Governo divulga dados subnotificados de casos suspeitos de covid nos presídios

    Painel lançado pelo Ministério da Justiça aponta 76 casos suspeitos no Brasil, sendo 34 em Minas Gerais, mas governo mineiro diz que número já chegou a 50

    Presos da Penitenciária de Lucélia (SP), após rebelião, em 27/4/18 | Foto: Arquivo Ponte

    Os presídios brasileiros registram 76 casos suspeitos de contágio pelo novo coronavírus, segundo dados do painel de monitoramento criado pelo Depen (Departamento Penitenciário Nacional), subordinado ao Ministério da Justiça e da Segurança Pública. Não há nenhum caso confirmado até o momento. Os dados oficiais, porém, estão longe de refletir os números reais de casos suspeitos.

    O levantamento lançado pelo governo se propõe a a apresentar dados “atualizados diariamente com a autodeclaração dos gestores prisionais”, mas a Ponte comprovou que isso ainda não acontece. Enquanto o painel do Depen mostra 34 casos suspeitos em Minas Gerais, a assessoria de imprensa da Secretaria da Administração Penitenciária do governo Romeu Zema (Novo) informou à reportagem que o número atualizado de presos sintomáticos é “próximo de 50”. A pasta afirma que todos os casos que apresentam sintomas da Covid-19 estão sendo isolados e serão testados. 

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    Além disso, o painel nacional retrata os dados concentradas em apenas três estados. Minas Gerais lidera, com 34 casos suspeitos, seguido por Rio Grande do Sul, com 28, e São Paulo, com 14. O Ministério da Justiça reconhece que nem todos os estados repassaram suas informações à base nacional.

    O número de casos suspeitos anunciados pelos estados é claramente subnotificado, avalia a socióloga Thandara Santos, conselheira do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e integrante do Laboratório de Gestão de Políticas Penais da Universidade de Brasília. “Se fora do sistema prisional sabemos que existe uma carência de testes em unidades de saúde, certamente dentro das prisões esses testes também não chegam. Esses dados estão muito aquém da realidade nacional”, afirma.

    Segundo a especialista, tampouco há indícios que comprovem que o sistema prisional mineiro lidere o número de suspeitas, uma vez que a quantidade de notificações repassadas pode estar relacionada apenas à “capacidade maior de algumas administrações de identificação e compilação dos casos”. 

    A Secretaria da Administração Penitenciária do Rio Grande do Sul, da gestão Eduardo Leite (PSDB), afirmou em nota que a identificação dos casos notificados foi feita “à semelhança do que ocorre em qualquer ambiente, a partir de sintomas suspeitos”. Segundo a pasta, os casos suspeitos foram testados, isolados e estão em observação das equipes de saúde da gestão. Já a Secretaria da Administração Penitenciária paulista, da gestão João Doria (PSDB), não se manifestou até a publicação desta reportagem.

    Fim das visitas

    De acordo com o painel do Depen, 95% das unidades prisionais brasileiras estão fechadas para visitas. As demais constam na plataforma como penitenciárias que adotaram a um mecanismo de “[visitas] mantidas com restrições”. Questionado sobre esses dados, o departamento afirma que o Espírito Santo era o único estado que “até o momento não havia suspendido integralmente as visitas, mas tomou hoje [1/4] essa decisão”.

    Para o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, a covid-19 não é uma ameaça séria à população prisional. “Há um ambiente de relativa segurança para o sistema prisional em relação ao coronavírus pela própria condição do preso de estar isolado da sociedade”, disse Moro, nesta quarta-feira (1/4) em coletiva de imprensa no Palácio do Planalto. 

    O ministro aposta na suspensão das visitas aos presídios como principal medida protetiva aos presos no país. Em nota enviada à reportagem, o Depen afirma que, entre as recomendações anunciadas pelo órgão do ministério, estão a “suspensão de visitas e o isolamento de internos em casos em que há suspeita da doença”.

    Já as recomendações feitas pelo Conselho Nacional de Justiça vão além e recomendam a adoção de medidas judiciais para transferir detentos do regime semiaberto ou fechado para o regime domiciliar, principalmente gestantes, lactantes, idosos, presos que integrem grupos de risco para o novo coronavírus e presos provisórios encarcerados há mais de 90 dias. A mesma orientação foi dada a juízes que atuam no cumprimento de medidas socioeducativas com crianças e adolescentes.

    Para Thandara, ao vetar as visitas neste momento os estados estão “suspendendo uma porta de entrada importante para insumos básicos de higiene, alimentação, vestimentas e medicamentos, que nem o Estado consegue oferecer e que são levados pelas famílias nas visitas”.

    Para a especialista, o Ministério da Justiça e Segurança Pública “tem capacidade de fazer orientações muito mais consistentes e estruturantes aos estados, como realizar triagens qualificadas dos visitantes, a partir de possíveis indícios e sintomas, garantindo que os insumos necessários cheguem às pessoas presas”.

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