Autoridades precisam entender o papel do Whatsapp na violência policial

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    Já passou da hora das autoridades de segurança pública brasileiras prestarem atenção no papel do Whatsapp no aumento da violência policial e nas articulações de vinganças por parte de integrantes da corporação.

    Chacinas em grande escala estão se reproduzindo em diferentes estados do Brasil, em boa parte dos casos sendo precedidas por trocas de mensagens nas redes sociais. O caso mais recente havia ocorrido em Manaus, quando 34 pessoas morreram entre os dias 17 e 20 de julho, sendo 23 delas na madrugada de sábado. A ação ocorreu depois da morte de um sargento durante um assalto. Na sexta-feira, depois do crime, mensagens de pessoas que se identificavam como policiais passaram a anunciar a vingança, pregando “caça à vagabundagem” e afirmando que “os caveiras vão trazer a senhora morte”.

    Em novembro do ano passado, em Belém do Pará, nove pessoas foram assassinadas depois de uma intensa troca de mensagens em redes sociais em que policiais diziam se articular para se vingar de um colega morto. Os nomes dos bairros onde os homicídios seriam praticados foram citados nas redes. Na madrugada, nove pessoas morreram e as fotos dos corpos passaram a ser compartilhadas das redes sociais.

    Em São Paulo, o ataque que deixou 19 mortos e sete feridos em Osasco, Barueri e Itapevi, chamou a atenção principalmente pela capacidade de articulação dos envolvidos. Aparentemente, eles agiram rapidamente, matando a todos ao longo de um par de horas. A autoria do crimes ainda está sendo investigada pelas autoridades.

    Casos suspeitos de vinganças ocorridas depois de mortes de policiais vem assombrando os moradores dos bairros mais pobres da cidade, onde se concentram estes crimes. Nas redes e canais de internet, alguns policiais defendem abertamente a truculência. Blogs com fotos de cadáveres que celebram a morte de suspeitos se mantêm faz anos no ar, sem que ninguém seja responsabilizado. Nas redes de whatsapp de policiais, endereços de suspeitos e fotografias são compartilhados.  Quando há mortes, há comemoração e divulgação das fotos do corpo.

    Em um dos casos, publicados na Ponte, ocorrida ano passado no Rio Pequeno, na cidade de São Paulo, quatro jovens foram mortos durante uma perseguição policial. Fotos foram tiradas na cena do crime, para depois serem repassadas pelo whatsapp aos parentes e amigos das vítimas. A defensoria pública apontou os policiais como principais suspeitos da ação.

    A capacidade de articulação proporcionada pela tecnologia, ao mesmo tempo em que estimula a celebração de um narcisismo macabro entre policiais, é uma das hipóteses para explicar o recorde de violência neste semestre e no ano passado nos casos de homicídios decorrentes de intervenção policial. Em 2014, foram 806 casos, mais do que em 2006 (608) e 2012 (715), anos de intensos conflitos entre policiais e integrantes do PCC. No primeiro semestre deste ano, policiais mataram 413 pessoas, 74 a mais do que no mesmo período do ano passado.

    Este semestre houve queda de roubos. E os homicídios no Estado caem há 14 anos. Por que a violência policial continuou a crescer? A celebração e o incentivo das mortes nas redes da polícia é uma hipótese nada desprezível.

    O padrão de vinganças como respostas a ataques policiais não chega a ser novidade. Foi uma vingança que marcou o começo do Esquadrão da Morte, em 1968,  quando o investigador Davi Parré foi assassinado. Policiais liderados pelo delegado Sérgio Paranhos Fleury prometeram no enterro do investigador matar “dez bandidos” para cada autoridade morta.

    Casos isolados vieram se repetindo desde então, em quase cinco décadas de violência policial. Em 2006, contudo, mais do que nunca, a vingança parece ter se tornado um padrão entre integrantes da corporação. Depois dos atentados praticados pelo PCC, em maio de 2006, quando 59 agentes do estado foram mortos, uma intensa quantidade de homicídios passou a ocorrer no estado ao longo de 7 dias, quando morreram 505 civis. O extermínio passou a resposta para casos de violência contra policiais.

    Chacinas voltaram a ocorrer em 2012 e em 2014, aparentemente em respostas a homicídios de policiais ordenados pelo PCC ou ocorridos em crimes comuns. Nos dias seguinte a casos com vítimas policiais, carros e motos assombravam os arredores com assassinatos de moradores locais. O whatsapp veio colocar combustível nessa engrenagem de vinganças. A tecnologia, ironicamente, passou assim a acelerar o retrocesso de uma civilização que as instituições democráticas, como  Polícia e Justiça, deveriam proteger. 

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