Vítima de homofobia vive com medo e a base de calmantes após ser agredido. Há duas semanas, uma trans também foi espancada na capital paulista
O estudante Lucas Salvattore, 18 anos, tem raiva: “Espero que a justiça seja feita, espero que mais gays abram a boca e não deixem passar esse tipo de covardia”. Mas na mesma proporção sente medo. Desde a semana passada, quando foi vítima de agressões de um grupo de cinco pessoas quando saía da aula na Escola Estadual Lurdes Maria de Camargo, em São José dos Campos, interior de São Paulo, ele não consegue sair de casa: “Tenho medo que aconteça de novo. Estou dormindo a base de calmantes”, diz.
Gay assumido, logo no primeiro dia de aula, Lucas foi vítima de chacota por um colega e foi reclamar para a coordenação da escola, que responsabilizou o jovem pelas ofensas e decidiu mudá-lo de sala. Não adiantou. As ameaças continuaram acontecendo e, na segunda-feira, dia 22 de fevereiro, um dos agressores chegou a dizer que iria matá-lo. Com pedaços de pau, cinco adolescentes esperaram Lucas na saída e tentaram cumprir o que tinham dito.
“Na hora você não pensa nada, eu só tentava me defender do jeito que podia”, conta o estudante, que recebeu a ajuda do namorado de uma amiga. Lucas teve ferimentos no supercílio e ainda não consegue enxergar direito com o olho esquerdo. O agressor foi expulso, mas os outros acusados não são alunos da escola. Os outros suspeitos, que têm entre 14 e 16 anos, foram identificados pela Polícia Civil e devem responder por ato infracional.
Para o militante LGBT e um dos organizadores da Parada Gay, Agripino Magalhães, o que faltou nesse caso foi uma punição do responsável pelo estudante agressor. “A escola deveria ter chamado os pais do adolescente que promoveu o espancamento e também responsabilizar. É revoltante, porque eu acho que as pessoas só acreditam que existe violência motivada por homofobia quando acontece. Tem que parar com isso. Existe sim”, afirma.
Dados do Grupo Gay da Bahia indicam que no ano passado, 318 pessoas morreram por homofobia. Para Agripino, enquanto não houver uma lei que tipifique detalhadamente o crime de gênero, não há perspectivas de melhora: “É claro que essa questão passa pela educação, por mostrar para as pessoas que a diversidade existe e tudo mais. Mas a falta de uma lei severa, também atrapalha o processo. Esse caso do garoto da escola, por exemplo. Se alguém responder por alguma coisa, será no máximo lesão corporal. E não vão presos. Pode apostar”, pontuou.
“Achei que dali não sairia viva”
Há 15 dias, a trans Melissa Hudson foi espancada por um grupo de 15 pessoas quando voltava de uma festa na rua Augusta. “Eu moro na Fernando de Albuquerque e estava subindo a rua quando jogaram uma garrafa na minha cabeça. Eu parei para olhar e um grupo me cercou. Achei que fosse morrer”, conta. Um rapaz que estava na outra calçada atravessou e conseguiu tirar Melissa do meio do grupo de agressores.
Ela chamou a polícia militar que atendeu a ocorrência e levou a maquiadora para ser atendida no Hospital Santa Catarina, na avenida Paulista. Melissa assumiu a transexualidade há pouco mais de dois anos e nunca tinha sofrido nenhum esse tipo de situação. No dia seguinte, foi fazer um boletim de ocorrência no 78º D.P., mas não conseguir identificar nenhum dos agressores e, até o momento, ninguém foi punido.
Os dados sobre violência motivada por homofobia são desatualizados, mas o 3º relatório divulgado pelo Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos na sexta-feira, dia 26, mostra que 5 pessoas sofrem algum tipo de agressão por dia. O estudo é referente aos dados de 2013, quando foram registradas 1.965 denúncias de 3.398 violações relacionadas à população LGBT, envolvendo 1.906 vítimas e 2.461 suspeitos.