PM lança spray de pimenta contra grupo de alunos após grito de ‘coxinha’

    Caso aconteceu no intervalo do período matutino da Escola Estadual República do Peru, em Cotia (SP), quando a policial da Ronda Escolar foi registrar a presença na secretaria da unidade educacional

    Escola fica localizada em um bairro na periferia de Cotia, cidade na Grande São Paulo | Foto: Arquivo pessoal

    “Coxinha”. Esse grito motivou uma policial militar a usar spray de pimenta contra aproximadamente 100 pessoas em uma escola estadual em Cotia, cidade na Grande São Paulo. A policial registrava a presença da viatura de Ronda Escolar na secretaria da escola e, na saída, ouviu a ofensa que teria motivado a agressão.

    A ação policial aconteceu por volta de 9h da manhã desta terça-feira (19/2), horário do intervalo das aulas para os alunos e professores da Escola Estadual República do Peru. O grupo estava no pátio quando a PM entrou, resolveu a questão burocrática e saiu do local. Já do lado de fora, ela pediu ao funcionário que abrisse novamente o portão e voltou.

    A agente de segurança quis saber quem havia a chamado de coxinha, grito que ouviu já do lado de fora. Como ninguém respondeu, ela ordenou novamente que as pessoas falassem. Neste momento, o sinal da escola tocou para os alunos retornarem às salas. Mais uma vez, a PM pressionou todos a entrar nas salas, que estavam fechadas.

    Um professor que trabalha na República do Peru explicou que é prática da direção trancar as salas no período do recreio. Quando o sinal é acionado, os profissionais vão porta a porta liberar o acesso, o que ainda não havia acontecido naquele momento.

    “Ela ficou mais nervosa, ordenou que voltassem para a sala de novo e foi quando andou pelo corredor disparando gás de pimenta. Foi ao longo do corredor, não em alguns alunos apenas, em todo o corredor na parte de cima da escola. Tinha 100 alunos, mais ou menos, e todos foram atacados, inclusive funcionários que estavam ali, como professores”, conta Matheus Lima, professor de história que trabalha na escola.

    Segundo Lima, o espaço tem extensão de aproximadamente 20 metros e é um local fechado. As pessoas demoraram um tempo para perceber a ação e sentirem os efeitos do gás, tempo suficiente para a policial sair novamente do prédio.

    “Ninguém se deu conta porque ela não fez ostensivamente, ela jogou e saiu da escola e as pessoas respiraram o gás. Todos ficaram indignados e xingaram ela. De fora da escola, ela começou a filmar as pessoas e falou que não jogou spray dentro, que jogou do lado de fora”, relembra o profissional, atuante há 15 anos apenas nesta escola.

    A direção da escola questionou os policias sobre a ação, mas a equipe teria apoiado a ação da PM, pois a agente “foi acuada, agiu de maneira correta ao se sentir ameaçada, que era aquilo que deveria fazer mesmo”, conforme relatos de testemunhas. A equipe solicitou apoio e mais viaturas da PM rodearam a escola.

    “Até a GCM (Guarda Civil Municipal) de Cotia foi. O apoio chegou rápido, mas para defender ela, a policial. Não tinha a menor necessidade, não havia nenhuma ocorrência, talvez a necessidade de uma ambulância para socorrer alunos que passaram mal”, emenda Matheus, que explica desconhecer o total de alunos socorridos, pois alguns foram levados pela direção na hora e outros sentiram os efeito do gás apenas em casa e os próprios pais prestaram o socorro.

    Os professores temem a recepção da comunidade quanto a ação policial. Matheus Lima explica que a região é de periferia, o que torna a relação com a polícia “terrível”. O receio é de que a região considere a direção da escola e os funcionários coniventes com a violência.

    “A comunidade está indignada contra a polícia e preocupada se a escola está do lado deles. Queremos mostrar que foi uma ação isolada daquela equipe policial, vamos ver como a polícia vai se comportar. Se foi ação isolada de uma policial despreparada, é uma coisa. Agora, muito pior é se for uma ação com respaldo da polícia em si. É mais grave”, argumenta o professor de história. “Ela quis fazer uma função que não é dela, ela não é diretora, nem inspetora de alunos, foi abuso de poder”, finaliza.

    A Ponte questionou a SSP (Secretaria da Segurança Pública) de São Paulo, comandada pelo general João Camilo Pires de Campos, sobre a ação da policial da Ronda Escolar. A pasta enviou resposta da PM sobre o caso, apontando que os policiais da ronda foram cercados pelos alunos e, por conta disso, houve o uso do spray.

    “A Polícia Militar informa que na manhã desta terça-feira, 19, policiais da Ronda Escolar foram cercados e hostilizados por estudantes da Escola Estadual República do Peru, em Cotia. Inicialmente, os agentes dialogaram com os alunos para tentar dispersá-los. Mas, diante da negativa, foi necessário o uso de técnicas e equipamentos para o controle de distúrbios civis a fim de conter a ação do grupo e acionar equipes de apoio que estavam próximas ao local”, sustentou a corporação em nota.

    Ao mesmo tempo, a reportagem solicitou uma posição da Secretaria da Educação do estado sobre a relação de PMs da Ronda Escolar com a escola, bem como a rotina burocrática a ser feita. Perguntamos como a pasta avalia a ação da policial na Escola Estadual República do Peru e qual procedimento será tomado. Até o momento, não recebemos uma resposta.

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