Indígenas protestam contra o Marco Temporal no Pico do Jaraguá

    Em manifestação neste domingo (4/6), centenas subiram até o ponto mais alto da cidade de São Paulo para protestar contra lei aprovada na Câmara que prejudica povos originários

    Indígenas no topo do Pico do Jaraguá em São Paulo, durante Protesto Contra o Marco Temporal | Foto: Daniel Arroyo/Ponte Jornalismo

    Neste início de manhã de domingo (4/6), centenas de pessoas se concentroram na Terra Indígena do Jaraguá, localizada na Zona Norte de São Paulo. Ao longo do dia, o grupo, que foi aumentando, realizou uma manifestação contra o PL (Projeto de Lei) do Marco Temporal, subindo o Pico do Jaraguá, o ponto mais alto da capital paulista.

    O PL propõe que apenas terras indígenas ocupadas antes da promulgação da atual constituição brasileira, 5 de outubro de 1988, possam ser demarcadas como terras indígenas. A tese é defendida pela bancada ruralista no Congresso Nacional, e seu efeito prático pode levar a despejos e tornar muito mais difícil a povos originários conseguir seus direitos sobre a terra.

    Ele foi aprovado na Câmara dos Deputados na última terça-feira (30/5), e agora se encontra no Senado. Nesta semana, o Supremo Tribunal Federal deve também avaliar sua constitucionalidade, que é contestada.

    Viaturas da PM foram posicionadas na Rodovia dos Bandeirantes, no Jaraguá, para agir caso manifestantes seguissem do território indígena para ocupar a via. Uma decisão judicial no último sábado (3/6) proibiu que a manifestação bloqueasse a via.

    Viaturas na Rodovia dos Bandeirates no protesto contra o Marco Temporal na Terra Indígena do Jaraguá
    Viaturas na Rodovia dos Bandeirates no protesto contra o Marco Temporal na Terra Indígena do Jaraguá | Imagem: Kaique Dalapola/Ponte Jornalismo

    Ainda na concentração, lideranças indígenas receberam políticos do Poder Legislativo, advogados e representantes da Polícia Militar para pedir o fim da violência contra os povos originários e a demarcação do território. Além disso, os indígenas gostariam de dar continuidade à manifestação iniciada na última terça-feira, que seria marcada por uma reza na Rodovia dos Bandeirantes, mas foi interrompida pela violência policial.

    Entre as autoridades também estava o ouvidor das polícias de SP, Cláudio da Silva, que conversou com a liderança indígena Karai Djekupe e se comprometeu a mediar o diálogo entre manifestantes e Polícia Militar. Cláudio afirmou que o objetivo foi que os povos originários não sofram novamente violência da PM, como aconteceu em outro protesto, no dia da votação.

    Durante a reunião entre as lideranças indígenas e as autoridades, que durou cerca de duas horas, ficou decidido que o grupo não ocuparia a rodovia que fica à margem do território. No entanto, seria feita uma caminhada da comunidade até o pico do Jaraguá, que fica em frente.

    Na reunião, o coronel da Polícia Militar de São Paulo Forner, comandante do policiamento da região oeste, chegou a colocar em dúvida a ação violenta da polícia na última terça, dizendo que “se houve granada jogada na aldeia, não vai mais ocorrer”. Ativistas que acompanhavam a reunião manifestaram sobre a fala do PM, que em seguida recuou e assumiu o compromisso de “não mais permitir nenhum ato de racismo, violência e preconceito contra o povo da comunidade indígena”.

    Após a fala do coronel, diversos parlamentares que participaram da reunião tiveram a oportunidade de falar também. Em uma das intervenções, a vereadora Luana Alves (PSOL), usou a fala do policial para dizer que, além de começar agir de forma diferente no território indígena, como prometido pelo comandante da PM na região, é necessário que os responsáveis pela ação violenta na região sejam identificados e responsabilizados.

    Indígenas se concentram para o início da caminhada ao Pico do Jaraguá | Foto: Daniel Arroyo/Ponte Jornalismo

    Além dos registros de violência após a manifestação indígena na terça-feira, moradores da comunidade relataram que policiais militares foram ao território no sábado para comunicar, de forma irregular, que a Justiça havia proibido o grupo de ocupar a rodovia e, portanto, a PM iria impedi-los. Além de não ter sido cumprido o procedimento correto de uma notificação judicial, indígenas relataram temor pelo fato dos policiais terem ido ao local portando armas de grosso calibre.

    A reunião, que foi entendida pelas lideranças indígenas como uma abertura de diálogo para fortalecer a resistência do povo originário no território, serviu como uma medida paliativa para os manifestantes. No entanto, Karai Djekupe ressaltou que o desejo dos guaranis em retomar a reza na Rodovia dos Bandeirantes ainda será realizado.

    Tamikuã Txihi discursa na Terra Indígena do Jaraguá em São Paulo, na concentração de protesto Contra o Marco Temporal | Foto: Daniel Arrroyo/Ponte Jornalismo

    “Estão sendo lesados porque não estávamos de camiseta verde e amarela?”, provocou, diante da PM, Djekupe. “Porque não estávamos em cima de motos? Porque não gastamos dinheiro público? Porque não somos brancos? É por isso? A violência, o racismo, é antes de mais nada institucional. Ele é provocado.”

    Com mais pessoas se juntando ao longo da manhã, por volta das 12h, os manifestantes iniciaram a caminhada rumo ao Pico do Jaraguá. A subida pela estrada sinuosa que leva ao topo do Parque Estadual do Jaraguá, que tem extensão de 5 km, foi percorrida pelos manifestantes, puxados por indígenas que faziam cantos e orações tradicionais, levou cerca de duas horas.

    Crianças na subida do Pico do Jaraguá, em São Paulo, durante protesto contra o Marco Temporal | Imagem: Daniel Arroyo/Ponte Jornalismo

    Ajude a Ponte

    Indígenas no topo do Pico do Jaraguá em São Paulo, durante Protesto Contra o Marco Temporal

    Chegando ao topo, por volta das 14h, o protesto aconteceu foi realizado à base do cume da montanha. O povo originário, novamente, fez uma reza tradicional e, após algumas falas, o ato se encerrou por volta das 16h. A manifestação aconteceu toda de forma pacífica.

    Já que Tamo junto até aqui…

    Que tal entrar de vez para o time da Ponte? Você sabe que o nosso trabalho incomoda muita gente. Não por acaso, somos vítimas constantes de ataques, que já até colocaram o nosso site fora do ar. Justamente por isso nunca fez tanto sentido pedir ajuda para quem tá junto, pra quem defende a Ponte e a luta por justiça: você.

    Com o Tamo Junto, você ajuda a manter a Ponte de pé com uma contribuição mensal ou anual. Também passa a participar ativamente do dia a dia do jornal, com acesso aos bastidores da nossa redação e matérias como a que você acabou de ler. Acesse: ponte.colabore.com/tamojunto.

    Todo jornalismo tem um lado. Ajude quem está do seu.

    Ajude

    mais lidas