Centro da prefeitura de Pitangui (MG) expõe placa pela ‘Consciência Humana’ antes do Dia da Consciência Negra

Cartaz com dizeres “Não precisamos de 1 dia de Consciência Negra e, sim, 365 dias de Consciência Humana” foi fixado na porta do CRAS Herivelton Maximo Pereira na antevéspera de feriado nacional; caso foi registrado na Polícia Civil

Moradora fotografou placa com os dizeres “Não precisamos de 1 dia de Consciência Negra e, sim, 365 dias de Consciência Humana” na porta do CRAS Herivelton Maximo Pereira, em Pitangui (MG) | Foto: arquivo pessoal

Maria* é mulher negra moradora de Pitangui, uma cidade de quase 30 mil habitantes distante a 125 km de Belo Horizonte, em Minas Gerais. Em 18 de novembro, passando pela rua, ela se impressionou ao ver uma placa na porta do Centro de Referência de Assistência Social Herivelton Máximo Pereira com os dizeres “Não precisamos de 1 dia de Consciência Negra e, sim, 365 dias de Consciência Humana”. O cartaz ainda tinha “Consciência Negra” acima e “chega de…” com mãos pretas desenhadas acompanhadas de palavras escritas em fitas brancas como “intolerância”, “preconceito” e afins.

Para ela, a placa da qual fotografou simbolizou desrespeito e apagamento da importância do Dia da Consciência Negra, data que foi pautada em 1971, mas instituída apenas em 2011 no país, corroborando para a falta de reconhecimento do racismo na sociedade. “Todo o momento que grupos pelos direitos da população negra se manifestam, sempre encontram barreiras, a hegemonia branca sempre precisa manter o seu status e a todo tempo tenta minimizar as pautas, as lutas, os posicionamentos, as dores e a gente tem alguém que endossa esse tipo de cartaz que é o presidente da Fundação Palmares, o Sergio Camargo, e exalta o branco como responsável por salvar a população negra que continua sendo explorada e oprimida como sempre foi”, afirma.

Fachada do CRAS Herivelton Máximo Pereira com a placa fotografada por Maria* em 18/11/2021.

Ela, que prefere não se identificar por medo de represálias, aponta que, por ser um município pequeno, ainda que tenha a presença de comunidades quilombolas, é muito difícil pautar e debater o racismo, ainda mais quando um órgão do poder público reverbera esse tipo de mensagem. “Um dia da Consciência Negra vai soar como desigual para eles [brancos] porque eles já estão num patamar de hegemonia, então para quem está no topo, qualquer pleito vai soar como uma luta injusta, sendo que a nossa luta é justamente para que tenhamos igualdade, o que não existe”, explica. “A gente precisa de mais do que um cartaz que seja removido de um órgão da prefeitura, a gente precisa remover isso [racismo] da cabeça das pessoas”.

Na rádio Band News FM, a jornalista Milena Teixeira, do podcast Pretoteca, também explicou por que a importância do Dia da Consciência Negra e não a criação de um Dia da Consciência Humana, em 20 de novembro. “Quando você vai em algum espaço de poder, não tem nenhum negro porque faltam negros nos lugares, porque negros estão morrendo nas favelas, porque negros são a maior parte da população que passa fome no Brasil hoje”, explicou. “Existe essa reparação histórica que o Brasil precisa fazer, o Brasil foi feito por mão de obra escrava, a gente precisa reparar essas pessoas, essas pessoas foram prejudicadas no desenvolvimento de várias áreas (…), a gente ficou atrasado quando houve a abolição da escravatura no Brasil, não houve emprego e escolaridade para todo mundo, a gente está lá atrás ainda”.

Maria* e o companheiro registraram na delegacia de Pitangui um boletim de ocorrência sobre o caso e vão procurar o Ministério Público Estadual.

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À Ponte, a assessoria da Polícia Civil informou que “instaurou Inquérito Policial para apuração da prática de racismo, cuja investigação encontra-se em andamento” e que “todas as providências de polícia judiciária estão sendo adotadas para completa elucidação dos fatos”.

O que diz a prefeitura

A reportagem ligou e encaminhou e-mail para a prefeitura de Pitangui cujos atendentes disseram que não há assessoria de imprensa e que dependeria de encaminhamento para o gabinete da Secretaria de Desenvolvimento Social avaliar. No entanto, até a publicação, não responderam os questionamentos.

*Nome foi ocultado a pedido da entrevistada que teme represálias.

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