‘Enterrei meu único filho no Dia das Mães’, conta mulher que se organiza em luta por justiça em Londrina (PR)

Após morte de jovens em uma suposta perseguição policial, mulheres fazem manifestação e apontam diversos homicídios praticados pela Polícia Militar do Paraná

Willian Júnior e Anderbal Júnior, amigos mortos pela PM em Londrina (PR) | Foto: Arquivo pessoal

Uma suposta perseguição do batalhão de Choque da Polícia Militar do Paraná a um Chevrolet Cruze prata, no dia 6 de maio deste ano, em Londrina, no interior do Estado, terminou com dois jovens mortos e um ferido. Segundo a família e o sobrevivente, seis PMs executaram Willian Jones Faramilio da Silva Júnior, de 18 anos, e Anderbal Campos Bernardo Júnior, de 21.

“Meu único filho, de 18 anos, eu enterrei no Dia das Mães. Foi isso que o pelotão de Choque me deu de presente. Nós vemos que o abuso de policiais é cada vez maior no nosso país. A polícia é despreparada, aliás, é muito preparada para matar”, diz a autônoma Hayda Melo, mãe de Willian.

Willian Júnior, morto pela PM no dia 6 de maio de 2022 | Foto: Arquivo pessoal

Segundo familiares, os jovens estavam no Cruze roubado, mas possivelmente sem saber que o veículo era produto de roubo. Anderbal teria dito para sua mãe, Valdirene Inácio da Silva, que era um carro bambu, ou seja, um veículo financiado que não teve as prestações pagas e foi vendido por valor abaixo do mercado.

Outras informações de testemunhas, no entanto, indicam que eles pensavam que era carro de leilão. “A gente não sabe a realidade dos fatos, e eles morreram. Mortos não falam”, conta Hayda.

Já o sobrevivente, que teria entrado no carro 40 minutos antes de serem alvos de dezenas de tiros da Polícia Militar, teria apontado as ilegalidades cometidas pelos policiais, mas a investigação não considera o testemunho por apontá-lo como criminoso. Familiares do rapaz também afirmam que ele não sabia que o veículo era roubado.

Os três rapazes não teriam sido reconhecidos pela dona do veículo como autores do roubo, que aconteceu na manhã do mesmo dia que eles foram mortos. “Independentemente se meu filho estava dentro de um carro roubado, o trabalho da Polícia Militar não é matar, é prender. Meu filho não teve chance, ele simplesmente foi executado com 13 tiros, e ainda arrastaram o corpo dele para forjar confronto”, diz Hayda.

Carro onde jovens estavam quando foram mortos | Foto: Reprodução

Em entrevista à TV Tarobá, afiliada da TV Bandeirantes em Londrina, o advogado Eduardo Miléo, que defende os policiais militares envolvidos na ocorrência, diz que os PMs “agiram dentro da legalidade”. Miléo destacou que o carro era roubado e “muito possivelmente os três tenham sido os autores [do roubo]”.

O advogado ainda acusa os jovens de terem praticado outros crimes juntos porque o sobrevivente ao ataque de tiros da polícia não quis apresentar seu celular aos policiais civis que iniciaram a investigação do caso. “O que ele está escondendo? Acho muito possível que eles tenham feito outros roubos”, diz Miléo, sem apontar provas, na entrevista à TV Tarobá.

A morte de Willian e Anderbal jogou luz sobre a violência praticada por policiais militares do Paraná em Londrina, sobretudo contra jovens, e familiares passaram a se organizar, com apoio de entidades de direitos humanos, para ir às ruas pedir por respostas. As mães de Willian e Anderbal também criaram um perfil no Instagram para alcançar mais familiares de vítimas.

No último dia 15, Hayda, Valdirene e outros familiares de vítimas da PM paranaense se organizaram em uma manifestação da zona norte de Londrina. Uma das organizadoras do ato foi Marilene Ferraz da Silva Santos, mãe do adolescente Davi Gregório Ferraz dos Santos, de apenas 15 anos, que foi morto por policiais militares.

A Polícia Militar afirma que o adolescente foi morto em um confronto com os agentes, no dia 15 de junho — um mês antes do protesto. Familiares, no entanto, acreditam que a versão oficial é falsa, pois o menino não tinha nenhum histórico de violência ou qualquer tipo de envolvimento com crime. Segundo a mãe, o menino estaria fumando, e pode ter se assustado com a chegada da PM e tentado correr, quando foi baleado.

Ajude a Ponte!

Também estiveram no ato os familiares de Fábio Brateck, que foi morto no dia 15 de março deste ano, após a PM ser acionada para atender uma ocorrência violência doméstica envolvendo o irmão e a cunhada dele. “Foram atrás de uma pessoa, e mataram meu marido por confundir”, conta Ana Caroline Mariz, de 27 anos, esposa de Brateck. Ela afirma que o marido foi baleado duas vezes pelas costas, mas a polícia diz que houve confronto.

A Ponte questionou a Secretaria de Segurança Pública do Paraná, mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem.

Já que Tamo junto até aqui…

Que tal entrar de vez para o time da Ponte? Você sabe que o nosso trabalho incomoda muita gente. Não por acaso, somos vítimas constantes de ataques, que já até colocaram o nosso site fora do ar. Justamente por isso nunca fez tanto sentido pedir ajuda para quem tá junto, pra quem defende a Ponte e a luta por justiça: você.

Com o Tamo Junto, você ajuda a manter a Ponte de pé com uma contribuição mensal ou anual. Também passa a participar ativamente do dia a dia do jornal, com acesso aos bastidores da nossa redação e matérias como a que você acabou de ler. Acesse: ponte.colabore.com/tamojunto.

Todo jornalismo tem um lado. Ajude quem está do seu.

Ajude

mais lidas