Após a prefeitura desmontar barracos na Luz, no centro de São Paulo, moradores entraram em confronto com guardas civis e policiais militares
Baltimore é aqui! Em alusão aos acontecimentos na cidade norte-americana após a morte de um jovem negro por um policial, os moradores do entorno da Estação Júlio Prestes, na Luz, conhecida como Cracolândia, escreveram a frase em cartazes e pedaços de madeira, após terem sido reprimidos por policiais militares e guardas civis nesta quarta-feira (29/4). A ação deixou aos menos três feridos: dois moradores e um policial militar.
Diferente dos manifestantes dos EUA, os daqui, moradores de barracas de lonas montadas em ruas e alamedas dos Campos Elísios e, em sua maioria dependentes do crack, não saquearam lojas, mas foram e continuam a ser agredidos, segundo relatos de ativistas em defesa dos direitos humanos.
A ação começou pela manhã, quando o prefeito Fernando Haddad (PT) foi até o local para lançar uma nova fase do Programa Braços Abertos, que oferece moradia em hotéis da região e pagamento de R$ 15 por dia para quem presta serviços, como limpeza. Ali, agentes da prefeitura e da Guarda Civil Metropolitana (GCM) desmontaram algumas barracas.
Segundo relato do Padre Julio Lancelotti, da Pastoral do Povo de Rua, e de militantes de organizações sociais que atuam na Cracolândia, a confusão teria começado assim que Haddad e seu secretariado deixaram o local. “Depois que as barracas foram retiradas, os usuários foram para a Alameda Dino Bueno. Lá, um policial civil estava filmando os dependentes, que se sentiram desconfortáveis e foram cobrar o por quê. Quando ele (o policial) ficou pressionado pelos moradores, sacou a arma de fogo e deu um tiro na garganta de um morador”, disse o padre à Ponte.
A Secretaria de Segurança Pública tem outra versão para os acontecimentos. De acordo com a pasta, “a Prefeitura de São Paulo não comunicou previamente as polícias de que faria nesta quarta-feira (29) a retirada das barracas e carroças da região da Nova Luz. O que estava acertado era o apoio policial para cadastramento dos dependentes químicos”.
O órgão estadual, subordinado ao governador Geraldo Alckmin (PSDB), e chefe imediato da Polícia Militar, chefiado pela secretário Alexandre de Moraes, deu a seguinte versão sobre como as três vítimas teriam se ferido: “Durante a ação, dois policiais militares que estavam no local passaram a ser agredidos por diversos moradores de rua, tendo um deles sido agredido com uma barra de ferro na cabeça. Para desfazer o grupo atacante e cessar as agressões, o segundo policial efetuou um disparo para o chão, que acabou ricocheteando. Os estilhaços atingiram duas pessoas de maneira superficial. Uma na perna e outra no pescoço. Somente houve a necessidade de atendimento médico de um dos atingidos, onde se confirmou o ferimento superficial. O policial sofreu diversos ferimentos e se encontra internado.”
O homem ferido no pescoço prestaria serviços aos dependentes químicos, como corte de cabelo e outras ações sociais, e foi identificado como Marcos Alexandre Rodrigues.
Durante a noite, houve mais confrontos e correria pela ruas do bairro da Luz. A repressão, na maioria das vezes, se deu com o uso de bombas de efeito moral, que, além do barulho e fumaça, podem desprender estilhaços. Segundo a SSP, o local recebeu reforço policial após ataque contra a guarda civil. “À tarde, dependentes químicos tentaram invadir um terreno da Prefeitura. A GCM solicitou apoiou da PM, que agiu com os meios necessários para conter a ação”, finaliza a pasta.
Durante o conflito, moradores fizeram barricadas de fogo com materiais como panos e madeira na via, no entorno da Alameda Dino Bueno com Alameda Glete. O fogo foi apagado com a chegada do Corpo de Bombeiros.
Procurada, por intermédio da Secretaria Municipal de Segurança Urbana (SMSU), responsável pela GCM, a prefeitura não respondeu.
A reportagem procurou a Santa Casa, Pronto-Socorro para onde os feridos teriam sido encaminhados, mas também não obteve resposta.
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