Mulher grávida é atingida em operação policial na Maré

    Às 5h da manhã desta terça cerca de 300 agentes da Polícia Civil em 5 blindados e dezenas de viaturas estiveram em cinco favelas do Complexo da Maré, Rio de Janeiro. Unidades de saúde não funcionaram e duas pessoas ficaram feridas, uma delas grávida e está em estado grave

    Policial do Core de costas, no Rio de Janeiro
    Policial do Core, no Rio de Janeiro | Foto: Kamila Camilo / Maré de Notícias

    Era por volta de 5h da manhã de terça-feira (27/10) quando 300 agentes da Polícia Civil em dezenas de viaturas e cinco blindados estacionaram na Avenida Brasil, no Rio de Janeiro. Minutos depois, o grupo entrou numa das favelas da Maré, o Parque União. Segundo moradores, houve registro de tiros. 

    Havia viaturas estacionadas na Avenida Brasil desde a passarela 8, na altura da Baixa do Sapateiro, até depois da passarela 10, altura do BRT, estação Maré, o que fez com que a via fosse interditada no sentido Zona Oeste.

    A ação também aconteceu nas favelas Rubens Vaz, Nova Holanda e Parque Maré. Às 11 horas houve uma incursão pela Baixa do Sapateiro e Morro do Timbau, e registros de tiros na Rua do Serviço no fim da manhã e na Vila dos Pinheiros no meio da tarde.

    A operação terminou por volta das 17h, durando 11 horas, de maneira silenciosa, com poucos registros de tiros. Em coletiva de imprensa, foi explicado que a operação policial foi consequência de uma força tarefa da inteligência da Polícia Civil, que envolveu cinco delegacias e uma investigação de três meses, que mapeou 100 pessoas com mandado de prisão supostamente escondidos na Maré. Segundo a nota da assessoria de imprensa da Polícia Civil, foram apreendidos fuzis, granadas, silenciadores, e carros e motos que seriam roubadas. Dezenove pessoas, entre adultos e adolescentes, foram presas/apreendidas na operação.

    Foto: Douglas Lopes / Maré de Notícias

    Um dos mandados, segundo a polícia, foi para o suposto autor do assassinato do menino Leônidas Augusto da Silva Oliveira, de 12 anos, que morreu após ser atingido na cabeça um confronto na Avenida Brasil, no dia 9 de outubro. A polícia não apresentou nenhum registro  que comprove a informação do autor da morte do menino.

    Apesar de a operação policial ter sido realizada junto ao setor de Inteligência da Polícia, os moradores da Maré continuam sofrendo com os impactos da ação. O Maré de Direitos, projeto da Redes da Maré que oferece atendimento sociojurídico, identificou seis invasões a domicílio, quatro danos ao patrimônio e um caso de subtração de pertences, onde, segundo a moradora, os agentes da Polícia Civil furtaram R$300,00 de sua casa.

    Duas pessoas ficaram feridas, incluindo uma jovem de 19 anos grávida de 4 meses que foi atingida na barriga no Parque União. Segundo relato dos moradores, a jovem saía de casa quando foi atingida por um grupo de policiais que estavam na laje de uma casa vizinha. A jovem foi encaminhada para o Hospital Municipal Evandro Freire, passou por uma cirurgia e está no CTI (Centro de Tratamento Intensivo) em estado grave.

    Segundo familiares, na cirurgia de terça foi retirada a bala mas a família ainda não sabe se a moça se submeterá a novo procedimento cirúrgico nesta quarta (28/10). A bala teria atingido pulmão, rim e bexiga. O bebê de 4 meses continua com vida.

    Operações policiais e pandemia

    Mesmo com a pandemia de covid-19, os agentes não estavam utilizando Equipamentos de Proteção Individual. Após votação no Supremo Tribunal Federal em agosto de 2020, uma das medidas da Arguição De Descumprimento De Preceito Fundamental 635 (popularmente conhecida como ADPF das Favelas) foi a suspensão de operações policiais durante a pandemia devido à crise sanitária que a população vive. As operações poderiam acontecer em casos excepcionais mediante justificativa por escrito pela autoridade competente e sendo comunicada ao Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro. A ADPF 635 prevê também que um promotor de plantão acompanhe a operação. A equipe do Maré de Direitos entrou em contato com o Ministério Público, mas até o momento não foi informada a identificação do promotor que acompanhou a operação. 

    Durante todo o dia (27/10), as Clínicas da Família CF Augusto Boal, Diniz Batista dos Santos  e Jeremias Moraes da Silva não funcionaram.

    Segundo Painel Rio Covid-19, o município do Rio de Janeiro conta com 116.591 casos e 11.899 óbitos confirmados. Desses, 775 casos e 129 óbitos são na Maré. Na última semana (de 20 a 26/10)  o número de casos de coronavírus aumentou 4% na Maré. 

    No final de julho foi lançado o Conexão Saúde – De Olho no Covid-19, que é um projeto em parcerias com diversas organizações para o enfrentamento da pandemia na Maré e em Manguinhos. O projeto oferece o acesso à testagem, telemedicina e ao programa de isolamento seguro.

    Devido à operação policial desta terça, pelo menos 110 testes para Covid-19 deixaram de ser realizados no Centro de Testagem da Maré. Da mesma forma, pessoas com casos de covid-19 ativo acompanhadas pela Redes da Maré no Programa de Isolamento Seguro e que necessitam de auxílio alimentação para a garantia do isolamento domiciliar durante o período de infecção não puderam receber o kit alimentação disponibilizado pelo programa.

    Além da Maré, nos últimos 10 dias aconteceram operações policiais em Acari e no Jacarezinho. Também nesta terça-feira (27), duas pessoas foram mortas durante operação no Complexo do Lins.

    Reportagem publicada originalmente no portal Maré de Notícias

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