Ato ocorreu em frente à Câmara Municipal. Uma semana após a morte de Guilherme Oliveira e agressão de sua mãe pela PM no Cemitério Cristo Rei governador Tarcísio ainda não se manifestou
“Eu sou mais um que perdeu o irmão. Mas não vou parar por aqui”, disse o atendente Hector Alves Rodrigues, de 22 anos, diante de um público de cerca de 30 pessoas que, sob chuva, pedia justiça por dois jovens mortos em Bauru, no interior paulista. Hector esteve à frente do terceiro protesto motivado pela morte de seu irmão caçula, Guilherme Alves Marques de Oliveira, assassinado no dia 17 de outubro por policiais do 13º Batalhão de Ações Especiais de Polícia (BAEP) — e que teve seu velório invadido e a mãe agredida por policiais.
A manifestação ocorreu na quarta-feira (23/10) em frente à Câmara Municipal, no Centro de Bauru. Familiares, partidos políticos e coletivos integraram o protesto, marcado por gritos pedindo o fim da Polícia Militar e justiça pelas vítimas, além de relatos de outros casos de violência policial.
“A coragem das mães e o ataque ao velório foi o principal motivador desse novo protesto”, afirmou a artista Tatiana Calmon, 60, uma das manifestantes. Ela se referia às imagens chocantes que circularam na imprensa e nas redes sociais mostrando policiais invadindo a cerimônia no Cemitério Municipal Cristo Rei e agredindo a mãe, outros parentes e amigos de Guilherme.
Tatiana usou o microfone para criticar o mero afastamento de policiais envolvidos em casos de violência na cidade que, segundo ela, servem apenas para “esperar a poeira baixar”. Na última terça-feira (22/10), um inquérito foi anunciado pela Polícia Militar do Estado de São Paulo, mas apenas um dos policiais envolvidos nas agressões durante o velório foi afastado.
Ouvidor em Bauru
Nesta quarta-feira, o ouvidor da Polícia Militar Cláudio Aparecido da Silva esteve em Bauru para conversar com a família dos jovens assassinados. Ele também participou de uma reunião com o Comandante do CPI4, Coronel Hudson Covolan.
Em coletiva de imprensa, o ouvidor avaliou, a partir do diálogo estabelecido com os familiares e a polícia, que existe atualmente “um caos instalado nas periferias de Bauru. Esse caos está sendo gestado e promovido pelo BAEP. Isso é incabível e não tem condição de continuar existindo”.
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Cláudio Aparecido destacou, ainda, que em nenhuma outra cidade do estado há tantas reclamações em relação à atuação do batalhão local.
Além disso, ele informou que a ouvidoria pretende acionar os órgãos competentes para que as devidas providências sejam tomadas. Cláudio não descarta levar os casos de Bauru para cortes internacionais, segundo revelou na coletiva.
Repercussão nacional
Guilherme, com 18 anos recém completados, foi morto no mesmo dia que Luís Silvestre da Silva Neto, 21, numa operação no bairro Jardim Vitória em Bauru. O caso tomou repercussão nacional quando, no dia 18 de outubro, a Polícia Militar invadiu o velório de Guilherme e agrediu Nilceia Alves Rodrigues, de 43 anos, a mãe da vítima, amigos e familiares, e prendeu outro filho dela, Fabio, por “desacato” — impedindo-o de acompanhar o sepultamento.
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No mesmo dia, o bairro organizou uma passeata em solidariedade à família, exigindo justiça pelos mortos e pelo desrespeito ao sepultamento da vítima. No protesto, manifestantes incendiaram pneus, papelão e lixo para fechar as quadras 32 e 33 da avenida Castelo Branco — uma das principais de Bauru.
A ocasião foi marcada por forte repressão policial. A corporação usou gás lacrimogêneo, bombas de efeito moral e balas de borracha para dispersar a população.
No domingo (20), mesmo após a repressão, o bairro realizou mais uma passeata por justiça. Nesta ocasião, assim como na quarta-feira, não houve relatos de repressão policial. A família planeja organizar um outro protesto ainda esta semana, em data e horário a serem definidos.
O que dizem as autoridades
A Ponte solicitou entrevista com o secretário da Segurança Pública Guilherme Derrite, mas não houve retorno. Em virtude da gravidade da invasão pela PM e das agressões durante o velório, a reportagem pediu uma manifestação pública a respeito do caso diretamente ao gabinete do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) — também não houve resposta.
A Secretaria da Segurança Pública de São Paulo (SSP-SP) respondeu por nota:
A Polícia Militar instaurou um Inquérito Policial Militar (IPM) para apurar e individualizar a conduta dos policiais envolvidos na ação. Um dos agentes já foi afastado das atividades operacionais e as investigações seguem em andamento. A PM não compactua com excessos e a conduta dos policiais não condiz com as práticas da instituição. Todo e qualquer desvio é rigorosamente investigado, com acompanhamento da Corregedoria, e os policiais punidos com rigor.