Preso há um mês, Fuminho pode ter muito o que dizer, mas ainda não foi ouvido

    Gilberto Aparecido dos Santos é considerado fundamental para desvendar série de assassinatos de integrantes do PCC em 2018

    Penitenciária Federal de Catanduvas, no Paraná, onde Fuminho (à dir.) está preso | Foto: Arquivo Ponte

    A prisão de Gilberto Aparecido dos Santos, o Fuminho, apontado pela Polícia Federal como o maior narcotraficante do País, completa um mês  nesta quarta-feira (13/05). Mas, até agora, o preso não foi interrogado para falar sobre as acusações as quais lhe são atribuídas.

    Preso em 13 de abril em Moçambique, na África, e extraditado para o Brasil na semana seguinte, Fuminho deverá ser ouvido em audiência de custódia no próximo dia 18 pela Justiça do Ceará.

    Ele está preso na Penitenciária Federal de Catanduvas, no Paraná. O interrogatório por videoconferência será sobre os assassinatos de Rogério Jeremias de Simone, o Gegê do Mangue, e Fabiano Alves de Souza, o Paca.

    Ambos eram da alta cúpula do PCC (Primeiro Comando da Capital) e foram mortos a tiros em fevereiro de 2018 na região metropolitana de Fortaleza. Segundo a Polícia Civil e o Ministério Público cearenses, Fuminho foi um dos mentores do duplo homicídio.

    Leia também: Quem é Fuminho, o braço direito do líder do PCC, preso após 21 anos foragido

    Já para a Polícia Federal e o MPE (Ministério Público do Estado de São Paulo), Fuminho é dono de diversas fazendas na Bolívia, proprietário de várias aeronaves e o maior fornecedor de cocaína para a Europa e para o PCC. 

    Ele também é acusado pelo MPE de ter treinado em suas fazendas guerrilheiros e mercenários estrangeiros, inclusive africanos, para resgatar líderes do PCC presos na Penitenciária 2 de Presidente Venceslau, a 637 Km da capital paulista, e na Penitenciária Federal de Brasília.

    Segundo o Ministério Público do Estado de São Paulo, o alvo  principal do resgate seria Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, líder máximo do PCC, de quem Fuminho  sempre foi o braço direito, de acordo com investigações de promotores de Justiça.

    Relatórios feitos pela SAP-SP (Secretaria Estadual da Administração Penitenciária de São Paulo) com base em denúncias de um preso da P2 de Venceslau, cujo nome jamais foi revelado, e de bilhetes anônimos decodificados afirmam que Fuminho chegou a investir “dezenas de milhões de dólares” em dois planos de resgate de líderes do PCC.

    O primeiro foi chamado pelo Ministério Público Estadual de “megaplano” de resgate, descoberto em 2 de outubro de 2018 após informações de um preso do raio 1 da P-2 de Presidente Venceslau, cujo nome jamais foi revelado, repassadas à diretoria de segurança da unidade prisional.

    O “megaplano” consistia em resgatar ao menos 15 líderes do PCC na P2 de Venceslau. Segundo o preso delator seriam usados na ação uma aeronave, helicóptero, armas de precisão, como metralhadoras calibre 50, granadas, explosivos, um caminhão, veículos blindados e até drones.

    A aeronave pousaria no aeroporto municipal da cidade  e seria utilizada para transportar os foragidos. Ao mesmo tempo, o exército de estrangeiros treinados por Fuminho, aliado a experientes ladrões do PCC, especialistas em explosões e em roubos milionários a empresas de valores, atacariam o  Batalhão da Polícia Militar em Presidente Venceslau.

    O preso delator nunca foi ouvido formalmente pelas autoridades policiais e pela Justiça. Porém, por conta das denúncias dele, o governo do estado de São Paulo mobilizou homens do Exército e da Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar), tropa mais letal da PM paulista, para patrulhar a cidade do interior paulista.

    As informações do preso delator também serviram de base para o Ministério Público Estadual pedir à Justiça a transferência de 15 líderes do PCC recolhidos na P2 de Venceslau para presídios federais, onde o regime é mais rígido. A solicitação foi atendida em fevereiro de 2019. O nome de Marcola fez parte da lista.

    O segundo plano de resgate atribuído a Fuminho foi descoberto em 8 de abril de 2019, também na P2 de Presidente Venceslau, mas dessa vez no raio 2, após o encontro, na rede de esgoto, de uma carta codificada, de autoria desconhecida. 

    Leia também: Gesso no pé e passaporte falso: como foi a prisão de Fuminho, braço direito de líder do PCC

    Essa ação seria colocada em prática na Penitenciária Federal de Brasília, onde Marcola e outros homens da alta cúpula do PCC, como Roberto Soriano, o Tiriça; Abel Pacheco de Andrade, o Vida Loka; Wanderson Nilton de Paula Lima, o Andinho; e Júnior, irmão de Marcola, estão presos.

    Por causa do anúncio da descoberta desse segundo plano, homens da Força Nacional de Segurança foram mobilizados para patrulhar a Penitenciária Federal de Brasília. A unidade também foi protegida por barricadas. 

    Até hoje, entretanto, as fazendas na Bolívia, as aeronaves, armas de precisão e veículos blindados que teriam sido investidos por Fuminho nos planos de resgate não foram localizados pelas autoridades policiais.

    Os locais onde, segundo as investigações, Fuminho dava treinamento para guerrilheiros e mercenários também não foram descobertos e tampouco encontrados os “soldados do exército” arregimentados pelo narcotraficante.

    O que há de concreto em desfavor de Fuminho são dois processos aos quais ele responde e foi oficialmente denunciado. Um deles é o que tramita desde 2018 na Justiça do Ceará, conforme mencionado no início da reportagem.

    O outro processo corre na Vara Criminal de Itapecerica da Serra, na Grande São Paulo. No início de 2013, a  Polícia Federal descobriu que Fuminho mantinha um bunker em Juquitiba. No local foram apreendidos dezenas de fuzis, metralhadoras, pistolas  e revólveres, além de 424 kg de cocaína, 80 kg de crack e seis kg de maconha.

    Agentes federais seguiram e filmaram Fuminho por diversas vezes na Favela Heliópolis, zona sul da cidade de São Paulo, Jardim Pantanal, zona leste e até em Capivari, no interior do estado.

    Os policiais federais só não o prenderam porque PMs da Rota, em uma investigação paralela, invadiram o bunker no dia 14 de março de 2013. O narcotraficante não estava no local e depois disso não foi mais visto pela polícia.

    Não há informações sobre o indiciamento de Fuminho por conta desses dois planos de resgate de líderes do PCC divulgados pelo Ministério Público Estadual.

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     A defesa do acusado diz que Fuminho jamais planejou algum tipo de resgate. “Essas informações não procedem. Falam, falam, mas provas mesmo de que isso aconteceria não existem”, afirma o advogado Eduardo Dias Durante.

    A reportagem questionou, por e-mail, o MPE sobre as acusações de que Fuminho seria o mentor dos planos de resgate, quais as evidências encontradas e se há, nesse momento, alguma investigação ou denúncia em curso. Até o momento, não houve retorno.

    Fuminho estava foragido desde janeiro de 1999 quando escapou da Casa de Detenção, no Carandiru, Zona Norte. Segundo a Secretaria Estadual da Administração Penitenciária, ele fugiu junto com Marcola. 

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