Travestis e transexuais debatem sobre a dificuldade de inserção no mercado de trabalho

    Liderada por ativistas, conversa discute a falta de protagonismo de pessoas trans em empresas

    Encontro debateu marcado de trabalho para trans | Foto: Wallace Leray

    Cerca de 30 pessoas se reuniram neste sábado (15) para debater a dificuldade de inserção da população trans no mercado de trabalho. O evento aconteceu na Ação Educativa, localizada na Rua General Jardim, região central de São Paulo.

    A idealizadora do Aparelha Luzia, centro cultural e político destinado a negros, Erica Malunguinho, foi uma das convidadas para participar da mesa. Erica fala que há uma questão compulsória por quem toma as decisões nas empresas. Para ela, a violência institucional não permite que determinada população se insira no espaço de trabalho e, mesmo quando estão dentro, não há uma política de permanência dessas pessoas. “A gente não consegue chegar lá. As vezes eu paro pra pensar que eu sou a única trans preta em todo lugar que eu vou“, afirma.

    Não há dados mostrando o número de travestis e transexuais que estão efetivamente trabalhando. Mas não é muito difícil ver a falta de protagonismo desses e dessas profissionais. Basta avaliar os perfis ao redor de qualquer ambiente de trabalho e será possível ver que na maior parte das vezes o resultado é nulo. Durante o debate, a mediadora do encontro, Cinthia Gomes, perguntou se algum cisgênero trabalhava com alguma pessoa trans. Apenas duas mulheres levantaram a mão.

    30 pessoas se reuniram na Ação Educativa | Foto: Wallace Leray

    A coordenadora adjunta de políticas LGBT da Prefeitura da São Paulo, Janaina Lima, também estava compondo a mesa. Ela conta que estar ocupando um cargo público hoje enquanto pessoa travesti não quer dizer que o mercado esteja aberto pra todos. “Eu sou uma das poucas exceções que existem“, ressalta.

    O Brasil é o país que mais mata travestis e transexuais no mundo, a expectativa de vida é de 35 anos. Segundo levantamento feito pelo Grupo Gay da Bahia, no ano passado foram registradas 144 mortes no país. Dados da ONG Trangender Europe mostram que 82% das pessoas trans abandonam o ensino médio entre os 14 a 18 anos.

    Hellen Souza Pereira, já passou por alguns trabalhos, mas no momento está desempregada. Ela conta que por diversas vezes já foi desrespeitada por não quererem chamá-la pelo seu nome. “As pessoas não entendem que o tratamento tem que ser no feminino, porque é o gênero que eu me identifico. Então, mesmo eu me capacitando, me qualificando pra conseguir um cargo, ainda sou muito destratada. Muitas vezes por um simples ‘a’ ou ‘o'”, desabafa. Hellen também disse que recentemente estava em um restaurante, mas foi demitida mesmo cumprindo todos requisitos que eram exigidos.

    Janaina Lima comanda o projeto Transcidadania, administrado pela gestão municipal de São Paulo. O programa tem como objetivo fazer com que travestis e transexuais voltem às instituições de ensino e com isso se integrem em empresas. Ela fala que há um problema com a questão da permanência de quem participa do Transcidadania, pois muitas delas não estão preparadas para aquela nova realidade. “A gente tem lutado muito sobre algumas questões com as Secretarias do Trabalho e de Educação, porque a menina travesti geralmente é expulsa da escola e ela não tem vontade de voltar pra aquele lugar. A pessoa trans tem uma vida totalmente diferente de uma cisgênero”, relata.

    Andreza Matsumoto, é funcionária do programa de inclusão no Senac. Ela disse estar participando do evento, porque juntamente com a sua equipe no trabalho estão discutindo maneiras de ampliar o acesso à integração de travestis e transexuais. “Quando a gente fala de inclusão de pessoas com deficiência, nós temos uma lei que obriga a empresa a garantir um percentual de pessoas contratadas e percebe-se que isso, de alguma forma, impulsiona a contratação delas. Mas quando estamos falando de transexuais, a gente não tem nenhuma garantia de lei, o que dificulta muito. Por isso, como representante, eu precisava vir escutar esse público e não apenas ficar fazendo pesquisas, porque eles e elas precisam ser escutados”, disse.

    Erica Malunguinho explica que há uma superestrutura na sociedade que não pode ser contrariada e quando algo fora dos padrões aceitos mostra resistência, os fenômenos da exclusão e opressão aparecem. “A igreja, a escola, a familia, a mídia, as instituições políticas estão todas preparadas para nos matar, simbolicamente e fisicamente”.

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