Ações da PM são marcadas por violência e abuso de autoridade: de manhã, policiais sem identificação usam spray de pimenta dentro de uma escola ocupada; à noite, o Choque e bombas de gás lacrimogêneo dispersam manifestação pacífica na mesma região
Um protesto pacífico na noite desta terça-feira (1) na avenida Nove de Julho, centro de São Paulo, terminou com 4 estudantes detidos – dois deles menores de idade. A maior parte dos manifestantes veio das escolas Estaduais Caetano de Campos e Fernão Dias Paes, duas das mais de 200 escolas ocupadas em todo o estado para pressionar o Governo Alckmin a desistir da reestruturação da rede estadual de ensino. A medida imposta pelo governo do Estado de São Paulo, publicada hoje no Diário Oficial, prevê o fechamento de ciclos em mais de 90 instituições. Desde a semana passada, estudantes envolvidos nos protestos têm denunciado em páginas do Facebook (O mal educado, Território Livre, Não fechem minha escola e as páginas criadas por cada ocupação) os abusos da polícia militar. A passeata bloqueava o trânsito, mas era pacífica. O Choque da PM foi chamado por volta das 21h e dispersou os estudantes com bombas de gás lacrimogêno. Uma estudante detida com uma cadeira escolar foi acusada de depredar o patrimônio público e de participar de manifestação. Ela e outras três pessoas foram levadas ao 78º D.P., onde foi registrada a ocorrência. Mas a repressão violenta contra as mobilizações começou bem mais cedo.
No final da manhã, um grupo de pais de alunos da Escola Estadual Maria José, o diretor da instituição e dezenas de policiais militares foram até o local e com marretas, quebraram cadeados e portões e entraram na unidade. Os ocupantes argumentaram que não havia nenhum documento pedindo a reintegração de posse, mas foram ignorados. O diretor da escola, Vladimir Fragnan, deu um tapa na cara da aluna Lilith, que cursa o primeiro ano do ensino médio. Os alunos se revoltaram e a polícia jogou spray de pimenta no rosto de alguns. Já caídos, alguns foram atingidos por mais spray. Acompanhada da mãe, a aluna foi até o 4º D.P. fazer o registro da ocorrência. Conhecida como Mazé, a E.E. Maria José, localizada na Rua Treze de Maio, no Bixiga, região central de São Paulo, está ocupada desde a semana passada.
Na comunidade da ocupação no Facebook, estudantes relatam que a estratégia dos invasores foi feita numa assembléia realizada na segunda-feira (30) na igreja católica da Achiropita, que reuniu pais e funcionários da escola que são contrários ao movimento. A PM chegou na porta da frente da escola fazendo a escolta do diretor e, enquanto distraía os alunos da ocupação, um grupo de pais estourou os portões com marretas e barra de ferro e entrou por trás da escola. Ainda nos relatos, a Polícia Militar jogou spray de pimenta diretamente nos olhos de alguns alunos, bomba de efeito moral, além de ameaças verbais. Alguns vídeos feitos por alunos no momento da invasão e postados na página mostram as cenas de violência e abuso de autoridade. Após o quebra-quebra, os alunos resistiram e, reunidos no pátio da escola, recuperaram a ocupação. Procurada pela Ponte Jornalismo, a SSP (Secretaria da Segurança Pública), que tem à frente Alexandre de Moraes nesta quarta gestão do governador Geraldo Alckmin (PSDB), não informou se a ação foi orientada por alguém da pasta e nem os abusos denunciados pelos estudantes.
Intimidação
A Escola Estadual João XXIII também tinha entrado no movimento de ocupações na segunda-feira da semana passada, que acabou sendo desarticulado na quarta-feira pela própria comunidade escolar. Ainda assim, nos dois dias em que a ocupação durou, alunos contaram à reportagem da Ponte Jornalismo que sofreram pressão e intimidações de policiais militares da região.
A escola fica localizada longe do centro, no Jardim Raposo Tavares. Uma estudante que pediu para ser identificada apenas como Carol contou que policiais militares ficavam rondando a escola e que o clima era de muito tensão. “Alguns estudantes estavam no portão cuidando da entrada das pessoas, quando uma dessas viaturas parou na frente da escola e começou a fotografar sem parar. Era uma PM mulher e ela não estava fotografando muros ou cartazes, ela estava claramente fotografando a cara dos meninos e meninas que estavam no portão. Eles fizeram vídeos nossos também”.
Em seguida, foram conversar com o casal de zeladores que vive ao lado da escola. Mais tarde, um outro policial militar voltou à escola e começou a perguntar para os estudantes quantas pessoas estavam na ocupação, se havia algum maior de idade responsável e pediu a identificação de alguns. Carol conta que, nesse momento, questionou a necessidade de o policial fazer isso. “Ele disse que estavam fazendo um relatório e que essas informações iriam para esse documento, mas não faz sentido. Que relatório é esse? Qual o uso disso?”, disse a estudante. A Ponte Jornalismo questionou a ação à Secretaria da Segurança Pública há seis dias e até o momento não foi atendida.