Medo impera em comunidade de Contagem (MG) após PM matar morador

Vizinhos da Vila Barraginha denunciam que Marcos Vinícius Vieira Couto foi morto por dívidas com policiais. Dois homens teriam sidos assassinados pelo mesmo motivo em junho

Marcos Vinícius Vieira Couto foi morto pela Polícia Militar de Minas Gerais no sábado (16/7) | Foto: Repreodução: Redes Sociais

Quando uma viatura da Polícia Militar de Minas Gerais corta as estreitas ruas da Vila Barraginha, periferia do município de Contagem, região metropolitana de Belo Horizonte (MG), os moradores do local ficam aflitos. Nos últimos meses, eles nunca sabem se a presença dos agentes de segurança é apenas uma patrulha de rotina ou mais um momento de tensão.

No último sábado (16/7), o bairro foi o cenário da morte de Marcos Vinícius Vieira Couto, 29 anos, baleado com três tiros pelo sargento PM Rodrigo Figueiredo Gomes. Imagens mostram o momento que o homem é abordado e levado para atrás de um veículo onde é feito o disparo. Segundo moradores, não é a primeira vez que policiais mataram moradores na Vila Barraginha este ano.

“No dia que o Marcos Vinícius morreu estava completando exatos 30 dias que policiais mataram na comunidade dois jovens conhecidos como Pateta e Zói. O motivo teria sido o mesmo pelo qual mataram o Marcos, o não pagamento do arrego para os PMs”, afirma a estudante de direito Miriam Estefânia dos Santos, que mora na região e é presidente da Associação de Amigos e Familiares de em Privação de Liberdade em Minas Gerais.

Um comerciante de 66 anos, que reside há 46 na comunidade e prefere não se identificar com medo de represálias, diz que a extorsão policial é uma realidade que os moradores passaram a conviver, pelo menos, nos últimos dois anos. Segundo ele, a cobrança indevida teve início contra os traficantes locais, mas acabou se estendendo por todo o comércio.

“Essas mortes aconteceram por dívidas dos rapazes com os policiais. Eles vem sempre por aqui e cobram das pessoas que vendem drogas, de quem tem um pequeno comércio e ficam fazendo uma série de ameaças a quem cogita não dar o que eles querem”, relata o comerciante.

Festa, desentendimento e morte

Era para ser um sábado de alegria na periferia de Contagem. Os moradores se organizaram para realização de uma festa julina, com comidas típicas, música e confraternização entre vizinhos. Testemunhas afirmam que tudo estava bem, Marcos e amigos teriam bebido, mas nada fora do normal para um evento entre pessoas conhecidas.

“Houve uma briga entre o Marcos e outro morador que estaria se vangloriando por ter estuprado uma menina de 14 anos. O Marcos não gostou daquilo. Ele teria tomado a arma que estava com esse homem, dado uma coronhada nele e mandado ele embora. Teria sido a família desse rapaz que chamou a polícia ao local”, conta Miriam Estefânia.

“Assim que a polícia chega, o Marcos coloca a mão na cabeça, levanta blusa e se vira para mostrar aos policiais que não estava armado. Os policiais queriam levar ele para um beco e as pessoas que estavam presentes nesse momento disseram que ele começou a gritar dizendo que não iria para o beco porque os policiais iriam matá-lo lá”, continua Míriam.

Na versão da Polícia Militar de Minas Gerais, Marcos Vinícius, após ser levado para de trás do carro, teria tentado tirar a arma das mãos do policial, que reagiu efetuando os disparos. Segundo a porta-voz da PM mineira Layla Brunella, “não houve excessos durante a abordagem policial”. A corporação também fez questão de enfatizar que Marcos tinha um histórico extenso de passagens pela polícia.

Para além dos boletins de ocorrência

Os vizinhos tinham Marcos Vinícius como um rapaz tranquilo e prestativo para a comunidade. O comerciante que prefere não se identificar diz que conheceu o homem morto pela polícia desde quando era criança e relata que ele era querido por todos do bairro.

“Era um pai exemplar. A gente sabia que ele mexia com essas coisas de drogas, mas nunca fez mal a ninguém daqui. Todo mundo gostava dele e ele fazia questão de cumprimentar todo mundo aqui”, relembra. Na última terça-feira (19/7), moradores da Vila Barraginha fizeram um protesto no local pedindo Justiça pela morte de Marcos Vinícius.

“O que todos na comunidade querem deixar muito claro é que ninguém está defendendo bandido, mas que se ele estivesse fazendo algo errado, que fosse algemado e levado para uma delegacia para que as providências devidas fossem tomadas. O que não pode é o absurdo que aconteceu de uma pessoa ser executada pela polícia na frente de toda uma comunidade”, diz Míriam Estefânia.

“Eu conheço muitas pessoas que conviveram com o Marcos e nunca ouvi ninguém falar nada que desabonasse a sua conduta. É de conhecimento de todos que ele tinha se envolvido no tráfico, mas pelo que as pessoas da família e as mais próximas a ele afirmam é que ele estava afastado do tráfico e tentando reerguer uma nova vida, justamente por estar sendo ameaçado pela polícia nos últimos três meses”, conclui Míriam.

Policial não foi punido

O sargento Rodrigo Figueiredo Gomes chegou a ser detido no 39º Batalhão de Contagem um dia após a morte de Marcos Vinícius, mas ganhou a liberdade na segunda-feira (18/7) após um alvará de soltura expedido pela Justiça Militar de Minas Gerais. O juiz João Libério da Cunha alegou que ação do policial foi feita dentro da legalidade.

Ajude a Ponte!

Em nota enviada à Ponte, a Polícia Militar de Minas Gerais confirma que o Sargento Gomes permanece atuando normalmente nas ruas. “A unidade da Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG) responsável pela região que fica localizada na Vila Barraginha, em Contagem, atua normalmente com ações e operações de rotina e atendimento à comunidade. O militar em questão, voltou a exercer suas atividades rotineiras no batalhão em que é lotado”, diz o comunicado.

Já que Tamo junto até aqui…

Que tal entrar de vez para o time da Ponte? Você sabe que o nosso trabalho incomoda muita gente. Não por acaso, somos vítimas constantes de ataques, que já até colocaram o nosso site fora do ar. Justamente por isso nunca fez tanto sentido pedir ajuda para quem tá junto, pra quem defende a Ponte e a luta por justiça: você.

Com o Tamo Junto, você ajuda a manter a Ponte de pé com uma contribuição mensal ou anual. Também passa a participar ativamente do dia a dia do jornal, com acesso aos bastidores da nossa redação e matérias como a que você acabou de ler. Acesse: ponte.colabore.com/tamojunto.

Todo jornalismo tem um lado. Ajude quem está do seu.

Ajude

mais lidas