Dentista obriga esteticista negra a usar saco de lixo na cabeça durante cirurgia

    Cristiane Boneta teve que usar saco de lixo por causa do “volume do cabelo” em clínica da Baixada Fluminense; ela tem recebido ataques virtuais racistas após denúncia

    Cristiane precisou usar saco de lixo no cabelo e no corpo para fazer cirurgia em clínica no RJ | Foto: Reprodução/Instagram

    A esteticista Cristiane Boneta, 28 anos, pagou R$ 1.600 para realizar dois procedimentos cirúrgicos na gengiva na clínica Odonto Irmãos Padilha, em Duque de Caxias, Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro, na última quarta-feira (26/6). Mas, antes de começar a cirurgia, foi obrigada a usar sacos de lixo nos cabelos e no corpo.

    A justificativa dada pela clínica à Cristiane foi de que seu cabelo era “muito volumoso” e, dessa forma, a touca não o comportaria. No corpo, a desculpa foi de que era para proteger o profissional que iria atendê-la. Profissional da área de saúde, Cristiane sabia que aquele procedimento não estava certo, já que sacos de lixo não podem substituir um EPI (Equipamento de Proteção Individual).

    À Ponte, Cristiane afirmou que entrará com um processo de injúria racial e contou que tem recebido mensagens de ódio em suas redes sociais depois da denúncia. “As pessoas têm me escrito falando do meu cabelo, dizendo que o problema não é a etnia e sim o meu cabelo. Isso mexe muito com o psicológico da gente. Além de passar pelo constrangimento, tenho que receber esse tipo de mensagem”.

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    O sentimento que fica, afirmou a esteticista, é de revolta. Depois de tudo, ainda terá que voltar em outro profissional, porque está sentindo dores no local da cirurgia. Cristiane contou que uma das donas da clínica ligou para se desculpar.

    “Ela me disse que colocou o saco porque o EPI ia chegar no dia seguinte. Se sabiam que o EPI ia chegar, poderiam ter marcado comigo no dia que o equipamento chegasse”, criticou.

    Na clínica, a esteticista decidiu realizar o procedimento, mas, depois, usou seu Instagram e seu Facebook para trazer a denúncia à tona. No texto, Cristiane disse que não sabia se havia sido vítima de racismo ou descaso.

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    “Em um ato de desespero, e a única arma que eu tenho é o celular, eu comecei a registrar tudo, porque se eu simplesmente contasse você não iria acreditar. Me senti muito constrangida com a situação e não parava de chorar em todo o procedimento. Não por causa do procedimento, mas por causa da situação que ali se passava”, escreveu.

    “Ao entrar no consultório, eu questionei com o dentista sobre o saco de lixo e a reposta dele foi que o saco estava limpo. Como precisava muito finalizar essa cirurgia, eu acabei me submetendo a essa situação. Não tive forças para dizer não e não tive forças para sair dali”, relatou.

    Outro lado

    A reportagem procurou a clínica Odonto Irmãos Padilha pelos telefones do consultório e o número pessoal do dentista Wagner Padilha, profissional que fez o procedimento em Cristiane, mas, até o momento da publicação, não obteve retorno.

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    Também acionamos o Conselho Federal de Odontologia, por e-mail, para questionar o procedimento adotado pela clínica, de usar sacos de lixo em pacientes, mas também não obtivemos retorno.

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