Ela foi morta dentro do terreiro que coordenava em Simões Filho, na região metropolitana de Salvador, nesta quinta (17); há seis anos seu filho foi assassinado e autoridades se comprometeram a proteger comunidades quilombolas
A líder quilombola Maria Bernadete Pacífico Moreira, de 72 anos, mais conhecida como Mãe Bernadete, foi assassinada a tiros dentro do terreiro Quilombo Pitanga dos Palmares, na cidade de Simões Filho, na região metropolitana de Salvador, na Bahia, nesta quinta-feira (17/8).
A Polícia Civil da Bahia disse que as informações iniciais são de que dois homens numa motocicleta teriam praticado o crime. A assessoria declarou que os Departamentos de Polícia Metropolitana (Depom), de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), Especializado de Investigação e Repressão ao Narcotráfico (Denarc), de Inteligência Policial (DIP) e Coordenação de Conflitos Fundiários (CCF), sob a determinação da Delegada-Geral Heloisa Campos de Brito, realizam ações integradas para elucidar o caso.
“Perdi minha mãe com 12 tiros de pistola no rosto”, lamentou Wellington dos Santos, filho da yalorixá, à TV Bahia, afiliada da Rede Globo. Segundo ele, os três netos e uma quarta criança que estavam com a idosa foram afastados por suspeitos que atiraram em seguida.
Na entrevista, ele também lembrou o assassinato do irmão Flávio Gabriel Pacifico dos Santos, o Binho do Quilombo, ocorrido em 2017, cuja investigação está a cargo da Polícia Federal. “Minha família está sendo perseguida. Em 2017, meu irmão foi assassinado da mesma forma e ontem minha mãe foi executada enquanto estava com seus três netos. Queria saber o que a gente fez para esse povo. Não sabia que fazer o bem contraria tanto as elites”, declarou à emissora.
A Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) lamentou a perda da sua coordenadora. “A família Conaq sente profundamente a perda de uma mulher tão sábia e de uma verdadeira liderança. Sua partida prematura é uma perda irreparável não apenas para a comunidade quilombola, mas para todo o movimento de defesa dos direitos humanos”, diz trecho da nota.
A entidade também exigiu que o Estado brasileiro garanta “uma investigação célere e eficaz e que os responsáveis pelos crimes que têm vitimado as lideranças desse Quilombo sejam devidamente responsabilizados”.
Em julho, Mãe Bernadete denunciou a violência contra quilombolas, relatou ameaças e destacou a ausência de responsabilização pelo assassinato do filho durante um encontro com a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Rosa Weber.
“Para a senhora ter uma ideia, até hoje não sei o resultado do assassinato de meu filho. Abalou todo mundo. Foi no mesmo período em que aconteceu a morte de Marielle (Franco). Inclusive, eu fui em diversos encontros com a mãe de Marielle. É injusto. Recentemente perdi outro amigo e uma amiga em um quilombo. É o que nós recebemos: ameaças, principalmente de fazendeiros, de pessoas da região”, disse em trecho do discurso durante o evento com a ministra, segundo reportagem do G1.
Na manhã desta sexta-feira (18/8), integrantes dos governos federal e estadual se reuniram na Secretaria de Segurança Pública da Bahia para estabelecer medidas conjuntas diante da morte da líder quilombola. De acordo com a pasta, o intuito foi discutir meios de “apoio à comunidade e reforço da segurança no entorno do local”.
A secretaria também informou que “diligências estão sendo promovidas, testemunhas foram ouvidas, câmeras de segurança serão analisadas e a perícia foi realizada no local”.
A Superintendência Regional da Polícia Federal na Bahia emitiu nota informando que abriu inquérito para apurar o assassinato da yalorixá e que o caso do filho dela também está sendo apurado. “Todos os esforços estão sendo empregados para a devida apuração da autoria dos homicídios e as investigações seguem em sigilo”, declarou.
Ainda na noite de quinta-feira, o governador Jerônimo Rodrigues (PT) lamentou a morte da yalorixá e se comprometeu a empregar esforços para elucidar o crime. “Não permitiremos que defensores de direitos humanos sejam vítimas de violência em nosso estado”, disse.
A ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, disse que ficou “consternada” com a violência e que teve a oportunidade de conhecer Mãe Bernadete em julho durante um evento a fim de produzir “um diagnóstico junto a Povos e Comunidades Tradicionais de Matriz Africana sobre o racismo religioso no país e elaborar políticas de enfrentamento ao racismo religioso e para a salvaguarda dos povos de terreiro de matriz africana”.
O ministro de Direitos Humanos e Cidadania, Silvio Almeida, também prestou solidariedade à família da vítima e, assim como Anielle Franco, determinou deslocamento das equipes do ministério para Simões Filho.
O presidente Lula (PT) também declarou que recebeu a notícia do assassinato com “pesar e preocupação” e que aguarda “investigação rigorosa do caso”.