Supermercado Makro me obrigou a usar banheiro masculino, afirma funcionária lésbica

    Thais Cyriaco afirma ter sido impedida de usar o banheiro feminino por 5 meses até conseguir liminar favorável na Justiça; ela voltará a usar o espaço na unidade onde trabalha, em Campinas (SP)

    Thais não usa roupas ditas como sendo de padrão feminino | Foto: Arquivo pessoal

    Thais de Paula Cyriaco, 30 anos, trabalha como auxiliar de limpeza terceirizada da rede de supermercado atacadista Makro, da unidade Santos Dumont, em Campinas (SP), desde junho de 2018. Em setembro do ano passado, porém, foi comunicada pela empresa que a contratou para trabalhar na loja, a Elofort Serviços, que, a partir daquele momento, estava proibida de usar e limpar os banheiros femininos da unidade. O motivo era a sua orientação sexual e sua aparência: Thais é lésbica e não se veste com roupas ditas femininas.

    Quem fez a reclamação foi uma promotora de vendas da Aurora Alimentos, que passou a trabalhar dentro do Makro em setembro de 2018. Ao se deparar com Thais dentro do banheiro feminino, a mulher alegou que se sentia constrangida com a presença de Cyriaco. De acordo com a advogada da vítima, Janice Dias, a funcionária é responsável pela limpeza de vários setores, inclusive banheiros e vestiários, tanto masculino quanto feminino.

    “Desde a reclamação, a auxiliar de limpeza foi impedida de entrar no banheiro/vestiário feminino tanto para desempenhar suas funções quanto para fazer uso pessoal do local como troca de roupa, necessidades fisiológicas e armário. Isso faz com que ela tenha que vestir seu uniforme por cima da roupa para não ser vista nua pelos homens no banheiro, além de conviver com homens usando mictório, vivendo em um ambiente de risco de violência sexual. Ela abstém-se de fazer suas necessidades fisiológicas, esperando um momento de o banheiro ficar vazio para entrar”, explica a advogada.

    Em dezembro de 2018, uma colega de trabalho de Thais, inconformada com a situação, procurou a advogada para tentar ajudar a amiga. Como estava viajando, a advogada pediu o contato de Thais e no retorno entrou em contato com ela. No dia 18 de fevereiro, uma petição foi enviada à Justiça de Campinas para que Thais pudesse usar o banheiro feminino.

    Em entrevista à Ponte, a funcionária relembra momentos de medo e vergonha ao usar o banheiro masculino. “Foi muito constrangedor, durante o meu horário de trabalho, ter que usar o banheiro dos meninos. Não tem lógica eu, mulher, ter que usar o banheiro dos meninos. Sentia medo o tempo todo. Era ruim tanto para mim quanto para eles”, conta Paula.

    Na última sexta-feira (21/02), a 6ª Vara Cível, em nome do juiz Andre Pereira de Souza, expediu uma liminar em favor da funcionária. A ação pede, além de reparação financeira por danos morais, a realização de palestras sobre gênero e LGBTIfobia (preconceito motivado por orientação sexual ou orientação de gênero) por parte de todas as empresas envolvidas.

    Com a liminar, Cyriaco espera poder voltar a usar o banheiro feminino. “Espero chegar lá e poder usar o banheiro feminino. Por várias vezes eu cheguei em casa muito constrangida, sem querer voltar para trabalhar no dia seguinte. Ficava uns minutos tomando coragem para entrar no banheiro, com medo do que podia acontecer ou do que eu podia ver”, explica Thais.

    A liminar concedida pelo juiz mantém o vínculo empregatício e o restabelecimento do uso do banheiro feminino em até 24h após o recebimento do documento, que foi enviado para as empresas, via e-mail, nesta segunda-feira (25/01). A advogada Janice informou que, em caso de não conseguir retorno das empresas, irá enviar a documentação via correio. O prazo é de 10 dias.

    “Na presente demanda, em razão dos fatos e documentos apresentados, observo a presença dos fundamentos necessários à concessão da tutela de urgência conforme pleiteada, para determinar que haja a manutenção do vínculo empregatício da parte autora, e para que seja possibilitada a ela a utilização do banheiro destinado às pessoas do sexo feminino. Vislumbro a possibilidade de prejuízo irreparável ou de difícil reparação caso a medida seja relegada para depois da formação do contraditório, uma vez que o serviço objeto da presente demanda afeta sobremaneira os direitos da personalidade da parte autora. Isso é o que basta para se reconhecer a necessidade da concessão da tutela de urgência à parte autora, cuja satisfação não deve ser relegada para o final do processo”, defende.

    A Ponte entrou em contato com as três empresas, Elofort Serviços, Makro e Aurora Alimentos, tanto via telefone, quanto através dos e-mails disponibilizados nos sites oficiais de cada uma, mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem.

    *ERRATA: Diferente do que foi publicado, não houve determinação por escrito para que Thais de Paula Cyriaco não usasse o banheiro feminino. A reportagem foi atualizada com a informação correta às 17h20 do dia 26/2.

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