“Há uma crença de que mulheres não europeias podem ser tratadas como objetos”

    Feminista britânica afirma que a objetificação de mulheres na mídia britânica permite violência de gênero
    Mulheres protestam contra turismo sexual no Brasil |Foto: reprodução
    Mulheres protestam contra turismo sexual no Brasil |Foto: reprodução

     

    Diretora executiva da organização não governamental Object, sediada no Reino Unido, a feminista Roz Hardie estuda e combate a exploração da imagem feminina como objeto na imprensa, publicidade e em publicações pornográficas. “Há muitas publicações especializada em exploração de pessoas negras e latinas”, explicou a ativista.

    Em recente visita ao Brasil, Roz participou do I Seminário Internacional Cultura da Violência contra as Mulheres, em São Paulo e organizado pelo Instituto Patrícia Galvão e Instituto Vladimir Herzog.

    Durante sua apresentação, a feminista deu exemplos de como a imagem da mulher brasileira é tratada no Reino Unido: “O Brasil não foi nossa colônia, mas há um legado de crenças de que em países que não são da Europa, as pessoas estão disponíveis e podem ser tratadas como objetos. É uma mentalidade racista, sexista e ofensiva para as brasileiras”.

    Como é a exploração da imagem da mulher brasileira no Reino Unido?

    Roz Hardie – Durante a Copa do Mundo, em 2012, a presidente Dilma reclamou das camisetas da Adidas, que tinham imagens que faziam apologia ao turismo sexual. As pessoas amam o Brasil, a camisa, a imagem, há uma reputação positiva, mas o estereótipo da mulher brasileira é de muito uma mulher quente, disponível, especialmente para turistas que vão ao Brasil. Há a ideia que os homens serão bem vindos sexualmente, quase como uma imagem de prostituição. Os exemplos que eu dei na minha apresentação foram de propagandas contra a objetificação da mulher.

    Durante a Copa, muitos de nós ficamos preocupados com os fãs de futebol britânico indo ao Brasil e explorando crianças e prostituição. Até nosso time de futebol mandou uma mensagem aos fãs de futebol recriminando a exploração sexual.

    Foi uma mensagem forte sobre crianças e foi correto, creio, mas acho que não deveriam explorar mulheres também. A maioria das mulheres que estão na prostituição hoje começaram quando eram jovens. Então, se uma mulher é explorada aos 12, 13, quando chega aos 18 e não deixa de ser explorada.

    No Reino Unido há revista pornô com histórias de praia, corpos, e muitas propagandas de mulheres brasileiras. Ele se encaixa numa mentalidade britânica de colonialismo. O Brasil não foi nossa colônia, mas há um legado de crenças de que em países que não são da Europa, as pessoas estão disponíveis e podem ser tratadas como objetos. É uma mentalidade racista, sexista e ofensiva para brasileiras. Outro exemplo que eu dei sobre a percepção do Brasil é sobre uma revista de pornografia que acabou de ser lançada chamada adolescentes brasileiras gostosas.

    Eu dei o exemplo do Brasil, mas há outros estereótipos que são de outras minorias étnicas, há muita pornografia especializada em exploração de pessoas negras e latinas.

    Há diferença entre a exploração de mulheres de minorias étnicas, latinas e negras das britânicas e europeias?

    Roz Hardie – Definitivamente, se você é menos poderosa, tem menos direitos, está mais vulnerável para a exploração. Muitos estereótipos do período colonial ainda da estão na mentalidade da América e Europa. Houve muita violência sexual e exploração na era colonial, e muito disso ainda segue no presente, na história dessas mulheres, inclusive por conta de problemas econômicos estruturais, pobreza afetando muitas pessoas. A exploração fica mais fácil quando a mulher é mais vulnerável.

    Há abusos de mulheres britânicas também, mas o racismo é muito forte, a indústria é muito forte.

    Qual é o limite entre liberdade de expressão e exploração da imagem da mulher.

    Roz Hardie – A liberdade de expressão é um direito humano. Mas quando há outro ser humano que está sendo explorado, torturado, se ultrapassa os limites e há reflexos da escravidão.Há mensagens extremas sobre mulheres, como se elas desejassem ou merecem violência.

    Pode falar sobre campanhas da sua organização?

    Roz Hardie – Temos feito campanhas diferentes. Já fomos, por exemplo, de pijamas a um supermercado que vende revistas pornôs. Ás vezes são campanhas curtas, de uma hora no twitter. Ou campanhas para mudar as leis de prostituição. Com mobilização conseguimos mudar a lei que regula os clubes de strip tease. Já conseguimos tirar, em horas, campanhas que geraram indignação. Um deles foi um anúncio publicado em vários veículos durante o julgamento do ex-atleta paralímpico sul-africano Oscar Pistorius, condenado pelo assassinato da namorada, a modelo Reeva Steenkamp, em 2013.

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