Justiça cobra laudo de jovem acusado por PM de se matar algemado

     Jovem estava preso e algemado na viatura quando morreu. Primeira perícia argumenta que “habilidades de movimento” e “condição pessoal de burlar a revista” possibilitaram suicídio

    A Justiça de São Paulo determinou que o perito-chefe do Instituto de Criminalística de Limeira entregue cópias dos laudos feitos pela instituição para descobrir as circunstâncias da morte de José Guilherme Silva, ocorrida dentro de uma viatura da Polícia Militar em Limeira, a 145 km da capital paulista. Ele tinha 20 anos. Os trabalhos da perícia começaram a ser feitos no dia 20 de março. Seis meses depois, os resultados ainda não foram revelados. A ordem é que o documento seja entregue à advogada da família de José Guilherme.

    O caso vai completar um ano no mês que vem. Aconteceu no dia 14 de setembro de 2013. José Guilherme participou de um assalto e em seguida fugiu de moto com um colega. Ambos foram abordados por policiais militares, que o identificaram como suspeito. Houve minuciosa revista até que a arma do crime fosse localizada nos arredores do local. Até aí, tudo ia bem.

    Os policiais afirmaram que José Guilherme, mesmo depois de revistado e algemado, havia conseguido se matar com um tiro na cabeça

    José Guilherme entrou no camburão. Estava desarmado, segundo acreditava a PM. Antes disso, ele havia sido algemado com as mãos para trás e colocado no chiqueirinho do carro, que saiu em disparada. Instantes depois, um disparo ocorreu dentro da viatura. Os policiais afirmaram que José Guilherme, mesmo depois de revistado e algemado, havia conseguido se matar com um tiro na cabeça.

    joseguilhermeA versão do suicídio vinha sendo engolida pelas instituições de Justiça e de Segurança Pública até que o caso foi divulgado no blog SP no Divã, em fevereiro. Os familiares de José Guilherme não se conformaram com a versão oficial e buscaram apoio de entidades de direitos humanos. No mesmo dia da divulgação da matéria, a Secretaria de Segurança Pública determinou que a perícia fosse refeita. Os trabalhos começaram em 20 de março.

    A primeira perícia havia produzido algumas pérolas.

    O modelo da algema possibilita relativa movimentação dos pulsos, optando esse técnico por não asseverar a possibilidade da vítima ter manuseado a arma algemado com as mãos para trás pois isso envolve um estudo personalíssimo do agente que encontra-se algemado e é sabido nos meios policiais tanto sobre a habilidade de movimento de alguns detidos, bem como sua condição pessoal de burlar a revista“, escreveu o perito.

    O fato de a arma do crime ter sido encontrada no banco da frente da viatura não chegou a ser apontado como um problema. Nem mesmo o fato de o tiro ter sido dado do lado direito da cabeça, sendo que José Guilherme era destro e estava algemado com as mãos cruzadas para trás. Faça o exercício e veja se é possível, leitor. Em compensação, foi chamada a atenção para o fato de o tiro ter sido dado a mais de 50 centímetros da cabeça da vítima. O perito foi claro em dizer que não podia chegar a nenhuma conclusão para o caso.

    Qual a relevância do tiro ter sido dado a mais de 50 centímetros? Os policiais só poderiam ter atirado de perto?

    Em oposição a possíveis critérios subjetivos que possam ser suscitados, nenhum elemento técnico que  possa sugerir a ocorrência de execução fora verificado. É de suma relevância que o disparo tenha ocorrido a distância mínima de 50 centímetros e muito aproximada e coincidente dos braços estendidos para trás e cabeça, mesmo que parcialmente fletidos para efetuar o disparo.”

    Qual a relevância do tiro ter sido dado a mais de 50 centímetros? Os policiais só poderiam ter atirado de perto?

    Em março, foi feita nova reconstituição do caso. Policiais que participaram da cena não conseguiram simular um tiro com a mão algemada para trás. A arma, pesada, caía das mãos deles antes que tentassem. A advogada Fernanda Felix, que defende a família de José Guilherme, confia que os novos resultados serão isentos. “Acredito que agora a perícia será bem feita. Vieram para cá excelentes profissionais para acompanhar o caso”, diz.

    Em nota, o Instituto de Criminalística afirmou que respeita a decisão judicial e que cumprirá o que for determinado. Informou que o acesso ao laudo é irrestrito aos advogados da família e tão logo esteja concluído estará a disposição na rede do IC.

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