PM é absolvido na Justiça Militar por agressão e morte de mecânico em 2017

    Juiz considera que as provas são insuficientes para dizer que Eduardo Alves dos Santos morreu em decorrência do espancamento e sugere que causa da morte foi alcoolismo

    Fernanda e Eduardo: casal viveu junto durante 23 anos e tiveram uma filha | Foto: Arquivo Pessoal

    O policial militar Adriano Soares de Araújo foi absolvido pela Justiça Militar de São Paulo da acusação de ter assassinado o mecânico Eduardo Alves dos Santos, 42 anos. A decisão foi publicada na quarta-feira (5/9). O caso aconteceu em janeiro de 2017, quando o PM foi atender a uma ocorrência de “briga de casal” na casa do mecânico e de Fernanda Camargo dos Santos. 

    De acordo com a declaração de óbito de Santos, o que causou a morte dele foi uma hemorragia interna traumática causada por um agente contundente. Segundo a viúva do mecânico, o companheiro teria sido espancado por Araújo depois de ter ignorado o PM, que por sua vez se sentiu desrespeitado e passou uma rasteira na vítima iniciando as agressões.

    “O policial ficou louco, começou a espancar, chutar”, disse Fernanda na época do ocorrido. A viúva disse que o PM chegou a pisar no pescoço de Eduardo, já caído no chão. Tanto Fernanda quanto o outro policial que acompanhava a ocorrência, de acordo com testemunhas, chegaram a tentar intervir para cessar a agressão, mas Araújo teria dito à viúva: “Mas não foi você que chamou a gente?”.

    Em depoimento, no entanto, o policial disse que Eduardo que teria “partido para cima” dele e que, só então, ele teria reagido e passado uma rasteira no mecânico para poder conter sua violência.

    Em depoimento prestado à Ouvidoria da Polícia do Estado de São Paulo, Fernanda disse que o policial ainda teria voltado até a viatura para buscar um cassetete, que teria usado para agredir ainda mais o homem. Além disso, ele também teria ameaçado a mulher e a sogra da vítima com uma arma.

    Na denúncia do Ministério Público, há destaque para as agressões e para a causa da morte: “o meio foi cruel porque o réu desferiu vários chutes, socos, pisou no pescoço do civil para fazê-lo sofrer mais e ainda desferiu golpes de cassetete”. Além disso, a promotoria cita ameaças que Fernanda, viúva da vítima, teria sofrido do policial: ”

    No começo deste ano, Fernanda afirmou que estaria sofrendo intimidação por parte do réu, que a teria filmado e fotografado com um celular. “Eu fiquei apavorada, porque reconheci ele.  Ele filmou o meu rosto, o da minha filha e o carro. Eu nunca mais tinha visto o Araújo, só nas audiências mesmo. A minha pergunta é por que ele me filmou? Qual a intenção nisso?”, disse à Ponte.

    Em sua decisão, o juiz José Alvaro Machado Marques afirma que a absolvição do PM se impõe e argumenta que o réu e a vítima/testemunha Fernanda apresentaram versões conflitantes para os fatos e que Eduardo tinha passagens anteriores pela polícia por questões ligadas à comportamento violento e posse de arma de fogo, além de problemas com vício em álcool. “Eduardo tinha passagens pela polícia por comportamento violento e posse de arma de fogo, além de sérios problemas com o vício em álcool. Diz a literatura médica que cirrose pode levar a sangramento gastrointestinal, inchaço abdominal e confusão mental. Uso abusivo de bebidas alcoólicas pode levar a cirrose”, escreve o magistrado, ao desconsiderar o que constava no atestado de óbito.

    Em determinado momento, Marques afirma que uma testemunha disse que Fernanda aparentava ter “problemas mentais” e que a sogra da vítima, que também estava no local dos fatos, não tinha dito nada sobre uma ameaça contra sua filha. O juiz também afirma, em sua decisão, que os policiais confirmaram a necessidade de “uso de força” contra Eduardo, para poder contê-lo.

    Segundo o juiz, o fato de Eduardo ser alcoólatra poderia ser o motivo para o sangramento interno que ele teve antes de morrer. Além disso, ele também diz não acreditar que Fernanda tenha sido ameaçada. “Não sabemos a motivação de Fernanda para, gradativamente, aumentar a gravidade dos fatos ocorridos”, afirmou a autoridade no documento.

    Ele ainda diz que as motivações de Fernanda podem estar ligadas com um “sentimento de culpa por seus desentendimentos com o marido” ou a um “interesse em buscar indenizações”. Sendo assim, o juiz absolveu o PM das acusações de ter matado Eduardo e de ter ameaçado Fernanda.

    Nesta quinta-feira (6/9), Fernanda deu uma nova entrevista à Ponte e afirmou estar “revoltada” com a decisão do juiz. “Eu ainda passei como mentirosa, como louca, como tudo… ele diz que meu marido morreu por cirrose. Ele simplesmente derrubou o laudo do IML (Instituto Médico Legal)”, disse a viúva. Segundo ela, a Defensoria Pública de São Paulo deve recorrer da decisão.

    De acordo com Fernanda, ela já esperava que Araújo fosse ser inocentado. “A gente vive no Brasil e o Brasil tem impunidade. Eu já estava conformada de que ele iria ser inocentado. Mas daí vir tantas mentiras, derrubar o laudo o IML e dizer que meu marido morreu por cirrose hepática… o primeiro laudo do IML diz que ele teve hemorragia interna e diz que ele tinha hematomas, mostrou os hematomas nas fotos do corpo dele. E depois não tem mais foto? Não existe?”, afirmou.

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