“Direitos humanos é um porrete de pau de guatambu que a gente usou muitos anos em delegacia”, afirmou Laerte Bessa; para especialistas, deputado pode ser investigado por declarações
Na última terça-feira (3/10), durante uma sessão plenária no Congresso, em que o tema discutido era a performance do artista Wagner Schwartz, no MAM, o deputado Laerte Bessa (PR-DF) foi à tribuna após fala do deputado Jean Willys (PSOL-RJ) e admitiu que, quando ainda era delegado, usar tortura contra detidos era, além de algo aceitável, prática comum.
Nas palavras do parlamentar: “Pergunta se ele conhece direitos humanos? Direitos humanos é um porrete de pau de guatambu que a gente usou muitos anos em delegacia de polícia. Se ele conhece rabo de tatu, que também usamos em bons tempos em delegacia de polícia. Se aquele vagabundo fosse fazer aquela exposição (…) ele ia levar uma ‘taca’ que ele nunca mais ele iria querer ser artista e nunca mais iria tomar banho pelado”, disse.
O presidente da Casa, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), interrompeu mais de uma vez a fala do deputado pedindo que ele maneirasse nos termos. Na ata final, Maia solicitou que as expressões fossem suprimidas dos anais, o que pode ser visto nas notas taquigráficas da sessão.
Ouvido pela Ponte, o advogado da Conectas Direitos Humanos, Rafael Custódio, afirmou que o parlamentar incitou claramente a violência contra o artista – delito previsto no artigo 286 do Código Penal, punido com pena de três a seis meses de detenção – e confessou tortura, que, de acordo com a Constituição Federal, é crime imprescritível.
“Em tese, ele pode responder criminalmente, sim. Tendo algum tipo de informação sobre autoria e materialidade, necessariamente uma investigação deveria ser aberta para apurar e responsabilizar o culpado”, avalia Custódio, que ressalta também a incitação à violência contra o artista.
“A imunidade parlamentar protege as palavras do deputado federal durante o exercício do mandato. Mas a própria jusrisprudência do STF já decidiu que isso não é um cheque em branco para que os deputados possam cometer crimes indiscriminadamente. O que a imunidade parlamentar pretende é criar uma espécie de proteção para que o deputado federal não seja tolhido na sua atuação, o que não me parece o caso. É reprovável e de muito mau gosto que um deputado federal incite a violência física contra qualquer pessoa. Eu acho que, no mínimo, deveria ser motivo de repulsa da própria Câmara para uma eventual apuração”, explica Custódio.
O advogado Ariel de Castro Alves, membro do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe), destaca que a admissão da prática de tortura feita pelo deputado em plenário se refere a um período anterior ao exercício do mandato, ou seja, nesse caso, a imunidade não se aplicaria. “Se são da época que ele atuava como delegado, não tem imunidade, portanto, ele pode responder, além da quebra de decoro parlamentar, por fazer apologia de crime e incitar crimes”, afirma. “As pregações dele configuram verdadeiro atentado aos direitos humanos”, concluiu Ariel.
A postura de Laerte Bessa com relação a direitos humanos é bem conhecida: ele foi relator da Comissão da Maioridade Penal e, no parecer, defendia a diminuição de 18 para 16 anos para todos os tipos de crime, sem exceção.
Além disso, não foi a primeira vez que Bessa colocou em xeque a própria imunidade parlamentar. Ainda nesta semana, a 3ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do DF e Territórios (TJDFT) manteve sentença de primeira instância e condenou o deputado a pagar R$ 30 mil de indenização por danos morais ao governador Rodrigo Rollemberg por tê-lo chamado de “maconheiro, filho da puta, cagão, vagabundo”. Na decisão, o colegiado entendeu que “que a imunidade parlamentar não abarca os excessos praticados fora do parlamento, como no caso em questão”.
Outro lado
A Ponte procurou o deputado Laerte Bessa através da assessoria de imprensa dele e enviou as seguintes perguntas: