Ação policial no centro de SP: ‘PM entrou atirando com arma de verdade na Luz’

    Informação é de testemunha da ação, que terminou com ao menos três feridos, entre eles um PM; versão oficial nega disparo de arma de fogo

    Pouco depois da ação policial na região da Luz, frequentadores do fluxo procuraram afastar a ação da polícia e tentar se proteger ateando fogo em objetos pessoais | Foto: reprodução

    Um ação policial na região da Luz, conhecida como Cracolândia por causa da concentração de usuários de crack no centro de São Paulo, deixou pelo menos três feridos na manhã desta quarta-feira (15/1).

    Dois feridos são moradores do “fluxo”, como é chamada a concentração de pessoas nas ruas Helvétia e Dino Bueno, onde há comercialização e uso de drogas: um deles foi atingido no braço esquerdo e o outro na parte de trás da perna por disparo de bala de borracha. “Tomei um tiro de 12”, declarou a vítima, sem querer, contudo, se identificar. O terceiro deles é um PM que participava da operação.

    Em nota, a SSP-SP (Secretaria de Segurança Pública de São Paulo) informou que a Polícia Militar recebeu uma denúncia anônima de tráfico de drogas na região e que após averiguação já estavam deixando o local, quando um dos policiais foi atingido na perna. A tropa teria agido para conter um tumulto que começou após o ocorrido.

    Testemunhas ouvidas pela Ponte contestam a versão. Segundo Jailson de Oliveira, 50 anos, ex-dependente químico e que hoje atua em projetos assistenciais da região, por volta das 7h30 policiais chegaram no fluxo atirando “não só com balas de borracha e bombas, como de costume, mas com tiros de verdade”, declarou.

    Por volta das 12h, quando a reportagem estava no local, a situação já estava normalizada, mas o clima de tensão ainda era presente | Foto: Maria Teresa Cruz/Ponte Jornalismo

    Uma delas, que pediu para não ser identificada por medo, afirma que embora disparos de arma de fogo tenham saído do “fluxo”, quem iniciou a ação e atirou primeiro foi a PM.

    A Ponte recebeu um vídeo com o depoimento de um dos feridos que confirma a versão de Jailson, de que os dependentes químicos foram pegos de surpresa no início da manhã. “A PM entrou no fluxo, de repente, dando tiro em todo mundo, tanto que eu fui atingido. Tudo isso por iniciativa da polícia militar”, diz uma das vítimas, que se identifica como José Paulo Duarte.

    Jailson classificou a ação da PM de desproporcional e injustificável. “Os caras invadiram, deram tiro de verdade, o barato foi louco. Antes davam tiro de borracha, agora estão dando tiro para matar. Claro que teve revolta, a população reagiu e tocou fogo, pedra, justamente para se defender”, afirmou.

    A GCM (Guarda Civil Metropolitana) que não sabia na ação policial, segundo apurou a reportagem da Ponte, foi acionada para dar apoio à PM. Em vídeo obtido pela reportagem é possível escutar um dos inspetores dizendo aos guardas durante a contenção, pouco tempo após a ação: “Pessoal, armamento letal a gente responde com arma letal, não adianta ficar jogando granada”.

    No final da manhã desta quarta-feira (15/1), viaturas da GCM estavam controlando a entrada e saída das pessoas da região do fluxo, e revistando aleatoriamente as pessoas, especialmente quem estava com mochilas e sacolas maiores.

    Guardas civis controlam entrada e saída do fluxo e revistam qualquer um que esteja com mochilas ou bolsas grandes | Foto: Maria Teresa Cruz/Ponte Jornalismo

    A Ouvidoria das Polícia de São Paulo informa que vai acompanhar a apuração da ação policial e manifesta preocupação com a informação de que um agente foi baleado. “Evidencia que há participação de criminosos no meio dos usuários. Mas são situações que precisam ser avaliadas separadamente. Existe a questão de saúde pública e acolhimento, mas também existe uma situação de tráfico que precisa ser coibido e inibido. Evidentemente, também vamos pedir a apuração sobre a ação contra os usuários, já que temos pessoas atingidas por bala de borracha”, declarou à Ponte o ouvidor Benedito Mariano.

    Na nota enviada nesta manhã pela SSP-SP, a pasta nega que a PM tenha usado arma de fogo na ação. Além disso, informa que 6 pessoas foram presas e levadas ao Denarc (Departamento Estadual de Repressão e Prevenção ao Narcotráfico), e uma quantidade de drogas não revelada foi apreendida.

    O PM que foi baleado passou por atendimento na Santa Casa de Misericórdia, na Santa Cecília, e já foi liberado, segundo a SSP-SP. A pasta não confirmou se houve mais feridos na ação.

    A ocorrência será registrada no 77º DP (Santa Cecília), onde a reportagem esteve para tentar falar com o delegado responsável pelo caso, mas foi informada de que “a ocorrência ainda não havia sido apresentada”.

    Em nota atualizada à imprensa, a PM informa que “toda e qualquer denúncia sobre a conduta de seus agentes pode ser feita diretamente na Corregedoria”.

    Por volta das 16h30, a reportagem foi informada que novas bombas teriam sido lançadas no fluxo, iniciando um tumulto, que foi contido pela GCM. Os frequentadores do “fluxo” temem represália da PM por causa do policial que foi ferido.

    Reportagem atualizada às 19h40 do dia 15/1 para inclusão de mais informações da SSP-SP e da PM

    Já que Tamo junto até aqui…

    Que tal entrar de vez para o time da Ponte? Você sabe que o nosso trabalho incomoda muita gente. Não por acaso, somos vítimas constantes de ataques, que já até colocaram o nosso site fora do ar. Justamente por isso nunca fez tanto sentido pedir ajuda para quem tá junto, pra quem defende a Ponte e a luta por justiça: você.

    Com o Tamo Junto, você ajuda a manter a Ponte de pé com uma contribuição mensal ou anual. Também passa a participar ativamente do dia a dia do jornal, com acesso aos bastidores da nossa redação e matérias como a que você acabou de ler. Acesse: ponte.colabore.com/tamojunto.

    Todo jornalismo tem um lado. Ajude quem está do seu.

    Ajude

    mais lidas