‘Abusos de policiais aumentam clima de tensão’, diz Human Rights Watch

    ONG internacional divulga balanço anual destacando ilegalidades do braço armado do Estado brasileiro e incapacidade em investigar e evitar feminicídios

    Policiais militares atacam manifestantes antifascistas na Avenida Paulista, em 29/10/16 | Foto:Daniel Arroyo/Ponte

    A violência policial é protagonista do capítulo brasileiro do relatório anual de 2018 feito pela Human Rights Watch (HRW). Em seu balanço, a organização destaca abusos praticados por agentes do Estado como combustível para um clima de tensão ainda maior no país.

    O estudo tem como base números do Fórum Brasileiro de Segurança Pública de 2016, quando 437 policiais morreram no país. No mesmo ano, os representantes do braço armado provocaram a morte de 4.224 pessoas, 26% a mais do que em 2015.

    “A quantidade enorme de abusos cometidos por policiais aumenta o clima de tensão. No Brasil, há uma polícia que não protege a sociedade e não está protegida, em relação a equipamentos, na maioria dos casos”, analisa o pesquisador da HRW no Brasil, César Muñoz, um dos responsáveis pelo relatório.

    Um dos exemplos citados é o Rio de Janeiro, com a polícia que mais mata (1.035) e mais morre (134) no país. “No começo, as UPPs foram um sucesso, pois estabeleceram uma nova relação da PM com a comunidade. Isso em 2007. Com a crise das UPPS, se tem impunidade nos abusos praticados, corrupção e policiais que batem nos moradores. Quem confia em uma polícia abusiva?”, questiona Muñoz.

    A Human Rights Watch afirma que considera um retrocesso a lei 44/2016, sancionada pelo presidente Michel Temer (PMDB) no ano passado e que transfere à justiça comum o julgamento de crimes de militares praticados contra civis.

    Recentemente, a Polícia Militar de São Paulo se baseou nesta lei para investigar mortes decorrentes da atuação da PM, entrando na esfera das apurações sob responsabilidade da Polícia Civil. Esta possível brecha legal gera rusgas entre as duas corporações. A ONG não vê risco de o caso ocorrido em São Paulo ser repetido em outros estados brasileiros.

    Violência contra mulher

    Outro ponto destacado pela Human Rights Watch é a falta de capacidade das polícias e de políticas públicas para diminuir a violência doméstica e, consequentemente, evitar feminicídios. Os números são alarmantes. Segundo dados da ONG, o Brasil tem 4,4 casos de feminicídios por 100 mil habitantes, contra 3,8 do México, o segundo país neste ranking.

    “É uma verdadeira derrota para o Brasil. Há uma passividade com a violência praticada contra as mulheres, vítimas de 4,6 mil feminicídios no ano passado, 50% a mais do que em 2016”, revela Maria Laura Canineu, diretora da organização no Brasil.

    A maior crítica fica para a falta de investigação. De acordo com Maria Laura, uma delegada de Roraima, estado com maior número de feminicídios no país (11,4 mortes por 100 mil habitantes), citou 8,4 mil denúncias de violências arquivadas pois nenhuma investigação foi feita.

    “Nem o depoimento das mulheres [os policiais] souberam pegar corretamente para ir atrás de quem as violentou. Este é um crime que se pode prevenir com a investigação feita corretamente”, sustenta a diretora.

    Crise na Venezuela

    Paralelamente ao relatório do Brasil, a atual crise política e social da Venezuela teve citação pela alta taxa de migração. Apenas para o Brasil, foram feitos 13,6 mil pedidos de refúgio até outubro do ano passado. Este número foi 400% maior do que em 2016, com 3.368 pedidos.

    A escala vem em crescente desde 2010, quando houve quatro pedidos. Este número pulou para 55 em 2013, 209 um ano depois e para 829 em 2015. Segundo a ONG, cerca de 100 mil venezuelanos deixaram o país no ano passado.

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