Justiça decide manter nas ruas PM que “celebra mortes com charutos e cervejas”

Ministério Público e Defensoria haviam pedido o afastamento de Gabriel Luís de Oliveira, réu pelo Massacre de Paraisópolis, por causa da declaração feita a um youtuber. Para juiz, frase é ‘infeliz’, mas não justifica afastamento

Trecho de vídeo em que sargento conversa com youtuber norte-americano | Foto: reprodução

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo negou nesta segunda-feira (22/7) um pedido para afastar do trabalho nas ruas o sargento da PM Gabriel Luís de Oliveira, que afirmou gostar de “celebrar mortes com charutos e cervejas”.

A declaração do policial militar — que é um dos 12 policiais militares acusados pela morte de nove jovens após a dispersão de um baile funk em 2019, episódio que ficou conhecido como Massacre de Paraisópolis — foi feita a um youtuber estadunidense que participava e registrava uma perseguição policial, conforme noticiou o jornal Folha de S. Paulo. O pedido de afastamento havia sido feito pelo Ministério Público e pela Defensoria Pública, logo após o vídeo ser revelado, no processo que julga os acusados pelo massacre.

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Em sua decisão, o juiz Antonio Carlos Pontes de Souza, da 1ª Vara do Júri do Foro Criminal da Barra Funda, afirmou que “não há notícias concretas” de que a atuação do policial esteja prejudicando o andamento do processo judicial, porque todas as testemunhas de acusação já foram ouvidas. Para o magistrado, a declaração do PM ao youtuber deveria ser investigada pela Corregedoria da Polícia Militar. “Não se duvida que a manifestação do policial foi infeliz, todavia, não aborda especificamente o caso em tela [o massacre de Paraisópolis], e sim uma exteriorização para todo e qualquer caso que ele ou a polícia tenha atuado”, escreveu.

No pedido de afastamento, a promotora Luciana André Jordão Dias, do MPSP, havia descrito o comportamento do policial como violento e cheio de “desprezo pela vida”. Já as defensoras públicas Fernanda Penteado Balera e Gabriele Estabile Bezerra argumentaram que Gabriel poderia utilizar a função pública para cometer novas infrações.

Já a advogada Ana Maria Monteferrario, que representa o sargento, se manifestou contra o afastamento argumentando que a declaração tratava de “ações policiais diversas do objeto do processo”, que deveriam ser analisadas por apuração administrativa disciplinar (ou seja, pela Corregedoria, e não dentro do processo criminal).

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A decisão causou revolta. A mãe de Denys Henrique Quirino, 16, um dos jovens mortos em Paraisópolis, chamou de injusta e insana a negativo do juiz. Após a publicação da matéria pela Ponte, Maria Cristina Quirino publicou um vídeo no Instagram repercutindo o parecer. Para a mãe, a Justiça no Brasil não existe para pobres e negros.

“Enquanto não houver punição para esses indivíduos, eles vão continuar fazendo a mesma coisa, repetindo as mesmas cenas, repetindo as mesmas barbaridades, e isso está completamente errado”, afirmou.

A próxima audiência judicial do massacre de Paraisópolis está marcada para 2 de agosto, no Fórum Criminal da Barra Funda, na zona oeste da capital paulista. A previsão é de que serão ouvidas 17 pessoas, entre as testemunhas de defesa e os réus.

Como a Ponte mostrou, o vídeo com o sargento Gabriel foi tema de discussão entre os advogados dos policiais com o MP e a Defensoria na quarta audiência do processo, que aconteceu em 28 de junho.

Na ocasião, a promotora Luciana Jordão questionou o que o coronel Douglas José Ferreira de Oliveira pensava a respeito do vídeo, uma vez que na época do massacre ele chefiava o 16º Batalhão de Polícia Militar Metropolitano (BPM/M), ao qual pertenciam Gabriel e outros 11 PMs réus. O ex-comandante qualificou a declaração do ex-subordinado como “inconcebível”.

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Os 12 PMs são acusados homicídio qualificado por dolo eventual, porque teriam assumido o risco de matar os jovens ao encurralá-los em um beco durante a dispersão de um baile funk que acontecia na comunidade de Paraisópolis, na madrugada de 1º de dezembro de 2019. A área desse batalhão apresenta o maior índice de letalidade policial na cidade de São Paulo, segundo levantamento do Centro de Antropologia e Arqueologia Forense, da Universidade Federal de São Paulo (Caaf/Unifesp).

O processo está em fase de instrução, quando são ouvidas testemunhas e os acusados e são reunidas provas para que o juiz decida se os policiais serão ou não levados a júri popular.

A Ponte procurou a Secretaria da Segurança Pública sobre as investigações a respeito do vídeo e perguntou se o sargento está afastado das funções, mas não houve retorno.

*Matéria atualizada às 12h30 do dia 24 de julho de 2024 para incluir a manifestação de Maria Cristina Quirino.

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