PM mata jovem de 16 anos que saiu de casa para comprar pasta de dente em Fortaleza

Paulo Victor da Silva Oliveira, que sonhava em ser jogador de futebol, morreu a poucos metros de casa. Polícia fala em troca de tiros, mas vídeo desmente versão oficial

A Polícia Militar do Ceará interrompeu o sonho de Paulo Victor da Silva Oliveira de ser jogador de futebol. O jovem de 16 anos morreu com um disparo feito por um PM quando estava com amigos em uma pizzaria que fica a poucos metros de onde o rapaz morava, na noite do último domingo (24/7). A Secretaria de Segurança Pública do Ceará alega que o adolescente estava armado e trocou tiros com os agentes de segurança.

Câmeras de segurança que ficam na rua Oscar Benevides, no bairro do Mondubim, em Fortaleza, flagraram o momento em que Paulo Victor é atingido pelo tiro desmentem a versão dada pelo governo cearense. Nas imagens é possível ver dois homens correndo e entrando numa viela onde fica o estabelecimento comercial, pouco antes da chegada de uma viatura da polícia. A presença dos policiais faz com que as pessoas comecem a correr assustadas. Dentre elas, o jovem de 16 anos.

O único tiro dado em toda a ação acertou o peito Paulo Victor, que caiu no chão e prontamente foi cercado pelos policiais. O vídeo mostra quando os PMs levam o corpo do jovem para a viatura. Para o operador de loja Francisco Valteir da Silva Oliveira, 34, pai do rapaz assassinado, foi neste momento que os policiais começaram a procurar algo que pudesse incriminar o seu filho.

Paulo Victor da Silva Oliveira estava no 9º ano do ensino funtademental e tinha o sonho de ser jogador de futebol | Foto: Arquivo Pessoal

“Jogaram ele na parte de trás da viatura e ficaram dando voltas pelo bairro antes de levá-lo para o hospital. Com certeza estavam buscando alguma coisa para dizer que meu filho estava fazendo coisa errada. Meu filho sempre foi um menino bom que só pensava em jogar bola e depois de morte querem transformar ele em marginal”, desabafa Francisco.

A mãe de Paulo Victor, a auxiliar administrativa Ilana Maria Bezerra da da Silva, diz que na noite do domingo chegou a ouvir gritos dos vizinhos, mas não imaginava que o motivo teria sido a morte do próprio filho. “A gente mora perto da pizzaria onde ele estava e daqui deu para ouvir os gritos de um pessoal que não queria deixar que colocassem meu filho na viatura com medo do que os policiais pudessem fazer”.

“Quando eu cheguei no hospital eu vi os policiais que estavam envolvidos na morte do Paulo Victor lá. Eles tiraram os coletes e o nome que os identifica da farda. Eu ainda consegui ouvir de um deles que eles tinham feito merda. A versão que disseram é que houve troca de tiros, mas o vídeo mostra que não foi nada disso e também não há uma única marca de bala na viatura”, diz Francisco Valteir.

Apaixonado por futebol e o sonho de ser jogador

Em seu último dia de vida, Paulo Victor fez uma das coisas que mais gostava na vida, segundo a sua família: ir ao estádio do Castelão assistir ao jogo do Fortaleza, seu time do coração. Na volta, o estudante do 9º ano do ensino fundamental ficou com a família, até que o pai pediu para que ele fosse ao mercado para comprar um creme dental.

Quando retornava para casa, o rapaz encontrou alguns amigos que estavam na pizzaria e parou para tomar um açaí. Depois da chegada da Polícia Militar do Ceará ao local, Paulo Victor nunca mais voltou para casa.

“O Paulo Victor só pensava em futebol. Ele tinha o sonho de ser jogador. Fez teste em vários clubes aqui em Fortaleza, já tinha passado cinco meses em São Paulo fazendo peneiras em diversos times e ainda tinha esperança de ser aceito por algum”, conta o pai.

O jovem assassinado pela polícia era o mais velho dos três filhos do casal Francisco e Ilana. Segundo eles, a família está muito abalada desde o último domingo, principalmente os irmãos, que eram muito apegados ao estudante. “O meu outro menino tem nove anos e também adora jogar futebol por influência do Paulo Victor. Eles dormiam juntos e agora ele não para de perguntar pelo irmão. Eu fico dizendo que ele saiu e vai voltar em algum momento”, conta Francisco.

Além da família, vizinhos e amigos também estão revoltados e receosos com o que pode vir a acontecer após a morte do rapaz. Eles relatam que o bairro é tranquilo, mas temem que novos episódios como o que acabou com a vida de Paulo Victor voltem a ocorrer.

“A gente quer que a polícia militar expulse e puna quem fez isso com meu filho. Eu respeito muito a corporação e sei que ela é feita na sua maioria por pessoas de bem, mas quem matou o meu filho não pode ficar impune e tem que pagar pelo que fez. A PM está querendo proteger que matou o Paulo Victor e isso não pode acontecer”, desabafa Francisco Valteir. 

O que diz a polícia

A Ponte pediu, através de email, um posicionamento sobre a morte de Paulo Victor da Silva Oliveira para a Secretaria de Segurança Pública do Ceará, comandada pela goveradora Izolda Cela (PDT) e questionou se a Corregedoria da corporação abriu algum inquérito que investigue a atuação dos policiais no último domingo, mas até a publicação desta reportagem não obteve retorno.

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Ao site do Diário do Nordeste, a PM cearense se manifestou através de uma nota: “Conforme relatório policial, as equipes da 2ª Companhia do 21º Batalhão Policial Militar iniciaram diligências para checar a denúncia, quando foram surpreendidas com disparos de arma de fogo. Diante disso, os militares revidaram, em legítima defesa, segundo relato dos agentes que atenderam a ocorrência. Um adolescente de 16 anos, ferido durante a ocorrência, foi prontamente socorrido a uma unidade hospitalar, onde posteriormente foi a óbito”, afirma o comunicado da coporação.

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