“Haverá livre curso para a aprovação de leis cerceadoras dos direitos fundamentais”

    Para o jurista Fábio Comparato, a extinção das pastas de direitos humanos, mulheres e igualdade racial comprovam que temas são irrelevantes para governo de Michel Temer

     

    Comparato 2

    Em entrevista à Ponte Jornalismo, o jurista e professor titular aposentado da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), Fábio Konder Comparato, comenta a decisão do presidente em exercício, Michel Temer, de extinguir as Secretarias de Políticas para as Mulheres, de Direitos Humanos, de Políticas de Promoção da Igualdade Racial e a indicação de Alexandre de Moraes, ex-secretário da Segurança Pública do Estado de São Paulo, para a pasta da Justiça.

    Como o senhor avalia a extinção da Secretaria de Direitos Humanos (e também as pastas das mulheres e igualdade racial)?

    A extinção da secretaria especial de direitos humanos, bem como das pastas das mulheres e da igualdade racial, é a comprovação de que, para o novo governo federal, tais assuntos são de todo irrelevantes. Na verdade, até hoje não se consolidou, na mentalidade do grupo oligárquico que sempre exerceu entre nós o poder político supremo, a convicção de que, como proclamado no Artigo I da Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948, “todos os seres humanos nascem livres e iguais, em dignidade e direitos”. Como disse o personagem suíno do romance A Revolução dos Bichos, de George Orwell, “todos os animais são iguais; alguns, porém, são mais iguais do que os outros”.

    Quais podem ser as consequências da extinção das pastas?

    Certamente haverá livre curso para, entre outras coisas, a aprovação de projetos de lei cerceadores dos direitos e garantias fundamentais já existentes em nosso ordenamento jurídico. Em matéria de cerceamento de direitos trabalhistas, por exemplo, já existem nada menos do que 50 projetos de lei no Congresso Nacional. Ainda não entrou na cabeça dos nossos oligarcas – o grande empresariado, sempre ligado aos principais agentes estatais – que os direitos trabalhistas são direitos fundamentais, assim declarados nos artigos 7º e 8º da Constituição, não podendo, portanto, ser enfraquecidos e menos ainda suprimidos. Na tradição brasileira, porém, as declarações constitucionais, mesmo as concernentes aos direitos humanos, não passam de mera ornamentação jurídica, para enganar os ingênuos.

    Como o senhor vê a indicação de Alexandre de Moraes para a pasta da Justiça?

    Pelo que se viu da atuação de Alexandre de Moraes no Secretariado do Governo do Estado de São Paulo, Sua Excelência, para dizer o mínimo, não manifestará no Ministério da Justiça muito empenho em defender os direitos fundamentais e punir os eventuais abusos da Polícia Federal.

    Como avalia a orientação do governo de São Paulo de fazer reintegração de posse de imóveis públicos ocupados por manifestantes sem recorrer à justiça, como ocorreu na sexta feira (13/05)?

    A decisão do Governador Alckmin, secundado pelo Secretário da (In)Segurança Pública, Alexandre de Moraes, de ordenar a reintegração de posse na Escola Paula Souza pela Polícia Militar, sem autorização do Poder Judiciário, foi suspensa pelo Juiz Luís Manuel Pires nos seguintes termos: “Sem mandado judicial, não há possibilidade de cumprimento de decisão alguma. Sem mandado judicial, qualquer ato de execução forçada caracteriza arbítrio, violência ao Estado Democrático, rompimento com a Constituição vigente e os seus fundamentos”. Diante disso, os Deputados Federais Luiza Erundina e Ivan Valente fizeram uma representação ao Procurador-Geral da República, para que sejam apuradas as responsabilidades penal, cível e administrativa do Governador do Estado e do seu Secretário Alexandre de Moraes, por abuso de autoridade.

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