Número de detidos por pichar ou grafitar na cidade de São Paulo passou de 22, em janeiro passado, para 50, no mesmo mês deste ano
Em meio à batalha promovida pelo prefeito João Doria (PSDB) e sua “Cidade Linda” contra os pichadores, na cidade São Paulo, a quantidade de pessoas detidas em flagrante por infringirem o artigo 65 da Lei de Crimes Ambientais (Lei 9605/98), cresceu 100% no período de um ano.
De acordo com a SSP (Secretaria de Segurança Pública), em janeiro de 2016, 22 pessoas foram detidas por estarem praticando arte na rua sem autorização, ante 50 nos primeiros trinta dias deste ano. Os dados foram obtidos por meio da estratificação de boletins de ocorrência à qual a Ponte teve acesso. Em 2015, no mesmo período, os detidos chegaram a 47.
Em números gerais, ainda segundo os dados da Polícia Civil, 470 pessoas foram detidas em flagrante no ano passado. Já os dados atuais da Prefeitura de São Paulo indicam que 87 pessoas foram detidas em flagrante pelo delito na capital até o dia 9 de março deste ano.
Se por um lado o prefeito tucano diz admirar o trabalho dos grafiteiros e criminaliza os pichadores, referindo-se a estes como “criminosos” e vibrando com a detenção de cada um — que deverá pagar uma multa entre R$ 5 mil a R$ 10 mil —, a polícia os trata de maneira igual, já que, pela descrição que consta nos boletins de ocorrência, os detidos foram conduzidos a delegacia em flagrante por “pichar, grafitar ou por outro meio conspurcar edificação ou monumento”.
Para o sociólogo Eduardo Viveiros de Freitas, “mais de uma prisão por dia é um número que deveria chamar a atenção da sociedade”. “Punir e excluir ainda mais não é uma resposta adequada. Não acrescenta nada à solução dos problemas. Se fosse para resolver o problema das pichações, as ações não seriam espetaculares. Seria um trabalho de longo prazo, envolvendo educação”, destaca.
Das 50 pessoas fichadas neste ano, 45 são homens, quatro são mulheres e uma não teve o sexo identificado no boletim de ocorrência. Entre os homens, 38 dos indiciados são maiores, com idades entre 18 a 48 anos. Outros sete são menores, na faixa entre 15 a 17 anos. Já entre as mulheres, todas as detidas são maiores, com idades entre 18 a 20 anos.
O maior número de detenções ocorreu durante a madrugada do dia 23 de janeiro, quando seis jovens foram levados até o 13º DP (Casa Verde), na zona norte da capital paulista. Em virtude de alguns dados do BO serem confidenciais, não foi possível obter a localidade em que os seis foram detidos.
À sombra do ocorrido na delegacia da Casa Verde, outros três distritos da Polícia Civil também registraram seis fichamentos: o 3º DP (Campos Elísios) e o 78º DP (Jardins), ambos no centro, e o 36º DP (Paraíso), na zona sul. As rondas contra os pichadores não se restringem ao centro expandido, sendo o 10º DP (Penha) e o 62º DP (Ermelino Matarazzo), ambos na zona leste, e o 46º DP (Perus), no extremo oeste, responsáveis por outros seis registros — dois cada DP.
Com uma longa trajetória no universo da pichação paulistana, iniciada nos anos 1990, Bugalu, hoje com 38 anos, analisa que Doria “está gastando energia no lugar errado”. “Prefeitura tem que se preocupar com saúde, lazer, escola e transporte público, muita campanha pra pouca coisa. Quando eles querem criar uma lei ela vem da noite para o dia, pra mim é marketing de burguês”, critica.
Bugalu conta que, ao longo dos anos, foi detido várias vezes e chegou a responder a seis processos, todos eles já quitados na Justiça.
“No início a pichação veio como protesto. No decorrer nos anos 90 ela se espalha por turma querendo demarcar a cidade. Jovem da periferia não tem espaço cultural, esporte no seu bairro, e ‘a rua’ tem todos os elementos que quer um jovem com a mente à milhão, querendo se destacar, ser reconhecido de alguma forma. Na falta de investimento do governo, a pichação se torna um esporte, uma maneira de se destacar, em extravasar sua adrenalina”, afirma. “Hoje o sistema penitenciário no Brasil é escola para bandido, como você tranca alguém que mata, rouba ou coisas mais graves, com quem faz intervenção com tinta”, completa Bugalu.
De outra geração, pouco depois dos anos 2000, Thiago Intropidi alega que começou na pichação, mas resolveu mudar de caminho e grafitar com autorização ao se deparar com a ilegalidade.
“Eu acho que a pichação é sim uma forma de se expressar, mas hoje em dia eu vejo como uma forma errada, acredito que existam outros meios. Quando eu comecei, gostava da adrenalina que aquilo me proporcionava, gostava de deixar minha ‘marca’ nos muros. De passar pelo local outro dia e lembrar como foi o rolê naquela noite”, conta. “Quando percebi que o cerco estava fechando e pichação era considerada um crime, eu que já não era mais um adolescente, resolvi começar a fazer desenhos nos muros, e assim, com a autorização das pessoas, comecei a fazer grafite”, completa.
Para ele, pessoas pegas pichando não deveriam ser presas, mas realizar “serviços comunitários, ajudar a limpar a cidade ou ajudasse a limpar uma escola, uma creche”.
Outro lado
Em nota, a Prefeitura de São Paulo afirmou que “os números demonstram que os trabalhos de combate à pichação estão efetivamente sendo realizados”.
“Do início do ano até hoje, 87 pessoas foram presas por crime ambiental. Vale lembrar que os detidos -que além do aspecto criminal, responderão a ações civis públicas e pagarão multas- são pichadores, e não grafiteiros. Estes últimos são artistas de rua que terão suas manifestações incentivadas com políticas públicas -uma das principais será o Museu de Arte de Rua”, diz a nota.