Texto: Catarina Duarte Imagem: Arquivo Pessoal
Em outubro de 2023, o governo Lula apresentou as diretrizes de atuação do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP). O Programa Nacional de Enfrentamento às Organizações Criminosas (Enfoc) foi anunciado e mostrou uma dinâmica já conhecida: mais dinheiro para as polícias.
No entanto, para o Diretor de Pesquisas do Centre National de la Recherche Scientifique e autor de “Irmãos: uma história do PCC”, Gabriel Feltran, a segurança pública não é um problema de polícia. Em entrevista à Ponte, Feltran defende outra lógica para a área partindo da compreensão do problema real enfrentado no país.
“Não temos uma guerra do Estado contra o crime organizado. Isso é a maior das ficções. O que existe é um monte de dinheiro sendo gerado em mercados ilegais que estão cada vez mais associados entre si, e protegidos por policiais corrompidos que os achacam”
O pesquisador ainda reforça que o Estado não tem um controle claro das polícias e muitos agentes atuam de forma autônoma e por vezes associados a grupos criminosos.
“Nós perdemos a dimensão do que seria segurança pública, do que seria garantir direito à segurança, de que estratégias técnicas deveriam ser tomadas racionalmente para diminuir o conflito armado brutal que existe entre facções e entre polícia e grupos criminais hoje”.
Feltran ainda aponta algumas preocupações em relação aos resultados de operações policiais, como o demonstrado pela Operação Escudo, ocorrida no litoral paulista entre o final de julho e começo de setembro de 2023, deixando ao menos 28 mortos.
“Ao mesmo tempo, o problema vai se intensificando. Estamos naturalizando operações com 28 pessoas mortas, mas não só isso: essas operações podem ser seguidas de uma coletiva de imprensa messiânica, considerando herói quem morreu por não ter sido protegido, desafiando o STF e ameaçando pesquisadores. Onde isso vai parar?”.
Para o pesquisador, problemas como a terceirização da força policial, encarceramento por crimes leves enquanto pessoas perigosas continuam soltas e a falta de regulação das mercadorias ilegais são pontos que formam "gerações para favorecerem o crime" e não ressocializarem.
Por fim, de acordo com o pesquisador, suas propostas seriam refutadas pelos mais entusiastas da violência policial e mais aceitas para um outro grupo de pessoas e o governo federal atual.
“Para os que não se cansaram de matar e os que comemoram por WhatsApp quando matam um bandido, minhas propostas não devem ser positivas. Para os demais, e para o governo federal atual, estou seguro de que seriam”.