PM-SP monta cerco à favela do Moinho após protesto de moradores contra demolições

    Manifestantes citaram descumprimento de acordo e atearam fogo a uma barricada sobre os trilhos de trem que cortam a comunidade na tarde de hoje (12/5). PM-SP deslocou tropa de policiais e helicópteros sobrevoaram comunidade

    Moradores do Moinho realizaram ato nesta segunda-feira contra demolições de barracos | Foto: Reprodução

    A Polícia Militar paulista (PM-SP) realizou um cerco à favela do Moinho, na região central de São Paulo, na tarde desta segunda-feira (12/5), ocasião em que moradores realizaram um protesto contra as demolições de barracos conduzidas pelo governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) no local.

    Os manifestantes atearam fogo a uma barricada sobre os trilhos de trem que cortam a comunidade no meio da tarde. Por volta das 17h, o bloqueio já havia sido desfeito. Helicópteros da PM-SP passaram a sobrevoar a favela a partir de então, e a Tropa de Choque se manteve posicionada à entrada do local.

    Leia mais: Primeira família a deixar Moinho atribui saída a proteção da filha contra PM: ‘Jogam gás, não dá para respirar’

    A Secretaria de Segurança Pública paulista (SSP-SP) comunicou que os agentes não interviram e que o Corpo de Bombeiros conteve as chamas sobre os trilhos. Já a Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação (SDUH-SP) disse, em nota, que foram demolidas seis casas, já lacradas anteriormente pela prefeitura, sob gestão Ricardo Nunes (MDB), em razão do risco de sua “estrutura precária”.

    Os moradores relatam que a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), à frente do plano de remoção da comunidade, havia indicado que não faria demolições de casas até a saída completa das famílias, para que não houvesse acúmulo de entulho enquanto ainda há pessoas no local. Em razão do descumprimento desse combinado é que houve o protesto.

    Também em resposta às demolições, a Associação de Moradores da Comunidade do Moinho, representada pelo Escritório Modelo Dom Paulo Evaristo Arns, vinculado à Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), oficiou a CDHU para que explique a violação do acordo e a falta de diálogo.

    Uma pessoa que vive na favela relatou à Ponte, que, no domingo de Dia das Mães (11/5), policiais militares entraram na comunidade e passaram a fotografar moradores sem o consentimento deles, o que a PM já havia feito anteriormente, conforme revelou a Ponte.

    Nos últimos dias, os moradores têm reclamado também de dificuldade de acesso ao local, devido a um cerco permanente da PM com viaturas. Nesta segunda, vans escolares que traziam crianças que vivem na comunidade tiveram de desembarcá-las em um trecho distante da entrada da comunidade.

    PM tem mantido cerco à favela, com dificuldade de acesso até por vans escolares | Foto: Reprodução

    Remoção de moradores do Moinho

    Localizada na região dos Campos Elísios, a favela do Moinho abriga cerca de 800 famílias, dispostas sobre um terreno da União — a comunidade hoje se espreme entre trilhos da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), embaixo do Viaduto Engenheiro Orlando Murgel e na divisa com o bairro do Bom Retiro. A remoção dos moradores se insere no contexto da alegada revitalização da região central pelo governador: a comunidade está a menos de um quilômetro da Praça Princesa Isabel, para onde Tarcísio pretende levar parte da sede administrativa do governo.

    A gestão Tarcísio diz que os moradores vivem sob risco e em condições insalubres. Além disso, ela pleiteia a cessão do terreno pela União, onde prevê construir um parque e uma estação de trem. A Secretaria Nacional do Patrimônio (SPU), submetida ao Ministério de Gestão e Inovação em Serviços Públicos, emitiu uma nota técnica no último dia 14 de abril desautorizando demolições das casas e negando haver certeza de cessão do espaço ao Estado — um dos entraves ao processo era justamente a necessidade de ajuste no plano de reassentamento das famílias.

    Leia mais: Moradores do Moinho foram fotografados pela PM sem consentimento

    Apesar da indefinição, o governo Tarcísio deu início no último dia 22 às saídas de quem aceitou a proposta de remoção, sob presença da PM-SP no local. Na ocasião, conforme mostrou a Ponte, famílias relataram querer mudar justamente para escapar da truculência policial.

    O governo Tarcísio ofereceu às famílias um contrato dentro das opções de atendimento habitacional que a CDHU opera, de financiamento proporcional à renda. As famílias que tiverem de esperar por uma habitação fixa irão receber R$ 800 mensais como auxílio-moradia — valor que destoa dos preços de aluguel praticados na região. Será pago também um auxílio-mudança de R$ 2,4 mil.

    CDHU iniciou demolição de barracos em meio a plano de remoção de moradores | Foto: Reprodução

    Protestos anteriores de moradores

    Em abril, moradores também protestaram contra a política de remoção de Tarcísio em pelo menos duas oportunidades. A primeira delas foi em um ato público no dia 15. Os manifestantes marcharam da favela até a Câmara Municipal gritando palavras de ordem contra o governador paulista e a favor do Moinho. O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) também foi cobrado.

    Já no dia 18, feriado de Sexta-Feira Santa, a Polícia Militar montou uma operação dentro da favela. Ao UOL, moradores relataram que os agentes chegaram pela manhã e jogaram bombas de gás lacrimogêneo e spray de pimenta contra um grupo que estava em um bar. Ainda na ocasião, pessoas que vivem na comunidade protestaram contra a violência policial e chegaram a fechar temporariamente a circulação de linhas dos trens da CPTM que passam pelos trilhos à beira do local.

    Uma pessoa foi presa por suspeita de tráfico de drogas durante a operação no feriado religioso, que teve policiais do Batalhão de Ações Especiais de Polícia (Baep) e da Rocam (Ronda Ostensiva com Apoio de Motocicletas). À Ponte, a SSP-SP atrelou a ação à época à reintegração de posse do terreno. “Para o local, o Estado propôs o reassentamento de famílias da comunidade com o objetivo de levar dignidade e segurança a essa população, que vive sob risco elevado em condições insalubres, com adesão voluntária de mais de 87% da comunidade até o momento”, disse em nota na ocasião.

    Moradores do Moinho fizeram outros protestos em abril contra plano de remoção | Foto: Daniel Arroyo/Ponte Jornalismo

    Violência policial recorrente

    Os moradores do Moinho relatam que houve intensificação das operações policiais após o projeto de remoção se concretizar. Contudo, a violência policial contra quem mora ali não é novidade. A principal justificativa dada para a entrada dos agentes armados é o combate ao Primeiro Comando da Capital (PCC), facção à qual supostamente a favela estaria submetida e que faria dela base para o tráfico de drogas na região chamada de Cracolândia — cena aberta de uso de drogas.

    Ponte já denunciou diversas violações ocorridas contra os moradores sob esse pretexto. Em uma delas, de agosto do ano passado, policiais invadiram casas e revistaram até mochilas de crianças, segundo moradores. Em outro caso, dois policiais militares foram condenados por tortura contra um jovem — os agentes esfaquearam a mão da vítima, causando um corte profundo, durante operação em 2020. Na ocasião, eles ainda haviam cometido o crime ao invadir a casa dele.

    Famílias deixam a Favela do Moinho desde o fim do mês de abril | Daniel Arroyo/Ponte Jornalismo

    Leia a íntegra do que diz a SSP-SP

    A Polícia Militar acompanha uma manifestação em andamento na Favela do Moinho, na tarde desta segunda-feira (12). Até o momento, não houve intervenção. Uma Sala de Gerenciamento foi montada para monitoramento em tempo real. Manifestantes colocaram barricadas e atearam fogo em materiais sobre a linha férrea, que foi acessada pelo grupo. O Corpo de Bombeiros conteve as chamas no local.

    Leia a íntegra do que diz a SDUH

    A Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação esclarece que teve início, nesta segunda-feira (12), a demolição de casas desocupadas na favela do moinho. Os trabalhos tiveram início por seis casas que representam risco pela estrutura precária, já lacradas pela Prefeitura devido ao já citado risco. A ação é realizada conjuntamente pela CDHU, pela Subprefeitura Sé e pela Defesa Civil.

    Já foram realizadas mudanças de 168 famílias que moravam na favela do moinho. Os trabalhos tiveram início no dia 22 de abril. Ao todo, 752 famílias já aderiram ao reassentamento (88% do total), sendo que 599 estão habilitadas, ou seja, já estão aptas a assinar contratos e receber as chaves assim que as unidades estiverem prontas. Até agora, 548 já escolheram o imóvel de destino para atendimento final ou sinalizaram a opção por Carta de Crédito Individual para buscar uma casa no mercado, mesmo número que já iniciou o processo para recebimento de auxílio moradia. Os trabalhos continuarão, nos próximos dias, para realizar as mudanças agendadas com as famílias que já solicitaram o transporte para os novos endereços.

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