México 70: favela em São Vicente (SP) vive dias de terror após assassinato de PM

Três homens foram baleados nas imediações da favela após a morte do soldado Juliano Ritter, no dia 28. PM realizou operação na comunidade e, segundo denúncias, invadiu casas e agrediu pessoas. Moradores protestaram: ‘a favela pede paz’

Advogado Rui Pereira e vereador Tiago Peretto em frente à manifestação em São Vicente, no dia 1º | Foto: Arquivo pessoal

A comunidade do México 70, em São Vicente, no litoral do estado de São Paulo, uma das maiores favelas da Baixada Santista, vive dias de terror desde que o policial militar Juliano Ritter, 31 anos, foi assassinado ao lado de uma base móvel da PM, próximo a uma das entradas da comunidade, em 28 de novembro.

O soldado, que trabalhava no 39º BPM/I (Batalhão de Polícia Militar do Interior), foi baleado na cabeça e morreu após ser levado ao Hospital Municipal de São Vicente. No dia seguinte ao crime que vitimou o soldado, três homens foram baleados na região, em um espaço de tempo de menos de três horas, conforme registros na delegacia da Polícia Civil de São Vicente.

A primeira vítima, um cabeleireiro de 54 anos, foi baleada no peito, em um dos dedos, antebraço e joelho esquerdo, por volta da 0h do dia 29, na Rua João Serrano. Ele foi socorrido e levado ao Hospital Municipal de São Vicente. Ainda internado, ele teria informado à polícia que não viu de onde partiu o disparo que o atingiu. 

Pouco mais de uma hora e meia depois, uma segunda pessoa foi baleada a 800 metros dali. Dessa vez, um homem de 32 anos levou um tiro no ombro direito, na Rua Rio Renó. Aos policiais, ele disse que o disparo partiu de uma pessoa em uma motocicleta preta.

Na mesma madrugada, por volta das 2h30, atiradores fizeram uma terceira vítima. Um ajudante de 30 anos foi atingido por quatro disparos na Avenida Brasil, a um quilômetro do local do ataque anterior. A mãe da vítima disse à polícia que o filho foi vítima de dois homens que estavam em uma motocicleta e atiraram diversas vezes contra ele. 

Nos três casos, o delegado plantonista Lucas Santana dos Santos preferiu não manter o local do crime preservado e nem pediu ajuda da Polícia Científica, afirmando que, como as vítimas haviam sido socorridas, a possibilidade de perícia teria sido “prejudicada”.

De acordo com o advogado Rui Elizeu de Matos Pereira, ativista dos direitos humanos que acompanha os casos na comunidade, as ações violentas na região continuaram nos dias seguintes à morte do PM Ritter. Além dos três baleados no México 70, há relatos de moradores de outras comunidades sobre operações da Polícia Militar.

Na comunidade México 70, houve uma operação da PM na quarta-feira (1º/12), na qual moradores tiveram casas invadidas e relataram ainda agressões por parte dos policiais militares, conforme informações do advogado.

Moradores foram às ruas durante operação da PM em comunidade de São Vicente, no dia 1º | Foto: Reprodução/Redes sociais

No mesmo dia, a população organizou uma manifestação na região pedindo por paz, e o vereador Tiago Peretto (PL), juntamente com advogados e ativistas, foram ao local para tentar amenizar o clima de conflito entre moradores e Polícia Militar. 

Também na quarta-feira, um policial penal (atual nome dos antigos agentes penitenciários), de 40 anos, foi morto no Jardim Rio Branco. Segundo o jornal A Tribuna, ele atuava fazendo “bico” como segurança particular em um dos mercados do bairro. Baleado por tiros vindos de um carro, morreu no Hospital Municipal.

O advogado Pereira e o vereador Peretto fizeram uma reunião na quinta-feira (2/12), com o comandante do batalhão da PM de São Vicente. Na conversa com o comandante, Pereira afirma que o oficial disse apenas que vai apurar qualquer denúncia de ilegalidade nas atuações de seus subordinados.

As informações sobre os ataques na comunidade México 70 também foram encaminhadas para a Ouvidoria de Polícias do Estado de São Paulo. Procurado pela reportagem, o ouvidor Elizeu Soares Lopes disse que irá ao município na próxima segunda-feira (6/12), para conversar com ativistas, políticos e moradores da comunidade acerca dos acontecimentos. 

Para a ativista Débora Maria da Silva, do Movimento Independente Mães de Maio, essa nova onda de ataques na Baixada Santista “é preocupante porque desde os crimes de 2006, o Estado e a ‘insegurança pública’ não passam para a população o que é essa guerra não declarada que a população das favelas e periferias vive”. 

“Precisam explicar o que há por trás disso, e não é declarado, para que haja tantas mortes tanto de um lado, como do outro. Mas precisamos dizer que a dor das mães das favelas é a mesma que a mãe do policial morto sente. Essa dor não se mede, e nunca respinga nos governantes que ganham a proteção desses mesmos fardados”, afirma a líder das Mães de Maio.

Outro lado

A Ponte questionou a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo e a Polícia Militar sobre as vítimas de tiros, as possíveis ligações entre os casos com a morte do policial militar, e as informações sobre violência praticada por PMs em ações na comunidade de São Vicente. A secretaria retornou dizendo que “devido ao plantão nas unidades policiais, só conseguimos apurar casos factuais e do dia”.

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