Juiz manda soltar fotógrafa detida em operação contra pichação em trens do Metrô e CPTM

Magistrado argumentou que manter Carla Arakaki em liberdade não prejudica andamento das investigações; Polícia Civil prendeu ao menos seis pessoas nesta quinta-feira (23)

Latas de tinta spray foram apreendidas durante cumprimento de mandados de busca e apreensão pela Polícia Civil nesta quinta-feira (23/12) | Foto: Jeniffer Mendonça/Ponte Jornalismo

O Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu liberdade à fotógrafa Carla Arakaki nesta sexta-feira (24/12). Ela havia sido presa temporariamente (por cinco dias), no dia anterior, com outras cinco pessoas em operação da Polícia Civil que investiga pichações em trens do Metrô e da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos).

O juiz Aléssio Martins Gonçalves acatou a solicitação da defesa da jovem e entendeu que estavam “ausentes, ao menos por ora, indícios de que [ela] pretende se ausentar do distrito da culpa ou, até mesmo, que tenha intenção de embaraçar as investigações criminais, sendo certo ainda que já prestou depoimento e sua prisão não contribuirá em nada para a elucidação dos fatos”.

O alvará de soltura ainda não foi expedido, mas a fotógrafa deve deixar o 89º DP (Portal do Morumbi) ainda nesta sexta-feira (24). Para Augusto de Arruda Botelho, cujo escritório a representa, “justiça foi feita”. “A prisão antes de uma sentença condenatória definitiva é sempre excepcional. A decisão que revogou a prisão de Carla Arakaki diz exatamente o que o texto da lei deixou expresso: se a prisão provisória não é absolutamente necessária ela não tem razão de existir”, declarou.

A Ponte questionou o Tribunal de Justiça se houve a revogação de prisão dos outros investigados e aguarda uma resposta.

Operação 163

A Polícia Civil de São Paulo realizou uma operação na manhã de quinta-feira (23/12) para cumprir nove mandados de prisão e de 25 de busca e apreensão por pichações em trens do Metrô e da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos). A corporação moveu 140 agentes, com apoio de 47 viaturas, em uma operação intitulada “163”, como referência ao artigo do Código Penal para o crime de dano, na capital, na região metropolitana e no interior paulista.

Os crimes atribuídos são de dano qualificado (detenção, de seis meses a três anos, e multa, além da pena correspondente à violência), perigo de desastre ferroviário (reclusão, de dois a cinco anos, e multa), atentado contra a segurança de serviço de utilidade pública (reclusão, de um a cinco anos, e multa) e associação criminosa (quando três ou mais se unem para praticar crime – reclusão de um a três anos).

O delegado Rodrigo Corrêa Baptista, da Delpom (Delegacia de Polícia do Metropolitano), pediu as prisões da fotógrafa Carla Nagamatsu Arakaki, dos pichadores e irmãos Heron e Conrado Marum Chati Ramos, que formam a dupla Skola, Theodoro Eduardo Haar de Souza, Fábio Cezarino de Souza Novaes Teixeira, Luca de Oliveira Beting, Raoni Fontinele de Moura, Raul Jooken Henna Baptista e Raphael Nascimento Barcelos, conhecido como Gueto. Ao menos seis haviam sido detidos.

Na Delpom, advogados de alguns dos detidos que foram localizados repudiaram as prisões e argumentaram que não havia necessidade do encarceramento e que os investigados poderiam ter sido intimados para prestar depoimento.

O caso se desdobrou de um episódio de pichação que aconteceu em 21 de agosto, com dois trens da estação Oratório da linha 15 – Prata do Metrô, na região do estacionamento das composições cujo portão teria tido o cadeado quebrado. Havia inscrições com a tag “#UNIO” nos vagões. Um vigilante viu quatro pessoas, que fugiram num carro Cherry vermelho e conseguiu anotar a placa e ainda perseguí-los, sendo que o motorista, quando foi parado por esse vigilante em um carro, negou ter pichado o trem. A Polícia Militar foi acionada, mas fugiram. O Cherry foi identificado como da irmã de Vinicius Alcides de Almeida. Naquela mesma madrugada, ele havia feito um boletim de ocorrência informando que conduzia o veículo nas imediações e que havia sido perseguido por um “carro branco” que tinha “torcedores do Palmeiras”. O veículo também já havia sido usado em 2017 por ele para pichação, conforme boletim de ocorrência da época.

Em setembro, a Polícia Civil pediu e o Tribunal de Justiça concedeu um mandado de prisão e de busca e apreensão na casa de Vinícius. Foram apreendidos na ocasião capacetes de proteção, cartazes, fotografias, além de 38 latas de tintas spray, seis telas para impressão método silk-screen com a tag “XIU”, respirador, máscara, rolos para pintura, pulverizadores, garrafas e tintas. O homem foi reconhecido pelo vigilante como um dos pichadores. O delegado também pediu a quebra do sigilo telefônico e telemático de HD, computadores e telefones apreendidos, o que foi concedido pela Justiça.

Foram essas informações, segundo o delegado, que fez com que os nove fossem identificados. Na descrição do relatório da investigação feito na decisão que autorizou as prisões, a juíza Thais Fortunato Bim aponta que “o HD externo analisado exibe verdadeiro catálogo de ações criminosas de Vinicius com seus asseclas que: em eventos diversos e estações distintas, sempre agindo em concurso de agentes, adentravam nas estações do Metrô e CPTM para picharem trens de transporte de passageiros” e que o material “é produto de edição de imagens realizada por pessoa capacitada, por vezes contando com habilidade técnica e avançado aparato material tecnológico (câmeras e lentes de qualidade)”.

A magistrada cita que as operadoras de transporte nos trilhos informaram que de meados de 2018 até 17 de dezembro deste ano, quando redigiu a decisão, foram 76 trens pichados e que a autoria recai sobre o grupo por causa do “modus operandi”. Além de que o material apreendido informaria atuação do grupo em sete estações do Metrô e nove da CPTM. Vinicius ainda teria dado uma entrevista ai vivo a um perfil no Instagram em agosto falando sobre sua atuação como pichador e que a Polícia Civil identificou atuação do grupo em ao menos cinco incidentes de pichação em trens entre 2018 e 2019.

Ela afirma ainda que Carla e Raphael recebem pessoas de outros países para um “intercâmbio de pixo ferroviário”. O documento diz que Carla “representa figura de alta importância no mundo do Pixo” por ser fotógrafa profissional e registrar a atuação dos pichadores. A Polícia Civil descreve o grupo como “quadrilha de pichadores”. O delegado Rodrigo Baptista disse que também foi feito monitoramento de redes sociais, já que outros investigados nesse inquérito foram identificados pelo material audiovisual.

A juíza determinou a prisão temporária (por cinco dias, prorrogáveis) para o “regular andamento das investigações” e por entender haver “gravidade dos crimes praticados”. O processo segue em segredo de justiça.

Ponte questionou, na Delpom, ao delegado titular sobre a necessidade da prisão, conforme haviam pontuado os advogados dos detidos. “Isso é análise deles, o promotor e o juiz corroboraram a nossa ação, então a investigação partiu da gente e pedimos a prisão, respeito a tese da defesa, mas eles [os nove] têm que ser responsabilizados, são crimes graves, estão interrompendo o serviço público, podem provocar acidente, prejudicar a vida deles mesmos porque o sistema é todo eletrificado e uma pessoa pode morrer ali, o sistema inteiro para”, declarou Rodrigo Baptista. “A pichação é o plano de fundo, mas existe todo um enredo que caracterizam outras infrações, de crimes mais graves”.

Com relação à fotógrafa, alegou que ela também participou das pichações. “Ela tem rede social, a gente estava monitorando ela, ela divulga, tem canal no YouTube, mostra que está na cena da pichação, ela propicia muito destaque para esse pessoal e sempre está na cena”. Questionado sobre o registro não ser crime, disse que “tem vídeo que ela está pichando, mas a maioria ela não está, então alguns eventos ela não cometeu crime de dano, mas estava em outras ações onde tem o crime de interrupção do serviço ferroviário, auxiliando a ação, e a lei pune o partícipe que induz, auxilia ou pratica o crime porque ela está auxiliando e divulgando”.

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A assessoria da Secretaria da Segurança Pública publicou uma nota em que informou que “foram apreendidas 953 latas de tinta spray, além de uniformes de funcionários das companhias de transporte, que seriam utilizados durante as ações criminosas, celulares, notebooks, HDs e outros materiais de pichação, como pinceis e latas de tintas”.

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