Rota é preso após atirar em mulher e mentir sobre tentativa de roubo

    Prisão do sargento Marcos Antonio Freire pela Polícia Civil incomodou seus colegas da Rota, que cercaram a delegacia com viaturas, no centro da cidade de São Paulo

    Fachada da Rota, localizada na Luz, região central de SP | Foto: Mike Peel/Wikipedia

    Diante da delegada no 2º DP (Bom Retiro), o sargento Marcos Antonio Freire, 47 anos, que trabalha na Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar), a tropa mais letal da PM paulista, apresentou-se como uma vítima.

    Contou que havia sido alvo de uma tentativa de roubo em seu horário de folga, por volta das 5h deste domingo (21/3), na Rua Guaianases, em Santa Cecília, região central da cidade de São Paulo, e que havia atirado nos ladrões para se defender.

    Após ouvir testemunhas e assistir a vídeos da abordagem, porém, a Polícia Civil concluiu que o policial estava mentindo e o prendeu em flagrante por tentativa de homicídio.

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    Segundo o boletim de ocorrência, o sargento Freire envolveu-se numa discussão com dois homens e uma mulher que passaram por ele na rua. O PM, então, sacou a arma e atirou contra o trio, atingindo a mulher.

    A decisão da Polícia Civil de autuar o policial militar incomodou seus colegas. Ao longo do domingo, viaturas da Rota foram até o local e cercaram a delegacia, segundo informações de policiais. Em reação, a Civil enviou ao DP viaturas do Garra (Grupo Armado de Repressão a Roubos e Assaltos). Apesar da pressão, a delegada manteve a prisão em flagrante do PM.

    ‘Você atirou na minha mulher’

    O sargento Freire chegou à delegacia por volta das 7h, levado por outros PMs que haviam sido chamados por causa dos tiros. Contou uma história cheia de detalhes. Disse que, duas horas antes, havia saído de casa em direção a um estacionamento para pegar o carro e buscar sua esposa, que também é PM, no trabalho. Antes de chegar ao carro, na Rua Guaianases, teria sido cercado por dois homens e uma mulher. Um dos homens teria sacado uma arma e dito “passa o que você tem, senão eu vou te acertar”. O sargento, então, teria atirado no grupo, com uma pistola Glock .40 da corporação, fazendo os “ladrões” fugirem.

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    Após ouvir o depoimento do PM, os policiais da delegacia foram ao local do tiro, onde ouviram duas testemunhas e recolheram imagens das câmeras de um edifício. Os vídeos mostravam cenas bem diferentes do que o PM havia descrito. Nas imagens, três pessoas passam pelo policial, que atravessa a rua. Começa uma discussão entre eles, mas ninguém do trio faz menção de tentar um assalto nem mostra qualquer arma. O policial saca a pistola e mostra para o grupo. Ele chega a virar as costas para os três, mas em seguida volta a apontar a arma para eles.

    Uma testemunha contou que ouviu uma das vítimas desafiar o PM, dizendo “Você vai atirar? A gente tá perto da favela, você vai atirar?” e “Então atira”. O sargento atirou. Depois disso, testemunhas ouviram gritos de “Você atirou na minha mulher” e “Olha a merda, tio, olha a merda”. Curvada sobre o chão, a mulher baleada chorava: “Moço, você acertou em mim, para com isso, moço”. Os três foram embora andando.

    No boletim, a delegada afirma que, de acordo com as imagens das câmeras, “não houve uma formal abordagem policial ou reação natural de um policial que é vítima de roubo a mão armada” e destaca que “o sargento dá as costas àquelas pessoas que afirmou terem tentado lhe render mediante grave ameaça praticada com uma pistola”.

    As vítimas do sargento da Rota ainda não foram identificadas. A polícia foi até os hospitais da Santa Casa, Barra Funda e Mandaqui, segundo o boletim de ocorrência, mas não encontraram uma mulher baleada.

    Procurada, a Secretaria da Segurança Pública do governo João Doria (PSDB) não respondeu até o momento. A reportagem não conseguiu contato com a defesa do sargento Freire.

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    […] Procurada, a Secretaria da Segurança Pública do governo João Doria (PSDB) não respondeu até o momento. A reportagem não conseguiu contato com a defesa do sargento Freire. Com informações da PonteJornalismo […]

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    […] Filmagens de um prédio na Rua Doutor Elias Chaves, no centro da capital paulista, obtidas pela Ponte mostram momento em que o sargento Marco Antonio Freire, 47, atira contra um grupo de três pessoas, atingindo uma mulher, após uma discussão. Na ocasião, ele havia mentido sobre uma tentativa de assalto e se apresentou como vítima, conforme a reportagem revelou no dia 21 de março. […]

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    […] Filmagens de um prédio na Rua Doutor Elias Chaves, no centro da capital paulista, obtidas pela Ponte mostram momento em que o sargento Marco Antonio Freire, 47, atira contra um grupo de três pessoas, atingindo uma mulher, após uma discussão. Na ocasião, ele havia mentido sobre uma tentativa de assalto e se apresentou como vítima, conforme a reportagem revelou no dia 21 de março. […]

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    […] O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) determinou a soltura do sargento Marcos Antonio Freire, 47, da Rota, a tropa mais letal da PM paulista, para que ele responda o processo em liberdade. Ele foi preso em flagrante e depois acusado, em 22 de março, por atirar contra um grupo de três pessoas, atingindo uma mulher, após uma discussão no centro da capital paulista. Na ocasião, ele havia mentido sobre uma tentativa de assalto e se apresentou como vítima, conforme revelou reportagem da Ponte. […]

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